Por Marcos Ferreira
Durante as primeiras horas da manhã, depois que tomei os remédios, comecei a sentir fortes cólicas e ânsia de vômito. Resultado: findei vomitando uma água esverdeada. Como não bastasse, fui ao banheiro e constatei que minhas fezes estavam esbranquiçadas; o que já ocorreu umas quinze vezes, mesmo antes de eu receber o diagnóstico. Embora evacuando em dois momentos, num intervalo de cerca de meia hora, as cólicas não cessaram. Assim, no intuito de interromper esse mal-estar, tomei quarenta gotas de Buscopan. Em curto tempo a escopolamina foi eliminando as dores e a náusea, até findarem por completo.
Tomei um banho e escovei os dentes. A seguir preparei o café, junto com o qual comi um pão francês com manteiga e uma fatia de queijo de coalho. Felizmente, repito, os desconfortos sumiram. Apesar da melhora não me senti disposto a ligar o computador e redigir nada. Fiquei deitado na rede armada no quarto. Por volta do meio-dia fiz ovos mexidos com rodelas de banana. Este foi o meu almoço. Só agora, às quatro e onze da tarde, venho compor esta narrativa.
Não recordo direito o que abordei no capítulo passado. Deixo aos leitores (ainda me restam alguns) a tarefa de fazer esse tipo de conferência, acaso lhes falte a memória do que expus no último domingo. É isso. Não estou a fim, indisposto para abrir o arquivo e rever os pormenores, verificar se é o caso de concatenar o assunto de agora com o anterior. Acho que por hoje vou seguir um rumo indireto, sem vínculo com o enredo pretérito. Sinto que me alonguei no texto pregresso. Alguém já me disse que eu deveria escrever capítulos mais curtos. Esse alguém foi o saudoso Inácio Augusto de Almeida.
Parece-me que a trama de agora não vai sobreviver ao meu fastio, à minha desmotivação. Certas vezes nos perdemos no caminho, acabamos tomando uma direção desconexa. Dessa forma, com ou sem a indulgência do leitor, exporei uns assuntos, umas histórias desinteressantes. Nem as ostras produzem somente pérolas. Gravei isto em alguma página de que não tenho nenhuma lembrança em qual foi.
Perdoem o lugar-comum, mas, como diria Jack, o Estripador, vamos por partes. Penso que sequer o próprio Jack (nos infernos onde possa se encontrar) perdoará esta minha falta de criatividade, de algo melhor para ser dito. Neste momento, embora sem a menor intenção, acabo de me lembrar do que tratei no último relato. Contudo, ao menos por enquanto, não vou requentar aquela conversa com as pessoas que recebi no fim da tarde de ontem. Bom, falei que vamos por partes. Quem sabe dessa forma eu adquira um norte para esta narração ferida de mortal esterilidade. Pois é. Estiveram aqui, finalmente, os homens de letras Carlos Santos (jornalista), Marcos Araújo (advogado e professor) e Clauder Arcanjo (engenheiro civil e petroleiro).
Entretanto, conforme alertei, não quero retomar este assunto. Tenho a sensação de que já esgotei o bate-papo na referida ocasião. É certo que voltarei a falar a respeito dessa conversa noutra oportunidade. Neste minuto meu foco é outro. De repente me vejo pensando no vizinho à esquerda de minha casa. Aliás, para ser exato, penso na vizinha, aquela que foi brutalmente espancada por seu companheiro há mais ou menos três semanas. Todo castigo para quem agride física e covardemente uma mulher daquela maneira é pouco. Na verdade, como falei no ensejo em que discorri acerca do caso, não se bate em mulher nem com uma flor. O caule pode conter espinhos.
Agorinha, por coincidência, verifiquei uma movimentação no referido endereço. Olhei a rua por cima do muro e avistei dois homens em companhia da mulher agredida. Ela estava abandonando de vez aquela pequena moradia e, se possível, também as memórias traumáticas que, suponho, estão incrustadas naquelas paredes. Retiravam os móveis e os colocavam (especialmente os objetos maiores) na carroceria de um caminhão de médio porte. Havia uma outra jovem entre eles; esta ajudava a transportar coisas menores, que eram levadas para a caçamba de uma picape branca estacionada a uns cinco metros do caminhão. Decerto era uma amiga, quiçá uma prima ou irmã. Decorrido todo esse tempo da brutal surra sofrida por aquela criatura franzina, só hoje retornou ao domicílio para recolher o que lhe pertencia. O imóvel era alugado. Melhor analisando, três homens retiravam as coisas, colocando-as em cima do caminhão. Um deles era um rapazinho com algo em torno de vinte e dois anos. Seus traços fisionômicos pareciam com os da espancada. Considerei que pudesse ser irmão dela.
Outros vizinhos, uns dez ou mais, sem demonstrarem discrição, saíram para as calçadas e acompanhavam a retirada dos troços e utensílios. Duas mulheres da casa diante desta, a senhora Das Neves e a filha Magnólia, decerto por possuírem alguma intimidade junto à vítima, não perderam tempo e foram conversar com essa que agora é ex-moradora da Pedro Velho. O mais provável é que o agressor continue em poder da polícia. O caso teve ampla repercussão; foi veiculado e repudiado nos principais programas televisivos deste país, nas redes sociais e nos telejornais.
Acho que vou, pelo menos neste ensejo, ser breve e colocar um ponto final nesta página, seguindo o conselho do falecido Inácio Augusto de Almeida. Pois é. Inácio era um assíduo, um infalível colaborador e crítico do Blog Carlos Santos (BCS). Todos os dias ele tinha algumas opiniões sobres as postagens. Havia iniciado, quando se encontrava com a saúde favorável para isso, a publicação de um romance folhetim no BCS. Os capítulos, como me propusera, eram de fato curtinhos. Entrementes a saúde de Inácio foi se complicando, e o romance ficou sem desfecho. Suponho até que não atingiu a metade do que ele pretendia tornar público. Inácio baixava o pau em gregos e troianos. Especialmente em tudo que dissesse respeito ao atual inquilino do Palácio da Alvorada e Granja do Torto.
Como ninguém é perfeito, era um defensor mórbido do bolsonarismo. Batia com muito mais força no, conforme denominava, Nove-Dedos, o qual, entre outros afagos, chamava de cachaceiro e ladrão. Se vivo ele continuasse, estaria hoje colocando fogo pelas ventas em virtude da condenação (pelo STF) do Percevejo Supremo. Seja como for, o senhor Inácio Augusto está fazendo falta.
Espero amanhã estar me sentindo bem, livre de náuseas e cólicas, para então elaborar algo menos emaranhado. Tenho agora a sensação de que entrei em um oito e não consegui encontrar a saída. Todos que rabiscam correm esse risco. Porque esta atividade não tem receita pronta, está longe (bastante longe) de ser uma ciência exata. Quem disser que escrever é fácil é porque não é escritor, segundo Luis Fernando Verissimo, morto em agosto deste ano. Estou de acordo com ele.
Marcos Ferreira é escritor
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