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domingo - 20/04/2014 - 07:05h

Crucifica-o! Crucifica-o!

Por Marcos Araújo

Estamos vivendo a semana da Páscoa, a maior festa da religião cristã. Nessa época, mais de um bilhão de pessoas se volta para a imagem da crucificação de Cristo, e a sua história é encenada – e recontada – em mais de 70 países, com toda a licenciosidade artística e cultural possível.

Ainda que o leitor deste espaço seja ateu, esclareço que historicamente está comprovado que um sujeito chamado Jesus, de fato nasceu em Nazaré (ou Belém e cresceu em Nazaré, como queiram), andou pelas estradas da Galileia e da Judeia pregando e foi crucificado em Jerusalém lá pela terceira década do século 1º d.C.  Até os ateus convictos que estudaram minimamente Antiguidade clássica aceitam a historicidade básica de Jesus de Nazaré. Certamente, alguns poderão até questionar os relatos bíblicos, especialmente quanto aos milagres, mas estamos falando de história, e não de teologia.

Toda a história clássica do século 1º d.C. é da autoria de Tito Flávio Josefo (37 d.C.-100 d.C.). Ele é quem insere Jesus nos seus escritos. A isenção desse historiador se dá por ser ele judeu, portanto, não-cristão. Impressiona o registro de Flávio Josefo, um judeu convicto, sobre Jesus:

“Por esse tempo apareceu Jesus, um homem sábio — se na verdade se pode chamá-lo de homem. Pois ele foi o autor de feitos surpreendentes, um mestre de pessoas que recebem a verdade com prazer. E ele ganhou seguidores tanto entre muito judeus quanto entre muitos de origem grega.Ele era o Cristo. E quando Pilatos, por causa de uma acusação feita por nossos homens mais proeminentes, condenou-o à cruz, aqueles que o haviam amado antes não deixaram de amá-lo. Pois ele lhes apareceu no terceiro dia, novamente vivo, exatamente como os profetas divinos haviam falado deste e de incontáveis outros fatos assombrosos sobre ele”.

Ainda, chama a atenção dos historiadores antigos (agnósticos, ateus, cristãos…)  a capacidade do Cristo em arrebanhar multidões por onde passava. Para se ter uma ideia, Jerusalém, a principal cidade da região da Palestina, tinha em torno de 25 mil habitantes. Em um dos episódios narrados por Mateus (cap. 14), conhecido pelos cristãos como o milagre da multiplicação dos pães, cinco mil homens foram alimentados, “além de mulheres e crianças”.  Pode se dizer que nesse momento Jesus tinha em seu redor pelo menos 10 mil pessoas, quase 50% da população da maior cidade da região.

O meu interesse é com essa multidão de seguidores. E inicio aqui as verdadeiras razões para escrever este artigo. No dia da condenação de Jesus, havia na praça uma multidão de expectadores. Como era período de festa (dos pães ázimos), era possível que no local tivesse mais de 10.000 pessoas. À pergunta de Pilatos, “Qual desses dois quereis vós que eu solte? E eles disseram: Barrabás!.” (Mt 27;21) E Pilatos pergunta: – Que farei então de Jesus, chamado Cristo?” A multidão lhe dá o veredito: “Seja crucificado!”

Jesus foi condenado por ser bom, sem culpa ou pecado, como declarou Pilatos. A causa da sua condenação foi a sua militância em favor dos pobres e desvalidos socialmente, sendo Ele considerado uma ameaça à estabilidade do regime político e econômico vigente na Palestina.

“Não compreendeis que é melhor que só um homem morra pelo povo a perecer toda a nação?”, indagou o Sumo Sacerdote (Jo 11.50). Seu discurso e filosofia de vida incomodava principalmente os religiosos da época, como os fariseus (puritanos por excelência), escribas (doutores da lei, encarregados do ensino) e sacerdotes (responsável por cultos no templo). Barrabás foi libertado por não ter compromisso nenhum com o povo, com o Governo ou com as instituições; um anarquista por excelência.

