quinta-feira - 21/09/2023 - 18:12h
Câmara Cascudo

“Cariri Cangaço” começa nesta quinta-feira em Natal

Cariri Cangaço sobre Câmara Cascudo - 21 a 23 de setembro de 2023Começa nesta quinta-feira (21), em Natal, no Centro Universitário do RN (UNI-RN), o “Cariri Cangaço Personalidade.” Programação de abertura está marcada para as 18h30.

O personagem abordado por essa iniciativa é o escritor Luís da Câmara Cascudo (1898-1986).

“Luís da Câmara Cascudo – o homem, a obra, o mito” – é o tema da iniciativa conjunta do do Cariri Cangaço, ao lado da Uni-RN, Instituto Histórico e Geográfico do RN (IHGRN) e Instituto Câmara Cascudo.

21 de setembro de 2023- Quinta-Feira

NOITE SOLENE DE ABERTURA

18h30 Auditório da UNI-RN

Rua Prefeita Eliane Barros, 2000 – Tirol – Natal – RN

Formação da Mesa Solene de Abertura

DALADIER PESSOA CUNHA LIMA – Magnifico Reitor da UNI

MANOEL SEVERO BARBOSA- Curador Cariri Cangaço

DALIANA CASCUDO – Ludovicus – Instituto Câmara Cascudo

HONÓRIO DE MEDEIROS – Instituto Histórico e Geográfico do RN

19h Hino Nacional

19h15 – Entrada do Estandarte do Cariri Cangaço

CAPITÃO QUIRINO e CÉLIA MARIA

19h40 – Apresentação do Cariri Cangaço

Conselheira LUMA HOLANDA – João Pessoa PB

Conselheiro BISMARCK OLIVEIRA Pocinhos PB

19h50 – Cumprimentos aos Convidados

DALADIER PESSOA CUNHA LIMA – Magnifico Reitor da UNI

MANOEL SEVERO BARBOSA- Curador Cariri Cangaço

DALIANA CASCUDO – Ludovicus – Instituto Câmara Cascudo

HONÓRIO DE MEDEIROS – Instituto Histórico e Geográfico do RN

20h30 – Entrega de Diplomas “Mérito Cultural Cariri Cangaço”

1.UNI – RN  – REITOR DALADIER PESSOA CUNHA LIMA

2.Ludovicus – Instituto Câmara Cascudo – DALIANA CASCUDO

3.Instituto Histórico e Geográfico do RN- HONÓRIO DE MEDEIROS

20h45 – Comenda “Personalidade Eterna do Sertão”

LUIS DA CÂMARA CASCUDO

Camilla Cascudo Barreto Maurício

Entrega de Comenda por Conselheiros

CARLOS ALBERTO DA SILVA e KYDELMIR DANTAS

Veja programação completa AQUI, que vai transcorrer até o próximo dia 23 (sábado).

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segunda-feira - 18/09/2023 - 16:28h
Em marcha

Comitiva do Instituto Histórico percorre o Alto Oeste potiguar

Comitiva faz registros importantes para cultura e conhecimento do RN (Foto: Bárbara Michaella)

Comitiva faz registros importantes para cultura e conhecimento do RN (Foto: Bárbara Michaella)

Continua a viagem da Comitiva do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte. Formada pelos escritores Honório de Medeiros, André Felipe Pignataro Furtado de Mendonça e Menezes e Gustavo Sobral, além de Bárbara Michaella Ferreira Lima, ela segue os passos da Comitiva de Pedro Leão Veloso, em 1861, pelo sertão. Agora, a Comitiva passou pelo Alto Oeste.

Percorreu caminhos de Patu, Martins, Pau dos Ferros, Portalegre e Apodi entre os dias 07 e 10 de setembro.

Uma breve reunião de imagens que retratam algumas das passagens da Comitiva estão no Instagram @comitiva1861 e no site pessoal de Gustavo Sobral – gustavosobral.com.br. Neles, é possível baixar em arquivo digital, disponível para download gratuito, os cadernos com narrativas da viagem.

Acompanhe, curta, comente e compartilhe.

A comitiva

Em 1861, a Comitiva do presidente da Província Leão Veloso saiu para uma viagem de 44 dias pelo sertão do Rio Grande do Norte. Foram e voltaram de navio e percorreram o sertão a cavalo. Agora, em 2023, os escritores Honório de Medeiros, André Felipe Pignataro e Gustavo Sobral refazem o itinerário em uma Comitiva do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte.

O Instituto – 121 anos

Fundado em 1902, o Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte completou 121 anos em 2023. É a mais antiga instituição cultural potiguar. Abriga a biblioteca, o arquivo e o museu mais longevos em atividade do Estado. Promove exposições, palestras e atividades voltadas à manutenção e divulgação da cultura, história e geografia norte-rio-grandense, e publica a sua revista desde 1903, sendo a mais antiga em circulação no Rio Grande do Norte.

Saiba mais sobre Leão Veloso, a Comitiva e essa marcha de importante valor cultural lendo – Leão Veloso, por Honório de Medeiros.

