Por Odemirton Filho
No Pingo da Mei Dia uma multidão dançava, bebia e ia “atrás do trio elétrico”; eram pessoas de todas as idades e classes sociais. Os camarotes estavam lotados, com atrações dos mais variados gêneros musicais. Pelo menos, por algumas horas, as pessoas estavam felizes, esquecendo os seus trabalhos e as dificuldades cotidianas.
Enquanto isso, numa rua lateral, ao lado da empresa Socel, um senhor montou a sua barraca e comercializava chapéus dos mais variados tipos, cores e tamanhos. Esperando uma neblina parar de cair, eu fiquei sob a barraca, e puxei dois dedos de prosa. Ele não estava muito animado com as vendas e perguntou:
– O povo daqui não gosta muito de chapéu, né?
– Só quem gosta mais é o prefeito – respondi, em tom de brincadeira.
Ele sorriu. Falou-me que era da região do Seridó, das bandas de Caicó, e há anos viajava por esse mundão de meu Deus, vendendo chapéus. Durante toda a sua vida tirou o seu sustento por intermédio desse ofício. Era acostumado a viajar por várias cidades do Nordeste, participando de festas de padroeiro, de emancipação política, de vaquejadas, de São João.
– Consegui formar dois filhos: um engenheiro, o outro, nutricionista, disse-me, com uma ponta de orgulho.
E aí fiquei a imaginar a luta diária do nosso povo pela sobrevivência. Quantos pequenos comerciantes, ou empreendedores, para usar o termo da moda, não labutam dia a dia pelo sustento? Quantas pessoas não estão melhorando a renda vendendo seus produtos nesta época de festas juninas? São muitas, milhares, milhões.
Eu, particularmente, sinto um nó na garganta ao ver idosos e crianças, à noite, tentando ganhar um dinheirinho, quando poderiam estar em casa. Enquanto isso, os artistas recebem cachês de alto valor; não tenho nada contra os artistas (contrata quem quer), apenas quero ressaltar a histórica desigualdade social existente em nossa sociedade, mas isso é outro assunto.
O fato é que, quando a garoa parou de molhar a terra de Santa Luzia, o vendedor desmontou a sua barraca e arrumou os chapéus. Eu e a minha mulher acompanhamos o trio elétrico, ele tomou o rumo de outras cidades, carregando na mala as suas mercadorias e, na alma, as suas lutas e vitórias.
Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos
A vida é cheia de contrastes: uns numa vida, aparentemente, muito boa e outras numa luta pesada! A gente sempre se compadece diante de situações como a que você relatou. Pessoas que não desistem! Que alcançam seus objetivos a custa de muito sacrifício. Meu pai era um desses que se desdobrava para criar cinco filhos. A vantagem é que a gente se transforma em pessoas fortes que avaliam as oportunidades. Parabéns pela sua crônica muito sensível.
Exatamente, cara Bernadete. A vida é cheia de contrastes.
Tudo de bom pra você.