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domingo - 16/06/2024 - 11:22h

Quindão

Por Bruno Ernesto

Foto do autor da crônica

Foto do autor da crônica

Nunca fui um apreciador de doces e bolos, sendo minha lista de preferência bem restrita.

Para quem me conhece, sabe que prefiro comida salgada e, graças à genética, por não ter tendência à hipertensão, posso manter o paladar satisfeito, apesar dos carões e protestos de quem me vê. Para amenizar as críticas, tenho adotado flor de sal.

Quando eu era criança, minha mãe fazia um bolo de cenoura com cobertura de chocolate que era uma iguaria sem precedentes, e que, apesar de ser um bolo simples e muito conhecido, nunca comi um melhor do que o dela.

Por sinal, faz um bom tempo que não vejo um exemplar dele lá na casa dela, além do que, talvez ela fique até surpresa com o valor que cobram por uma fatia de um bolo de cenoura.

Dia desses, parei para tomar um café e avistei um exemplar de um bolo de cenoura na vitrine ao preço de R$14,00, a fatia.

A plaquinha do preço sequer indicava se a cenoura era orgânica, se a manteiga era da Normandia, de qual região da França era a farinha, se o leite era de uma vaca holandesa premiada, se o açúcar era demerara de um lote exclusivíssimo da extinta Companhia Holandesa das Índias Ocidentais, ou mesmo se a não generosa cobertura de chocolate era da famosa marca suíça Lindt. Quanto aos ovos, imagino que seja da fábula de Esopo.

Comi uma fatia, mas não chegou nem aos pés do bolo de cenoura que minha mãe faz com ingredientes locais.

Já provei inúmeros doces e bolos mundo afora, mas os que mais gosto são as receitas simples, sem muita firula.

Claro. Evidente. Concordo. As novas receitas e sabores são mais que bem-vindos.

Desde que se possa comer sem culpa, nem se precise utilizar a célebre frase de Tim Maia, que ao ser indagado acerca da sua dieta, soltou a pérola, de que em duas semanas de dieta, tinha perdido 14 dias.

E torno a registrar: não quero morrer sadio.

Se serve de alento –  para mim – tive uma grata surpresa ao retornar a uma padaria próximo à minha casa em Natal e ver que a tradicional padaria inovou o tradicional doce português, já naturalizado brasileiro, quindim.

Quando fui pegar uma baguete na prateleira, de relance, e de soslaio, vi aquele amarelão reluzente, do tamanho de um prato, com uma plaquinha dizendo: açúcar refinado, gema, leite integral, côco ralado e manteiga. Quindão.

Bruno Ernesto é advogado, professor e escritor

 

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Categoria(s): Crônica

Comentários

  1. Julio Rosado Filho diz:

    São tantas as capas neste texto. Memórias, família, prazeres, afetos, tradição . . ., mas uma frase me chamou a atenção: ‘não quero morrer sadio’. Acredito que você, e todo mundo, tem a mesma concepção, mesmo aqueles que não a admitem por receio de falar sobre morte.

    -Mais uma fatia de quindão, por favor.

    -Das grandes, dessa vez.

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