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domingo - 06/08/2023 - 04:30h

Um herói mossoroense (Manoel Duarte)

Por Honório de Medeiros

Capela de São Vicente foi ponto decisivo da resistência de Mossoró em 13 de junho de 1927 (Foto: reprodução)

Capela de São Vicente foi ponto decisivo da resistência de Mossoró em 13 de junho de 1927 (Foto: reprodução)

Um preciso tiro de fuzil ecoou no final de tarde nublada do dia 13 de junho de 1927 e, aproximadamente cem metros além, a bala atingiu o meio-da-testa de um caboclo puxado para o negro aparamentado com a indumentária típica do cangaceiro, prostando-o na terra nua, de barriga para cima, a olhos fixos e vazios voltados para o céu acima, bem ali onde a Avenida Rio Branco cruza a Rua Alfredo Fernandes, onde, na esquina, fica a famosa Igreja de São Vicente cuja imagem, do seu nicho decenal, tudo contemplava.

Era o começo do fim.

No alto da casa do Prefeito Municipal – o líder que começara a epopeia -, no telhado, o atirador viu quando outro cangaceiro, de um trigueiro carregado se aproximou, rastejando e disparando, da vítima, e começou a rapiná-lo, retirando freneticamente, de seus bolsos, munição, dinheiro e joias. Calmamente, mirou e aguardou.

Pressentindo o perigo iminente o bandido ergueu o tronco elevando os olhos até o telhado da casa cuja frente fora tomada por fardos de algodão prensados para servirem de barreira. Foi apenas um momento, mas foi fatal.

Outro tiro de fuzil ecoou e, no mesmo local onde seu companheiro jazia sem vida o cangaceiro foi atingido.

O violento impacto da bala derrubara-o momentaneamente e desenhara, em seu tórax, uma rosa de sangue. Seus parceiros, paralisados, perplexos, observavam incrédulos. Começou a debandada.

Enquanto os resistentes percebiam que a ameaça fora sustada e o recuo dos cangaceiros era generalizado, o atirador recolhia o fuzil e fitava a cidade no prumo que tinha a Igreja de Nossa Senhora da Conceição como limite. Olhava e pensava.

Ele tinha morto um cangaceiro e ferido mortalmente outro. Não havia dúvida quanto à importância desse fato para a vitória. Mas cangaceiros são vingativos, cangaceiros são ferozes, cangaceiros são cruéis. Cangaceiros são dissimulados e não esquecem nunca, matutava ele com seus botões.

Se ele aceitasse passivamente as homenagens que lhe seriam tributadas a partir daquele momento tudo poderia, no futuro, desandar no gosto amargo causado pela retaliação de algum anônimo, talvez até mesmo em algum parente, como era prática comum na vida cangaceira. Não que fosse medroso. Ao contrário.

Todos quantos lhe conheciam podiam atestar sua coragem e perícia com as armas, que já ficavam lendárias. Mas era melhor se precaver. Era melhor silenciar. Não seria o caso de negar veementemente, por que não era homem para esse tipo de extroversão mentirosa. Mas ia silenciar. Não ia comentar nada.

Duarte, um herói de verdade

O que estava feito, estava feito, e era de acordo com seu temperamento reservado. Se lhe perguntassem, mudaria de assunto. Se comentassem em alguma roda da qual estivesse fazendo parte, sairia de mansinho. Guardaria a verdade consigo, por muito e muito tempo, e a contaria apenas para alguns escolhidos.

Naquele dia banal, muito tempo depois, sozinho com seu neto de dez anos de idade, sentiu vontade de contar aquilo que nunca contara a ninguém. Era uma necessidade da alma, um anseio de perpetuar um feito honroso, um gesto de heroísmo que o mostrava tão diferente dos que tinham fugido em direção ao mar quando os cangaceiros ciscavam nas portas de Mossoró, um gesto que lhe orgulhava por que defendera sua família e sua cidade a um custo alto, que era o de tirar a vida de alguém.

Olhou para o neto e compreendeu que ali estava o interlocutor perfeito. Não questionaria, não interromperia, não esqueceria. Guardaria a lembrança do dia e do relato. Assim sendo começou a lhe contar todo o episódio, detalhe por detalhe.

O neto apenas olhava intensamente e sentia que estava sendo transmitido, para ele, algo muito importante e que somente no futuro seria plenamente entendido. Acalmou sua inquietude de menino. Não desgrudou o olho do seu avô, aquele homem reservado e pouco propenso a confidências.

No final, quando toda a história havia sido contada, compreendeu que devia guardá-la consigo, até mesmo esquecida, por algum tempo. Em um final de tarde tipicamente mossoroense, de muito calor, em um café, o neto se aproximou de uma roda de estudiosos do cangaço e percebeu que discutiam a participação do seu avô na invasão da cidade pelo bando de Lampião. Uns diziam que havia sido ele o autor dos disparos. Outros negavam e apontavam nomes.

Quase oitenta anos haviam se passado do episódio. O neto, agora, era cinquentão. Sentiu que ali estava o momento certo para contar a história, a sua história, a história do seu avô. Aquela plateia saberia ouvi-lo e entenderia plenamente as razões do silêncio da família.

Contou tudo.

