domingo - 26/07/2015 - 08:08h

Protagonistas do silêncio

Por Marcos Pinto

“Não  aceito que  ousem   estrangular a   inconfundível  voz  e  eco  do  meu  silêncio”. (Marcos  Pinto).

Há  uma  célebre  e  contextualizante  frase,   de  abissal   teor  emotivo,    que  traz uma   rubrica  eternizante,  preceituando  que  “Quando  uma  lágrima  contém  o  oceano  e  o minuto  a  eternidade,  é  porque  o  silêncio  fala   o  que  precisamos  ouvir”.  Não  há como dissociar  o    silêncio   sepulcral     da  imensidão  de  uma  noite  mal  dormida, misteriosa, insondável  e  tocante.

Existem    protagonistas   e  silêncios  diversificados  no  cenário  da  solitude.  Quantas  vezes  buscamos, de   forma   incontida, o  famoso  silêncio  obsequioso ?.  Quando   as  tribulações   e  vicissitudes   são vividas   em  silêncio,  DEUS  nos   honra  com sua  doce  e  sublime   benção.

Na   agitação  cotidiana  urge  a   premente  necessidade  de se  buscar  o refúgio  de  nossos  problemas   no   indescritível   silêncio   das  matas, onde  o   silêncio   vende  sonhos  para  montar  um  instante.  Nesse  ermo, distante  do   estafante  e  enlouquecedor  burburinho  das   grandes   cidades,  encontramos  a   certeza   incontestável   e  inexpugnável  de que  o  silêncio  tem  como  como   protagonistas  siameses  o  eco, a  melodia,  oceanos  de  indagações,  a   plenitude,  a  plenitude  da  lucidez,  os  mistérios  e  seus  mistérios,  a  transcendentalidade, a  ótica  da  ilusão, o  escudo  para  a  alma.

Alguém já  frisou   que  “Sozinho  é  uma  coisa, solitário  é  outra.  Sozinho   é  com,  solitário  é  sem”.    Tenho  como  emblemático  prazer   visitar   vetustos  mosteiros  e  conventos  seculares,  onde  interajo  de  corpo  e  alma,  respirando como  que  um  odor  de  santidade   no   contagiante  silêncio   predominante  entre  aquelas   grossas  paredes, guardiães  de  segredos  indevassáveis.

Venero-os  por  serem   redutos  e  guardiãs    dos   insondáveis   mistérios  de  fé. Isento  de  total   rasgo  de   identidade  de  culto  religioso, posso  afirmar  que  o silêncio   é  uma  preciosa   pérola  lapidada  por  Deus.  Não  aceito, em  nenhum   hipótese, que  ousem  estrangular   a  inconfundível   voz  do  meu  silêncio.  Tenho  dito  e  reiterado.

Antes  de  iniciar  sua  vida   pública, logo   após  ter  sido  batizado  por João  no  rio Jordão,  Jesus  passou  40   dias  no  deserto.   Esse  retiro  espiritual  de  Jesus   mostra  a  necessidade  que  ele  teve  em  se  preparar  para  a  missão   que  o  esperava.

É na  oração e  no  recolhimento   que  discernimos   a  vontade   para   nossas   vidas.   Jesus  experimentou   o   encontro  com   o  pai  em  sua  totalidade, no silêncio e na solidão do  deserto.  Não  resta  dúvidas  de  que  o   silêncio  é o melhor rebuço para quem se não quer  revelar, ou fazer-se   conhecer.

O  celebrado  historiador   brasileiro  Hélio  Silva, autor  de  oitenta  livros,  optou  por  entrar  para  o   Mosteiro  de  São  Bento  do  Rio  de  Janeiro   na  década  de  1990, assumindo   o  nome  de  Dom  Lucas.   Permaneceu  na  Ordem  Beneditina   até  sua  morte, ocorrida   a   21.02.1995.

Até  no  perdão o  silêncio   se  faz  presente,  uma   vez  que  é   “a  gentileza  do   perdão  que  se  cala”.

