Por Odemirton Filho
O chamado golpe preventivo foi consequência de uma profunda crise político-institucional que se abateu sobre o Brasil no segundo governo de Getúlio Vargas. A oposição a Vargas tinha se fortalecido desde o surgimento da União Democrática Nacional (UDN).
Com a morte de Getúlio, o país ficou profundamente comovido, fato que levou parcela significativa da população a ficar contra os opositores do ex-presidente. Getúlio foi sucedido por Café Filho, que era o vice-presidente à época.
Durante o governo de Café Filho houve a pretensão de se anular as eleições de 1955. Entretanto, Café afirmava que as eleições aconteceriam dentro da normalidade, como estava previsto, porém, há quem afirme que apoiava, discretamente, o golpe.
De todo modo, as eleições foram realizadas em outubro de 1955, na qual Juscelino Kubitschek obteve 36% dos votos contra 30% dos votos para Juarez Távora, 26% de Ademar de Barros e 8% de Plínio Salgado. A vitória de Juscelino enfureceu, ainda mais, os oposicionistas ligados à UDN.
Carlos Lacerda, então, fez um apelo para uma intervenção dos militares, tendo o apoio de outros grupos políticos, acusando Juscelino de ser comunista, entre outros argumentos, tudo para negar a posse de JK.
No dia primeiro de novembro daquele ano, o coronel Jurandir Mamede defendeu, abertamente, o golpe militar contra a posse de Juscelino Kubitschek e João Goulart.
Contudo, entrou em cena um ardoroso defensor da legalidade e, por consequência, da posse de Juscelino e seu vice. Trata-se do general Henrique Teixeira Lott. O general era Ministro da Guerra e tinha prestígio dentro das Forças Armadas. Segundo conta a história, Lott combatia tanto os chamados comunistas, como os radicais conservadores.
Lott exigiu do presidente Café Filho uma punição ao coronel Mamede por causa dos seus arroubos. Café, todavia, afastou-se da Presidência por motivo de saúde. Carlos Luz, presidente da Câmara dos Deputados, que o sucedeu, apoiava os rompantes golpistas e não atendeu aos apelos de Lott.
Em consequência, Lott pediu exoneração do Ministério da Guerra e iniciou o chamado golpe preventivo. Narra-se que “O general Lott mobilizou tropas militares no Rio de Janeiro e realizou um golpe militar fulminante. As tropas lideradas por Lott tomaram o controle de unidades militares e invadiram prédios governamentais, além de estações de rádio e jornais. Além disso, anunciou a deposição do presidente interino Carlos Luz”.
Os deputados federais, posteriormente, ratificaram a deposição de Carlos Luz, sendo a Presidência assumida por Nereu Ramos, presidente do Senado. Dessa forma, Lott assegurou a legalidade, confirmando a posse de JK para 1956. Dias depois, Café Filho tentou reassumir a presidência do Brasil, sem sucesso. Assim, o país ficou em Estado de Sítio até a posse de Juscelino, em 31 de janeiro de 1956.
Pois bem.
Os fatos descritos acima são apenas um fragmento de nossa história política. Concorde-se ou não com o ocorrido, o fato é que o general Lott garantiu a legalidade naquele momento de tensão político-institucional. Foi através de seu golpe preventivo, ou contragolpe, que Juscelino assumiu o Poder, já que fora legitimamente eleito.
Hoje, vivemos noutros tempos. Tempos nos quais deve existir o respeito ao Estado democrático de Direito e às instituições que formam a República Federativa do Brasil.
E qual o papel das Forças Armadas no atual contexto da sociedade brasileira?
De acordo com o artigo 142 da vigente Constituição Federal, “as Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”.
Ou seja, devem agir em defesa da Pátria, garantindo os Poderes constitucionais (Executivo, Legislativo e Judiciário), visando a assegurar a independência e o respeito de suas funções. Além, é claro, de assegurar a legalidade e a ordem.
“Constituem, assim, elemento fundamental da organização coercitiva a serviço do Direito e da paz social. (…) são, portanto, os garantes materiais da subsistência do estado e da perfeita realização dos seus fins. Em função da consciência que tenham da sua missão está a tranquilidade interna pela estabilidade das instituições”, ensina o professor José Afonso da Silva.
É o que se espera das Forças Armadas.
Nem mais. Nem menos.
Odemirton Filho é bacharel em Direito e oficial de Justiça