Fechou-se o ciclo.

Dezenas de anos depois já não há mais dúvidas. O atirador postado no alto da casa de Rodolpho Fernandes, o homem que praticamente abortara a invasão lampiônica, o herói entre heróis fora Manoel Duarte. Esta é a verdade, como o sabe sua família e a contou seu neto, Carlos Duarte, jornalista, muitos anos depois, a mim, que registro, aqui, a história, e a Kydelmir Dantas e Paulo de Medeiros Gastão, estes últimos dirigentes da Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço – SBEC.

Honório de Medeiros é professor, escritor e ex-secretário do Estado do RN e da Prefeitura do Natal

P.S – Décadas depois desse feito, ele foi homenageado com o nome de um largo à Avenida Rio Branco, além de busto, de frente onde fora sua casa. Mas na construção da chamada “Praça da Convivência” no primeiro governo Fátima Rosado (DEM),  o busto foi retirado.

A peça de bronze foi localizada semanas depois num depósito de ferro velho, pronta para ser derretida. A intervenção de sua família e do então “Jornal Página Certa” fez com que o governo municipal arranjasse um meio de reparar o crime à história e à cultura de Mossoró, doando outro espaço à fixação do busto.

*Texto originalmente publicado no dia de 26 de junho de 2011, nesta página. Portanto, há quase 12 anos e dois meses (veja AQUI).

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domingo - 23/07/2023 - 10:10h

Leão Veloso

Por Honório de Medeiros

Leão Veloso (Reprodução)

Leão Veloso (Reprodução)

Leão Veloso (Pedro Gomes Leão Veloso) nasceu em Itapicurú, Bahia, no dia 1º de janeiro de 1828. Formou-se em Direito pela Faculdade de São Paulo. Filiou-se ao Partido Conservador e foi várias vezes Deputado Provincial pela Bahia. Presidiu a Província do Espírito Santo, Alagoas, Maranhão e, então, de 1861 a 1863, o Rio Grande do Norte.

Depois, ainda administrou o Piauí, o Pará e, por duas vezes, o Ceará.

Em 1878, foi escolhido Senador do Império pela Bahia. Ministro do Império em 1882 chegou, finalmente, a Conselheiro de Estado em 1889.

O melhor relato acerca de Leão Veloso no Rio Grande do Norte é de Câmara Cascudo, em seu Governo do Rio Grande do Norte[1], no qual consta que ele visitou o interior da província, indo a Mossoró e, em julho de 1862, a Caicó.

É uma informação extremamente suscinta acerca da viagem que a Comitiva Governamental empreendeu ao interior do Rio Grande do Norte, chegando a entrar na Paraíba, visitando Macau, Açu, Acari, Jardim do Seridó, Caicó, Martins, Portalegre, Patu, Pau dos Ferros, e Mossoró.

Nessa viagem, que durou 44 dias, e que começou no dia 16 de julho de 1861, às 8 horas da manhã, no vapor Jaguaribe, fez-se acompanhar por João Carlos Wanderley, inspetor da tesouraria provincial; Ernesto Augusto Amorim do Vale, engenheiro; Manoel Ferreira Nobre, ajudante de Ordens; e Francisco Othilio Álvares da Silva, jornalista, que registrou tudo, em deliciosas crônicas, para o jornal O Recreio[2].

162 anos depois, neste ano da graça de 2023, Honório de Medeiros, André Felipe Pignataro e Gustavo Sobral, em uma comitiva do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte (IHGRN), vão refazer o mesmo percurso e, ao final, da mesma forma que a viagem anterior de Leão Veloso originou um relatório governamental, desta vez um outro será apresentado formalmente, por eles, ao Instituto[3].

Cascudo lembra que durante a administração de Leão Veloso, a Província atravessava um período de grande depressão econômica e isso o levou a comprimir as despesas por todos os lados:

Diminuiu até a iluminação pública, cortou três cadeiras do Atheneu, demitiu dezenas de funcionários. Seu “Relatorio” (16-2-1862) é um dos documentos mais completos, elevados e nítidos que possuímos da administração Imperial. Nada conheço superior. A situação financeira era terrível. O funcionalismo estava morrendo de fome, (mas) Leão Veloso, energicamente, enfrentou o problema, atacando despesas inúteis e suprimindo tudo quanto lhe parecia adiável.

Por fim, arremata Cascudo: “Veloso tem (teve) ideias originais e justas”.

Difícil é tirar Leão Veloso do limbo da história. Entretanto, não é possível esquecermos a ousadia de sua viagem, a primeira do gênero no Rio Grande do Norte, que seria repetida no período de 16 a 29 de maio de 1934, pelo Interventor Federal Mário Câmara, em cuja comitiva oficial constavam Anfilóquio Câmara (Diretor geral do departamento de Educação); Antônio Soares Júnior (Prefeito de Mossoró); Alcides Franco (Chefe da segunda seção técnica do Serviço de Plantas Têxteis); e Oscar Guedes (inspetor do mesmo Serviço), e Luís da Câmara Cascudo.

Dessa viagem, surgiu Viajando o Sertão, publicado em 1934 no formato de livro e também como uma série de crônicas no jornal “A República” de 31/05 a 22/07 de 1934.