Não mudou muita coisa daquela época para agora. O desemprego era grande (Mt 20,1-7).  O mal-estar social era convulsivo: desemprego, violência, fome e abandono. Os pobres andavam doentes (Mt 4,24). Era perigoso viajar sozinho pelas estradas. Assaltos e roubos eram constantes (Lc 10,30). Preocupações e insegurança com o amanhã geravam angústia e tensão (Mt 6,25,31). Muitos não aguentavam uma carga tão pesada e ficavam atormentados, perturbados, parecendo loucos, como si estivessem possuídos por espíritos maus (Lc 6,18).

Diante de tantos problemas, o povo buscava refúgio na religião que estava sendo manipulada pelos doutores da Lei e pelos fariseus, impondo muitos preceitos e obrigações. Já não era a religião do coração, e sim das leis, dos ritos e gestos exteriores. Jesus não mediu palavras ao denunciar tanta hipocrisia (Mc 7,1-16).

Fecho agora o paradigma temporal apenas com um sumário dos problemas comuns no passado e no presente: pobreza, desemprego, fome, violência, enriquecimento dos políticos, corrupção, falsos líderes religiosos, alta taxação dos impostos etc.

Fico a imaginar o retorno de Jesus, como prenuncia a Bíblia. Se Ele voltasse agora e iniciasse uma pregação pelo Brasil, criticando a destinação de recursos bilionários para a copa do mundo, em desprestígio dos serviços sociais e públicos básicos; se denunciasse os crimes da elite política do país, enumerando os deslizes dos partidos (PT, do DEM, do PSDB…); se criticasse a dominação econômica, a corrupção desmedida, a concentração de rendas; denunciasse o ensandecimento das torcidas organizadas e a devoção popular aos esportes violentos como o MMA; criticasse a passividade dos meios de comunicação; falasse nas igrejas-templos sobre o farisaísmo dos chamados cristãos, a falta de solidariedade dos que eram para ser irmãos, as brigas secretas dentro das sacristias pelo prestígio e poder; o aproveitamento pelos “Doutores da Lei” da inocência e ignorância do povo, o que aconteceria?

Que destino teria Jesus? Seria processado por milhões de pessoas, levado à Praça, subjugado por uma autoridade pública encarregada de julgamentos, e à pergunta feita pelo julgador ao povo “Que queres que eu faça”, responderíamos solertemente:

– Crucifica-o! Crucifica-o!

Marcos Araújo é professor e advogado

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Categoria(s): Artigo

Comentários

  1. Renato diz:

    Fala de um jeito e se comporta exatamente ao contrario!!!!

  2. Rogério Mesquita diz:

    Excelente artigo, parabéns Marcos Araújo

  3. NÓBREGA diz:

    Se Jesus voltasse, além das denuncias que faria contra essa Falsa Elite conforme registrou Marcos Araújo no final do seu artigo, desceria o chicote no lombo gordo de pastores evangélicos como: Waldomiro Santiago, Silas Malafaia, Edir Macedo, R. R. Soares e outros incontáveis malandros do gênero classificados como vendilhões do templo que negociam religião como quem vende carnê do Baú da Felicidade.
    Sua reação seria, portanto ainda maior quando lhe contassem que esses oportunistas agora misturam religião com política tapeando incautos no dízimo e no voto para ingressarem no clube da Falsa Elite e explorá-los ainda mais!

  4. José Hélio diz:

    Irrepreensível, Digno Sr., seu artigo. Leva-nos a uma profunda reflexão.

  5. Pedro Edilson diz:

    Bom o artigo; particulamente, não achei legal Jesus ser chamado de “Sujeito”.