O  renomado  e   introspectivo  intelectual  potiguar  François  Silvestre   incorreu  na  mesma  opção  dos  grandes Pensadores,  volvendo, após  merecida  aposentadoria,  seus  olhos  e  seu  coração  pelo  fantástico  silêncio  dos  longes, predominante  insuperável  na  sua  serra  do  Martins,  cujo   reduto  batizou-o  com  o   venerado  nome  de  “Mirante   Mãe  Guilhé”.   É  onde  respira  ar   100%   puro  e  bebe  paz  espiritual  no  doce  silêncio  do  ermo  daquelas  matas.

É, também, onde  faz  a  tessitura  quase  perfeita  da  dialética  convincente  dos  seus  livros  e  artigos.  É   naquele  misterioso  rincão  onde  ele encontra  a  segurança  dos  argumentos.

Costumo  me  internar, no  período  invernoso,   nas   poucas  matas  nativas  da  serra  do  meu  amado  Apodi,  quando  então  fico  farejando  o  céu com  o  desvelo  do  suave  silêncio.  É  certo  que,  às  vezes, o  silêncio   mais  parece  um  abismo  com  uma   porta   aberta.  Nos momentos  de  tristeza   cruciante   assume   a  feição   e  o  peso  de   uma  âncora  no  peito.

Nesse  diapasão,  entra  em  sintonia  com  a  alma,  escorrendo   dolente  saudade  no abismo  imensurável  das   recordações.

Emoldura-se, assim,  Alma, Coração  e  Vida,  em   perfeita  sincronia  com os  emblemáticos    mistérios  divinos.  Diante  todas  essas   digressões  espirituais,  conforta-me  a  certeza  de  que  o   silêncio  é um  enigmático  viveiro  de  eloquências    invisíveis.   INTÉ !.

Marcos Pinto é escritor e advogado

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Categoria(s): Crônica

Comentários

  1. FRANSUELDO VIEIRA DE ARAÚJO diz:

    Parabéns Caro Colega Marcos Pinto pelo brilhante e envolvente artigo que muito bem, poderia se chamara A Doce Sinfonia de Seu Silencio, título do livro de autoria de Luciana Scotti;

    Também gosto muito do silencio, silencio que não esqueçamos, representa a possibilidade única de nos propormos à reflexão e o equilíbrio em mundo tão raso, superficial e tão volatilizado pela automação e a rigidez dos horários que nos impõe o dia-a-dia da dita vida vida contemporânea.

    Valorizo muito os momentos de solitude e reflexão.E a hora de suspirar fundo e ouvir a doce, profunda e fecunda sinfonia do nada.

    É deitar na rede em noite escura, fitar a vastidão do espaço e ficar olhando dentro dos lindos e profundos olhos negros do infinito.

    É, sobretudo poder mergulhar no oceano das nossa verdades, mentiras e contradições e, por conseguinte exercitar a autocrítica e negociar nossos conflitos com nossa engenhosa e atávica condição e formação autoritária.

    UM baraço

    FRANSUÊLDO VIEIRA DE ARAÚJO.
    OAB/RN. 7318.

  2. Marcos Pinto. diz:

    Muitíssimo obrigado nobre amigo e querido vizinho Fransuêldo. Confesso que fico até meio sem jeito Quanto as referências a minha pessoa. Abraço.

  3. Marcos Pinto. diz:

    Amigo Fransueldo, com muita identidade espiritual faço de suas transcendentais palavras um fecundo e profícuo adendo ao meu despretensioso artigo. Abraçaço.

  4. naide maria rosado de souza diz:

    Deus do céu. Que beleza, Marcos Pinto e Fransuêldo Vieira de Araújo.
    Sempre me questionei de onde tirara o “silêncio do bosque” que é o meu maior silêncio, em que, no mesmo espaço, estamos eu e eu e mais ninguém. Espaço no qual, nós duas, eu e eu mesma, podemos, caladas, responder a tudo que nos foi questionado ou cobrado ou o que censuramos em nossas atitudes. Não é uma questão de dupla personalidade. É contar comigo para me corrigir ou dizer que estou certa. Para isso preciso do “silêncio do bosque”. Para responder a uma ofensa, raro acontecer, recorro ao silêncio do bosque e, calada, ele fala por mim. Na ausência do som, a paz que me acompanha, que acompanha a mim e minha fiel escudeira, eu mesma.

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