Assim como, em um remate à contraluz, difícil é esquecer que Leão Veloso, segundo Bruno Agostini[4] é o criador da sopa que leva o seu nome, “um prato carioquíssimo criado no Rio Minho, berço desse caldo de pescados encorpado, feito com base em peixes e frutos do mar, ainda hoje o melhor lugar para apreciar esse clássico da gastronomia carioca”.

Agostini lembra que viajado e apreciador da boa mesa, Paulo Leão Veloso foi diplomata do Brasil em vários países, entre eles a França. Foi lá que ele conheceu a Bouillabaisse, sopa típica de Marselha, no sul da França, às margens do Mediterrâneo. E foi essa receita que inspirou a versão carioca, que ganhou o nome do sujeito que teria passado, na década de 1910, provavelmente, o modo de preparo aos donos do Rio Minho.

“Isso não aconteceu apenas para homenagear Pedro Leão Velloso Neto. Cozinheiros, garçons e muitos clientes não conseguiam pronunciar corretamente Bouillabaisse. Portanto, a sopa carioca não é um ‘plágio’ da francesa, como se pensou por muito tempo, porém uma aculturação em função da disponibilidade de produtos e, sobretudo, da dificuldade de comunicação”, escreveu o maior jornalista da História da Gastronomia Brasileira, J.A. Dias Lopes, colunista da Veja (leiam, basta seguir no Facebook).

E eis a receita[5]:

Lave os camarões e mexilhões e reserve. Retire a cabeça do peixe, coloque-a em um caldeirão, cubra com cerca de 5 litros de água fria, tempere com sal a gosto, leve ao fogo alto e deixe ferver. Junte o amarrado de ervas, tampe o caldeirão, abaixe o fogo e cozinhe por cerca de 1h30. Elimine a cabeça do peixe e o amarrado de ervas, coe o caldo e leve novamente ao fogo. Coloque os camarões em uma cesta de arame para fritura, mergulhe no caldo, cozinhe somente até ficarem rosados, tire do caldo, elimine as cascas, limpe e reserve. Faça o mesmo com os mexilhões até as conchas se abrirem, tire do caldo, remova as conchas e reserve. Mantenha o caldo em fogo alto. Amasse os dentes de alho com grãos de coentro e 1 colher (chá) de sal até obter uma pasta, acrescente ao caldo, junte cheiro verde, tomates, tempere com pimenta, deixe ferver, tampe a panela, abaixe o fogo e cozinhe até os tomates ficarem macios. Corte o peixe em postas, tempere com sal e pimenta, coloque azeite em uma panela, aqueça em fogo médio, junte as postas de peixe, frite até ficarem douradas, tire do fogo e elimine a pele e espinhas. Desfie a carne do peixe, acrescente ao caldo junto com as carnes de siri e lagosta, camarões e mexilhões. Coloque um pouco de água na panela onde o peixe foi frito, deixe ferver, junte ao caldo, misture, verifique o tempero e deixe ferver mais.

Pedro Gomes Leão Veloso faleceu no Rio de Janeiro, a 2 de março de 1902.

Honório de Medeiros é professor, escritor e ex-secretário da Prefeitura de Natal e do Governo do RN

Referências

[1] CASCUDO, Luís da Câmara. Governo do Rio Grande do Norte. Mossoró, Coleção Mossoroense, série “C”, volume DXXXI: 1989.

[2] Com informações do jornalista e escritor Gustavo Sobral (gustavosobral.com.br).

[3] As peripécias da viagem estão em @comitiva1861

[4] //menuagostini.com.br/retrato-de-um-prato-a-sopa-leao-veloso-a-versao-carioca-da-francesa-bouillabaisse/

[5]andrecasabella88

Leia tambémComitiva do Instituto Histórico vai registrar viagem num ‘diário’

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Categoria(s): Crônica
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sexta-feira - 21/07/2023 - 22:30h
Sertão

Comitiva do Instituto Histórico vai registrar viagem num ‘diário’

Gustavo, Honório e André Felipe: comitiva dia após dia Foto: divulgação)

Gustavo, Honório e André: comitiva dia após dia numa viagem que ‘se repete’ (Foto: edição do BCS)

Os escritores Honório de Medeiros, André Felipe Pignataro e Gustavo Sobral, compondo uma delegação oficial do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte (IHGRN), pretendem refazer o itinerário da comitiva do presidente da província potiguar, Leão Veloso (veja AQUI). O presidente saiu em 1861 de Natal para uma viagem de 44 dias pelo sertão do Rio Grande do Norte.

O resultado daquela viagem saiu em reportagem no jornal O Recreio, assinada por Francisco Othilio Álvares da Silva. Outra foi realizada por Câmara Cascudo, nos anos 1930, na comitiva do interventor Mário Câmara. O resultado foi documentado em jornais impressos da época, na forma de artigo, que resultou no livro “Viajando o Sertão”.

Em razão da repercussão que a viagem da Comitiva do IHGRN tem causado, e, atendendo a pedidos dos interessados, os seus membros criaram um perfil na rede social Instagram. Vão registrar nele os caminhos percorridos, transformando a plataforma num ‘diário’.