  6. Wilpersil diz:

    William diz: – Josefo não escreveu sobre jesus, veja a versão no texto de Marcou Araujo e outra retirada de um site //br.answers.yahoo.com/question/index?qid=20100501062732AANqBHr
    Toda a história clássica do século 1º d.C. é da autoria de Tito Flávio Josefo (37 d.C.-100 d.C.). Ele é quem insere Jesus nos seus escritos. A isenção desse historiador se dá por ser ele judeu, portanto, não-cristão. Impressiona o registro de Flávio Josefo, um judeu convicto, sobre Jesus:
    “Por esse tempo apareceu Jesus, um homem sábio — se na verdade se pode chamá-lo de homem. Pois ele foi o autor de feitos surpreendentes, um mestre de pessoas que recebem a verdade com prazer. E ele ganhou seguidores tanto entre muito judeus quanto entre muitos de origem grega.Ele era o Cristo. E quando Pilatos, por causa de uma acusação feita por nossos homens mais proeminentes, condenou-o à cruz, aqueles que o haviam amado antes não deixaram de amá-lo. Pois ele lhes apareceu no terceiro dia, novamente vivo, exatamente como os profetas divinos haviam falado deste e de incontáveis outros fatos assombrosos sobre ele”.

    ESTE TEXTO ABAIXO CONTRADIZ A AFIRMATIVA QUE JOSEFO ESCREVEU SOBRE JESUS;
    //br.answers.yahoo.com/question/index?qid=20100501062732AANqBHr

    Para provar que as versões existentes nos livros “Antiguidades de Israel” e “Testimonium Flavianum”, onde Flávio Josefo supostamente faz referencias a Jesus Cristo é só uma farsa; lembramos que:

    1- Yosef Ben-Matityahu (ou seja, José Ben Matias), “José, filho de Matias”, nasceu em 37 d.C. ou seja, só 4 anos depois que Jesus já teria morrido, não foi uma testemunha ocular, e teria escrito sobre diversos judeus que se proclamaram Messias, mas sem nunca falar uma linha sequer sobre “Jesus Cristo”.

    2- Como Josefo, que foi general das forças judaicas na Galiléia, que acabou sendo conselheiro do General Tito, até hoje é considerado um traidor do povo judeu, os cristãos forjaram que nos Documentos do Josefo ele teria citado Jesus Cristo, mesmo o Josefo sendo um escritor da geração que nasceu depois de Jesus, e não alguém que conheceu Jesus.

    3- Não há referências ao nome de “Jesus Cristo”, nos inúmeros relatos feitos pelos historiadores antigos como: Flávio Josefo (35-100 d.C.), Filão, “O Judeu”, (20 d.C. – 50 d.C.), Plínio “O Jovem”, (que viveu de 62 a 113 e foi sub-Pretor da Bitínia), Plínio “O Velho”, 23-79, e nos 900 manuscritos do Mar morto; que são os maiores e mais confiáveis escritos já feitos pelos antigos, pois relatam os principais acontecimentos do ano 225 a.C. ao ano 65 d.C..

    4- Suetônio somente falou de Crestus, e não de Jesus Cristo.
    Quanto aos escritos de Plínio, o Jovem; Flávio Josefo e Tácito, após exames grafotécnicos e de autenticidade realizados pela Universidade alemã de Tubingen, ficou provado que os documentos foram adulterados no todo ou em parte, por fanáticos como Eusébio, Bispo de Cesaréia, que adulterou inúmeros textos bíblicos e fez acréscimos fraudulentos.

  7. naide maria rosado de souza diz:

    Ótimo texto! Trouxe o martírio de Jesus à época atual. Não sei se seria crucificado, mas apedrejado e rejeitado, sim. Vejo pessoas de caráter e bom exemplo manifestarem-se e, depois, não suportando o desgaste inútil, calarem-se. E valores se perdem prevalecendo os problemas de um passado tão remoto, no presente.
    Sr. Pedro Edilson. Peço licença para um comentário. A conotação da palavra “Sujeito”, no texto, é a de Homem, Indivíduo. Não denigre, não macula nem ofende Nosso Senhor.

  8. Daniel Machado dos Reis diz:

    Grande homem, grande advogado!

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