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domingo - 01/09/2024 - 10:52h

Futebol de cego

Por Bruno Ernesto

Ilustração da Wikimedia

Ilustração da Wikimedia

Não sou – nem de longe – a pessoa mais indicada para comentar futebol, embora reconheça seja ele o esporte mais sociável do mundo.

Dizem que quando uma partida de futebol não terminar em polêmica, confusão ou intriga, as conversas sobre ele concluirão o trabalho.

Lembro muito bem, entretanto, de um episódio envolvendo os jogadores Romário e Edmundo, que no início dos anos dois mil, protagonizaram uma das maiores rusgas dentro e fora do campo; tudo em razão da braçadeira de capitão do time e dos privilégios que Romário tinha no time.

Ao final daquela partida, Edmundo, questionado sobre a sua atuação em campo, disse que o príncipe – Romário-, com as bênçãos do rei – Eurico Miranda, finado cartola-, podia tudo no time, até atrapalhar o desempenho.

O príncipe, digo, Romário, ainda em campo, ao saber da declaração de Edmundo, não se fez de rogado e disparou:

– Bem, então o time agora está completo. Temos o rei, o príncipe e o bobo da corte.

Além de bem colocada, a declaração de Romário demonstra que, na vida, é preciso, antes de tudo, ter sagacidade e perspicácia.

Com um sorriso nos lábios e uma voz suave, há quem ofenda mais do que aquele que perde a compostura e eleve o tom.

A despeito desse episódio, a história de Triboulet – o verdadeiro bobo da corte -, deve sempre servir de exemplo de sagacidade e fazer com que fiquemos atentos a tudo.

O papel de Triboulet consista em expor a hipocrisia na autoridade e os excessos reais, especialmente durante os reinados de Luís XII e Francisco I, da França, beirando, por vezes, o escárnio; e, embora dispusesse da piedade do rei, ele foi longe demais.

Certo dia, após uma de suas apresentações na corte de Francisco I, Triboulet deu um tapa na bunda do rei, que ficou furioso e decidiu por executar o bobo da corte naquele mesmo instante.

Entretanto o rei, como misericórdia, ofereceu à Triboulet a chance de escapar da morte, caso ele conseguisse lhe pedir desculpas de forma ainda mais ofensiva.

Sem titubear, Triboulet se desculpou da pior forma possível: – Desculpe, Majestade. Te confundi com a rainha.

Ao invés de ser perdoado e, pois, escapar da sentença de morte, sua resposta enfureceu ainda mais o rei que, apesar de ter estabelecido tal condicionante, determinou a imediata execução de Triboulet por tamanha ofensa.

Apesar disso, o rei ainda lhe concedeu um último pedido. Talvez como forma de compensação por tantos anos divertindo a corte: poderia escolher como morreria.

De pronto, Triboulet disse ao rei:  – De velhice, Majestade. Quero morrer de velhice.

Triboulet foi um personagem tão marcante, que Victor Hugo o imortalizou em sua peça “O Rei se Diverte”, de 1832.

Quanto à Triboulet, apesar de ter sido banido da corte, escapou da morte e ainda tripudiou do rei na frente de toda a corte.

Como diz o famoso adágio popular: em terra de cego, quem tem um olho é rei.

Entretanto, penso que Triboulet teria dito outra coisa: – Me arrependo do que disse. Era para ter dito coisa muito pior.

Bruno Ernesto é advogado, professor e escritor

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Categoria(s): Crônica

Comentários

  1. RAIMUNDO ANTONIO DE SOUZA LOPES diz:

    Esse morreu, mas não perdeu a piada. E, no último instante tirou o ás da manga: … de velhice.

  2. Marcos Ferreira diz:

    Não é nada fácil, porém meu amigo Bruno Ernesto, a exemplo de Odemirton Filho, quase todo domingo consegue apresentar aqui no Blog Carlos Santos uma história (as vezes um causo) que nos prende na leitura do começo ao fim. Esses dois resgates (o futebolístico quanto o do bobo da corte) são coisa de primeira qualidade nas quatro linhas da crônica. Parabéns e um grande abraço.

    • Bruno Ernesto Clemente diz:

      De futebol, não entendo nada. Não sei escalação, nome do técnico ou número de títulos do clube. Nunca entendi como aqueles comentaristas de futebol na tevê sabem tantos detalhes. Porém, se for para zombar do outro, aprendo rápido. kkk Um forte abraço, Marcos!

  3. Marcos Pinto. diz:

    A temática me fez lembrar uma história deveras interessante. Há cerca de 10 anos sempre me deparava com um rapaz de olhar apagado, denotando uma espécie de cegueira. Andava sempre auxiliado por um guia, a pedir esmola/auxílio geralmente nas filas dos Bancos situados no centro da cidade. Pois não é que certo dia, quando me encontrava na fila do Banco o dito cego foi zombeteiramente chacoteado por um imbecil que afirmou ser o dito deficiente visual o goleiro do time do bairro Malvinas. Ao ouvirem essa brincadeira sem sentido, alguns riram e outros encararam seriamente. Acredito que, os que zombaram devem ter recebido castigos de Deus. Aconselha o bom senso e a prudência que nunca se deve zombar de deficiência de ninguém, DEUS no comando. Feliz semana.

    • Marcos Ferreira diz:

      Muito bem, meu estimado xará.
      Falou e disse. É um causo bem curioso, mas decerto uma mentira contra o pobre do cego. Uma ótima semana para você, saúde e paz.
      Abraços.

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