Aos interessados, basta seguir, compartilhar, curtir e comentar no Instagram, no perfil @comitiva1861.

A primeira etapa do percurso está marcada para 27 de julho, com saída de Natal rumo a Macau, seguindo o itinerário. O mais, é aguardar os relatos dos caravaneiros.

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domingo - 16/07/2023 - 08:42h

Escritores – Sérgio Dantas

Por Honório de Medeiros

Sérgio Dantas tem vários livros publicados sobre temática do cangaço (Foto: Lampião Aceso)

Sérgio Dantas tem vários livros publicados sobre temática do cangaço (Foto: Lampião Aceso)

Sérgio Dantas é, desde algum tempo, o principal pesquisador e escritor acerca do cangaceirismo no Rio Grande do Norte, graças à seriedade e talento com o qual trata do assunto.

Autor cuidadoso, seus livros se tornaram referências em razão do zelo que é sua marca registrada, e, aos poucos, sua obra, ou seja, o conjunto dos seus estudos publicados ao longo do tempo, o creditam, pela relevância, como um nome de expressão nacional.

Não há um livro “menor” dentre os que escreveu, seja Lampião no Rio Grande do Norte; ou Lampião na Paraíba – Notas para a História; passando por Lampião, o Processo de Martins; Antônio Silvino, o Cangaceiro, o Homem, o Mito; Lampião entre a Espada e a Lei; até Corisco, A Sombra de Lampião. Todos merecem ser presença certa na biblioteca de qualquer estudioso do cangaceirismo.

Lampião no Rio Grande do Norte, cujo subtítulo é “A história da grande jornada”, livro de estreia de Sérgio Augusto de Souza Dantas, é uma obra seminal, cujo tema central, o ataque a Mossoró em junho de 1927 liderado por Lampião, é analisado minuciosamente a partir de informações colhidas durante quatro anos de pesquisa, perambulações, visitas, entrevistas, cruzamento de informações, consulta à literatura hoje vastíssima acerca do cangaceirismo. Para coroar, um valioso acervo fotográfico é colocado à disposição do leitor.

Em relação a Massilon, cangaceiro cuja importância no ataque é muito relevante, Sérgio Dantas agregou informações valiosíssimas, dentre elas o “raid” que esse personagem singular empreendeu nos costados do Jaguaribe e Cariri logo após o episódio de Mossoró.

Segundo livro do autor (Reprodução)

Segundo livro do autor (Reprodução)

Isso significa dizer que a lenda segundo a qual Massilon, antes da célebre foto de Limoeiro, Ceará, já se separara de Lampião e teria ido embora para o Norte, não é verdadeira.

Detalhada, a história da “jornada” espanta pela riqueza de detalhes. Não por outra razão ficamos sabendo de cada passo do grupo cangaceiro por todo o território do Rio Grande do Norte, cidade por cidade, povoado por povoado, sítio por sítio, fazenda por fazenda.

Os acontecimentos nas cercanias de Martins e Umarizal, antiga “Gavião”, são relatados com precisão. E tudo quanto aconteceu em Apodi, antes da chegada de Lampião, protagonizado por Massilon, recebe tratamento de pesquisador sério e interessado.

A descrição geográfica e sociológica dos lugares pelos quais passou o bando de cangaceiros merece respeito. Através dela é possível perceber o dia-a-dia daquelas comunidades existentes no início do século XX. Os relatos dos mal tratos, arruaças, bebedeiras, torturas físicas e psicológicas nos comove e revela a sensibilidade do Autor.

Quanto a Antônio Silvino, o Cangaceiro, o Homem, o Mito, somos apresentados a um cangaceiro cru, recortado do contexto mítico inserido em sua dimensão humana, sem que restasse perdido tudo quanto o tornou um dos mais interessantes personagens da trindade básica que forjou a alma sertaneja – o cangaço, o misticismo, o coronelismo.

Louve-se a felicidade na escolha do “nome” de cada capítulo bem como o excerto que o acompanha, próprio para chamar a atenção do comprador desatento, em uma homenagem ao estilo jornalístico de outrora, e a indicar um texto enxuto, leve, de parágrafos curtos e bem encadeados.

Chamam a atenção episódios, trazidos a lume, que por si somente têm dimensão histórica, como a convivência entre Antônio Silvino e Gregório Bezerra, lendário líder comunista pernambucano, sua entrevista com Graciliano Ramos, e o assalto à Usina Santa Filonila na qual morreu Feliciana na flor da idade – crime do qual o cangaceiro jamais deixou de se arrepender.

O Antônio Silvino que emerge do ótimo texto de Sérgio Dantas é um personagem emblemático: é o retrato nítido de uma saga que nos permite identificar e compreender os nexos causais que originam certa circunstância histórica – o período do cangaceirismo – e até mesmo ir além, na medida em que também permite identificar o viés comum a entrelaçá-los, ou seja, a questão do Poder Político.

