Por Marcos Pinto
A cidade de Apodi tem sido, em todos os tempos, um celeiro de intelectuais,em sua maioria exportados para outros meridianos da geografia brasileira. Neste elenco destacam-se Francisco Isódio de Souza, Valter de Moura Cantídio, Públio Lopes Filho, Maria Gomes de Oliveira, primeira mulher a ocupar o cargo de Reitora no Brasil, Newton Pinto, Folclorista José Martins de Vasconcelos, dentre outros nomes de similares importâncias no contexto da intelectualidade potiguar.
O historiador e maior expoente mundial do folclore , Câmara Cascudo, em sua “Acta Diurna” de 12 de Janeiro de 1948, traçou o perfil biográfico do ilustre Apodiense, em depoimento valioso para os anais da história deste rincão Oeste-potiguar. Ei-lo:
JOSÉ MARTINS DE VASCONCELOS, homem do Apodi. Morador no Mossoró, devia ser maior de setenta anos ao falecer. Baixo, moreno, lento, a face serena era iluminada por dois olhos vivos, perguntadores, inquietos, ardendo, como lumes de aviso e de alerta, denunciando vida interior.
Realizou a figura sugestiva do autodidata sertanejo, preso à terra, como o caramujo à sua concha, gravitando ao redor de interesses pobres, num raio melancólico de ação. Mas esse movimento, direção e força que o animavam foram sempre as mais nobres, num plano superior de pensamento.
Aprendeu sozinho a ser professor e advogado. Chegou a dirigir o próprio Grupo Escolar de Mossoró e ir à tribuna forense como Promotor Público. Sabia músicas, compunha. Musicou uma revista teatral do Prof. Eliseu Viana, denominada de ‘Mossoró por dentro’. Fundou, dirigiu, ajudou a viver a dez jornais mossoroenses. Publicou dois livros de verso e uma de prosa. Neste “Histórias do Sertão” reuniu material folclórico, costumes, mitos, tradições da Chapada do Apodi.
Quando estudei o “Ciclo dos Monstros”, retirei de “Histórias do Sertão” o documentário de um deles, o raro e horrendo Labatut, para a ‘Geografia dos mitos brasileiros’.
Nunca deixei de procurá-lo quando visitava Mossoró e ouvi-lo conversar na redação do “Nordeste”, jornal que durou tantos anos. José de Vasconcelos, na sua tipografia, parecia um pesquisador num laboratório. Imprimia versos populares, espalhando pelo sertão os folhetos registradores da vida provinciana, da gesta heroica dos cangaceiros, dos desafios tempestuosos, guardando a vida nossa literatura tradicional e popularesca.
Vez por outra recebia eu uma boa remessa desses folhetos. Assim viveu sempre entre livros, aspirando cheiro de tinta de imprensa, sonhando jornais, sociedades literárias, reuniões de todas as alegrais, tão raras, do convívio intelectual.
Sobre o túmulo humilde do jornalista sertanejo sem títulos universitários, podíamos escrever o mesmo epitáfio de Oliveria Lima, no sentido de Mount Olivet:
– Aqui jaz um amigo dos livros.
Nasceu na antiga Rua da Aurora, atual Rua Antonio Lopes Filho, em Apodi, a 11 de Novembro de 1874, filho legítimo de Gaudêncio de Góis Vasconcelos (Da família NOGUEIRA, do sítio “Olho D’água da Garrafa” – várzea do Apodi) e de Antonia Maria da Conceição.
Ainda muito moço foi para Mossoró a fim fé procurar trabalho e estudar. Ali iniciou sua vida, desenvolvendo atividades modestas: foi vendedor de jornais, alfaiate, músico, para depois ingressar no jornalismo, dedicando-se ao mesmo tempo a serviços tipográficos, instalando uma tipografia, “O Nordeste”.
Participou ativamente de todos os movimentos literários e políticos de sua época, fundou jornais, fez teatro, criou bandas de músicas, escreveu e publicou os seguintes livros: “Saltérios de Saudade” (poesias), “Renovos D’Alma” (poesias), Histórias do Sertão (contos), “Goivos” (poesia).
Em 1915, Martins criou o seu primeiro periódico, intitulado “A crise”. Todavia, após fundar “O Nordeste” em 16 de novembro de 1916 é que começou realmente a mostra o valor de sua emocionada e justiceira pena, em defesa do que ele achava justas reivindicações.
Este jornal de circulação bimestral circulou até o ano de 1934.
Faleceu sua residência em Mossoró, na Rua 30 de Setembro, nº 46. no dia 22 de dezembro de 1947, aos 73 anos de idade, onde viveu e desenvolveu suas atividades de jornalistas, poeta, músico, comerciante e intelectual.
Martins Vasconcelos foi sócio do Instituto Histórico e Geográfico do RN (IHGRN) e membro efetivo da Academia Norte-riograndense de Letras (ANL), e patrono da Academia Apodiense de Letras (AAL), cadeira nº 30.
É o autor do Hino de Apodi.
Casou-se em primeiras núpcias com Francisca Libânia Vasconcelos. Com o falecimento desta, a 25 de setembro de 1903, casou-se com Dona Silvia Freire de Vasconcelos, com os seguintes filhos: Maria Silvia, Francisco, Rubem, Djalma, Selma, Luzia, Eponina e José. José Martins foi um dos únicos autodidata completo, porque aprendeu a ler e tudo mais, sozinho.
É imprescindível, pois, que as escolas de Apodi façam o resgate da importância deste eminente vulto Apodiense, considerado como o segundo maior folclorista do Rio Grande do Norte, com intensa produção e densidade neste ramo dos costumes e das lendas sertanejas.
Marcos Pinto é escritor e advogado
José Martins de Vasconcelos era polivalente. Sim, importante resgatar sua memória.
Ótimo e merecido resgate…
Parabéns Marcos Pinto!