Basta colocar esses retratos sobre a mesa e examiná-los com olhar crítico: Antônio Silvino, Sinhô Pereira, Lampião; Coronel Zé Pereira, Coronel Isaías Arruda, Coronel Floro Bartolomeu; Pe. Cícero, Beato Zé Lourenço, Antônio Conselheiro, tomando distância de qualquer tentativa de tentar a lógica do fenômeno a partir de uma explicação oriunda exclusivamente a fatos alusivos à posse da terra ou luta de classe.

Afinal, a ideia antecede a ação. E a ação, antes de tudo, é sempre algo individual.

É difícil conjecturar se Sérgio Dantas vai se aventurar em novos resgates históricos ou cuidará de desbravar outras fronteiras. Sua obra tem estado, até agora, entre um ciclo e outro: a mera narrativa e a pura interpretação, no que diz respeito à literatura acerca do cangaceirismo.

Um dos livros de Sérgio Dantas (Reprodução)

Um dos livros de Sérgio Dantas (Reprodução)

Talento, não lhe falta.

A mera narrativa provavelmente está perto do fim: já não é mais possível, até onde sabemos, ressalvada a possibilidade de documentos desconhecidos surgirem inesperadamente, prosseguir com a literatura elaborada a partir de relatos, fotos, testemunhos ou escritos, ou seja, fontes primárias.

Dos sobreviventes daquelas “eras” já se extraiu mais do que tudo. Os papéis estão virando pó, vítimas da ação inclemente do tempo e da incúria das nossas elites.

Um outro ciclo está surgindo: a interpretação de todos esses dados, ou seja, uma literatura de tese, iniciado por Frederico Pernambucano de Mello com Guerreiros do Sol, onde se aliou pesquisa de ponta e interpretação dos fatos.

Esperemos, então. E que sua obra, importante como é, além dos merecidos elogios semeie críticas e informações outras, alguma correção de rumo – se for o caso – retornando ainda mais rica para o acervo dos historiadores e sociólogos do Brasil.

É assim que ocorre quando uma obra deixa de pertencer ao Autor, por sua importância, e passa a fazer parte do referencial bibliográfico ao qual pertence.

ESCRITORES

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Honório de Medeiros é professor, escritor e ex-secretário da Prefeitura de Natal e do Governo do RN

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domingo - 09/07/2023 - 06:46h

Escritores – Franklin Jorge

Por Honório de Medeiros

Franklin Jorge é um escritor

Franklin Jorge, “um escritor que sabe praticar a arte da boa escrita.”

A obra literária de Franklin Jorge não permite uma leitura rápida.

No sentido absolutamente estético, convida a uma reflexão, suscitada pelo rigor da forma e profundidade de conteúdo que revela, ao leitor, o paradoxo do máximo, no mínimo.

Como um jogo de sombras e luz, metáfora da estratégia que o autor usa para nos apresentar uma realidade constituída de delicados, embora marcantes textos, através de uma escrita contida, elegante, ele proporciona, ao crítico literário, um ambiente de análise acerca do artista envolto no ato de criar.

A análise será refém dos conceitos de exclusão, contenção, reserva. Algo minimalista. Permite supor que Franklin Jorge constrói, deliberadamente ou não, uma misteriosa fronteira entre o trivial e o necessário, na qual se exclui o óbvio e se expõe uma espécie de ascese intelectual.

Assim, e por esse intermédio, através da leitura de seus textos, é possível resgatar-se o “modus operandi” da criação estética literária que parece perdido nos dias de hoje: teremos não mais a trama banal que consiste na utilização de ícones simplórios, mas, sim, um projeto de arte construído a partir da negação do superficial, para atingir a essência das coisas.

O texto de Franklin – seja Ficções, Fricções, Africções – ou qualquer outro, tem essa alquimia, revela um pouco daquilo que, na arte, é o belo, o simples, o harmonioso. Nada além, nada aquém. Nem a exuberância da sofisticação, tampouco o irracionalismo da ausência. Apenas um verdadeiro impulso de criação.

Mencionei Ficções, Fricções, Africções, a quem Ascendino Leite designou como inteligente e personalíssimo, e o comparou aos textos de Camilo José Cela, mas poderia ser o belo O Spleen de Natal (Romance de uma Cidade), onde Carlos Peixoto percebeu a cidade invisível da qual nos falou Ítalo Calvino em sua obra.

Ou, quem sabe, possa ser O Ouro de Goiás, onde Ubirajara Galli, entusiasmado com sua leitura, cognominou Franklin Jorge de “O Anhanguera Cultural”, lembrando, no dizer típico de um goiano, que “da sua colheita, nada se perdeu”. Bem como o Jornal de Bolso, apresentado por Jaime Hipólito Dantas:

Depois comecei a ler Franklin Jorge em livros, que ele passou a publicar, aqui e lá fora. Surgiu-me o poeta e surgiu igualmente o crítico exigentíssimo de artes plásticas. Enfim, o escritor Franklin Jorge. Com um detalhe, um escritor que principalmente sabe praticar a arte da boa escrita. Um artesão da prosa, como pouquíssimos, por cá. Um artista da palavra, sério, sem desleixos visíveis.

Há outros, tal qual O |Livro dos Afiguraves; Isso é Que é; Fantasmas Cotidianos, com prefácio do magnífico Antônio Carlos Villaça, o estilista:

Franklin escritor, Franklin poeta, Franklin puro artista transcende a circunstância e vê o abismo, convive com o abismo. Vai ao fundo e enxerga longe. Argúcia muita. Um senhor analista, um mestre da instrospecção. Um ser proustiano.

Todos eles, assim como outras mais, formando uma unidade formal estilística, muito embora com conteúdo diverso, posto que constituído por ensaios, poemas, crítica literária, e assim por diante.

E há, não poderia ser diferente, o meu predileto: O Verniz dos Mestres (Anotações e pastiches de um leitor de Marcel Proust) onde, em sua orelha, Franklin logo revela que suas páginas são egressas de O Escrivão de Chatam, seleção de ensaios curtos produzidos em mais de cinquenta anos de leitura, que infelizmente ainda não foi publicado.

Nesse pequeno e denso livro, contendo dez primorosos capítulos, Franklin Jorge aborda a música, arte e memória, crítica, imortalidade, comédia humana e escritura em Marcel Proust. Também escreve acerca do verniz dos mestres, título do livro, ao perscrutar o estilo do grande escritor francês, comparando-o a John Ruskin, o crítico de arte, ensaísta, desenhista e aquarelista britânico.

Saliente-se que os ensaios de Ruskin sobre arte e arquitetura foram extremamente influentes na era Vitoriana.

Lá para as tantas, Franklin observa, em O Verniz dos Mestres:

Em seus últimos sete anos, tentando amortecer os ruídos, Proust viveu enfurnado num quarto forrado de cortiça. Resignado à solidão, queria viver tão somente para ter valor e mérito. Acreditava que a imortalidade era possível, sim, mas somente através da criação de uma obra. Concordava com a ideia de Boudelaire de que a vida verdadeira está alhures, não dentro da vida, nem após, mas fora dela. Nos domínios da arte.

Sua obra, laboriosamente fictícia, transcria a realidade que seria pobre sem o recurso da imaginação. Suas notas lançadas sobre o papel, no curso de sua vida, dão suporte e carnação ao que escreve; compõe-se de brevíssimos insights; a princípio lançado sobre a página em branco, e, depois, obstinadamente em períodos mais longos, agoniantes em seu fluxo, até soar a hora final; em busca da vida verdadeira que só pode ser resgatada e interpretada pela arte. Proust cria um novo realismo, polifônico e impressionista.

Como descrever melhor a saga proustiana?

Mais além:

Olhando a sua volta, Proust viu o que ninguém antes vira. E o viu de maneira crítica, aprofundando-se e “indo mais além”, numa superação das “coisas usuais” que desmerecem o temperamento individualizador do artista de talento capaz de criar um mundo a partir da observação de um grão de areia.

Em outro momento, Franklin amplia sua reflexão e introduz o que seria uma observação plenamente filosófica, de caráter gnosiológico, acerca do alcance da obra de Marcel Proust:

“Proust nos ensina que um livro nunca pode nos contar aquilo que desejamos saber, mas tão somente despertar em nós o desejo de saber, pois não é possível a nenhum indivíduo receber a sabedoria de outrem. É preciso cria-la por nós mesmos. E foi o que ele fez, escrevendo os sete volumes do seu “roman-fleuve” “Em Busca do Tempo Perdido”.

Perfeito. Conhecer é criar; o apreender é uma criação. Cada objeto apreendido é único e é tudo em sua singularidade.

Não se poderia esperar menos de Franklin Jorge do Nascimento Roque, um escritor para escritores: nada além, nada aquém da justa medida.

Natal, 5 de julho de 2023, no outono, quase inverno, da esperança.

ESCRITORES

Leia também: Escritores – Luiz Fernando Pereira de Melo;

Leia também: Escritores – Gustavo Sobral;

Leia também: Raimundo Nonato da Silva.

Honório de Medeiros é professor, escritor e ex-secretário da Prefeitura de Natal e do Governo do RN

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Categoria(s): Artigo
domingo - 02/07/2023 - 08:40h

Escritores – Raimundo Nonato da Silva

Por Honório de Medeiros

Raimundo Nonato da Silva Foto: Relembrando Mossoró)

Raimundo Nonato da Silva Foto: Relembrando Mossoró)

Pensei que descobrira algo diferente, até mesmo estranho, acerca de Raimundo Nonato da Silva. Dizia respeito a sua ubiquidade. Ou predestinação. Deveria ter me precavido contra esse ataque de arrogância pueril e consultado meu Cascudo.

Não o fiz, e tropecei, logo nos primeiros passos da caminhada. Ali estava, em uma Acta Diurna, no livro cujo título é Raimundo Nonato, o Homem e o Memorialista, organizado por José Augusto Rodrigues e publicado em 1987, pela Coleção Mossoroense, para o qual contribuiu a fina flor dos escritores norte-rio-grandenses da época, em homenagem aos 80 anos do grande escritor Martinense:

                   Vida movimentada e curiosa. Está em São Miguel de Pau dos Ferros, 1927/28. (…) 1929/30 está em Serra Negra, até a Revolução de outubro, com a invasão dos bandos que exigem comida, bravateando. (…) Finalmente transferem-no para Mossoró, em 1931. Apodi, um ano depois.

Alguma coisa escapou ao olhar atento de Luís da Câmara Cascudo?

Eis a ubiquidade de Raimundo Nonato, flagrada e descrita pelo mestre: Raimundo em São Miguel, e, depois, escreveu Os Revoltosos em São Miguel 1926; Raimundo em Serra Negra do Norte, e, depois, escreveu A Revolução de 30 em Serra Negra; Raimundo em Mossoró e, depois, veio Lampião em Mossoró, o primeiro livro escrito por um potiguar acerca do Cangaço.

Raimundo Nonato é um portento, eis o que se extrai do que se lê nos textos dos que lhe homenagearam. Memorialista, romancista, poeta, historiador, cronista, biógrafo, etnógrafo, jornalista…

Em sua lendária produção literária, contam-se mais de oitenta livros, mas esse é um número duvidoso: somente pela Coleção Mossoroense, foram mais de 30, prego batido, ponta virada.

Estava em todos os cantos, no momento certo, e abordou muitos temas, como se percebe ao ler Histórias de Lobisomem (folclore); O Pilão (etnografia); Bacharéis de Olinda e Recife (história); Quarteirão da Fome (romance); Memórias de um Retirante (memórias); Província Literária (crônicas); Jornalista Martins de Vasconcelos (biografia); Lampião em Mossoró (história); Terra e Gente de Mossoró (pesquisa acerca do 30 de Setembro de 1883); Visões e Abusões Nordestinas (folclore); História Social da Abolição em Mossoró (história); Serra do Martins (história); Negociantes e Mercadores (história); Jesuíno Brilhante, O Cangaceiro Romântico (cangaceirismo), um livro canônico, referencial, e por aí vai, sem levar em conta os artigos, perfis, discursos, conferências e outros textos publicados em livros e revistas, enquanto participação, bem como jornais do Brasil adentro e afora.

Repita-se, e acrescente-se, para que não reste dúvida: Raimundo Nonato foi o primeiro escritor norte-rio-grandense, salvo algum equívoco, a escrever acerca do Cangaço (Lampião em Mossoró); Coluna Prestes; e Revolução de 1930, no Rio Grande do Norte, bem como o primeiro escritor a lançar uma biografia, por instigação de Câmara Cascudo, de Jesuíno Brilhante.

É, portanto, com méritos, o patrono dos estudiosos do cangaceirismo no nosso Estado.

Ubíquo, prolífico, atento, presença certa durante um longo tempo no meio intelectual potiguar, até mesmo brasileiro, integrante de tantas quantas instituições culturais houve, e fundador de tantas e quantas outras, Raimundo Nonato da Silva, apesar de tudo isso, marcha lentamente para aquele limbo terrível onde habitam os escritores que o tempo encaminha para a penumbra.

Merece, sem dúvida, um estudo de sua vida e obra que é, a seu modo, um painel instigante, um retrato à contraluz, do Rio Grande do Norte no qual viveu, e de onde nunca se afastou sentimentalmente, mesmo quando foi residir no Rio de Janeiro.

Sobrevive, ainda, graças a leitores contumazes, pesquisadores renitentes, estudiosos teimosos que às vezes, por dever de ofício, outras vezes por curiosidade malsã, percorrem sebos em busca de um ou outro título citado em nota de rodapé.

Entretanto, quem há de escrever acerca do cangaceirismo no território potiguar, sem consulta-lo. E quanto à abolição em Mossoró, ou mesmo a Coluna Prestes e a Revolução de 30, este, por sinal, valioso até mesmo por um relato incidental, mas nem por isso menos importante: as relações entre os coronéis da época, fundamental para proteger Serra Negra do Norte ante a invasão iminente dos revolucionários.

A Revolução de 30, aqui no Nordeste, E Rio Grande do Norte, sabem alguns poucos, foi uma briga de coronéis que se estendeu até o Estado Novo…

Enfim: a vasta obra de Raimundo Nonato da Silva, o menino pobre nascido na Serra da Conceição e sobrevivente a duros custos, amante dos livros, escritor, alguém que mais do que qualquer outro, excetuando Luis da Câmara Cascudo, foi uma testemunha do seu tempo, não merece o esquecimento.

Este artigo é minha homenagem a ele.

Honório de Medeiros é professor, escritor e ex-secretário da Prefeitura de Natal e do Governo do RN

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Categoria(s): Crônica
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domingo - 25/06/2023 - 09:44h

Escritores – Gustavo Sobral

Por Honório de Medeiros

Sobral, um jovem com obra vasta e múltipla (Foto: Web)

Sobral, um jovem com obra vasta e múltipla (Foto: Web)

Gustavo Sobral é surpreendente.

Enquanto escritor, e ainda bastante jovem, em pouco tempo deixou relevante marca, em áreas distintas, na escrita norte-rio-grandense.

Ensaísta, é o autor de Rodolfo Garcia; Autores Locais; Oswaldo Lamartine, a Biografia de uma Obra; Berilo Wanderley, o Cronista da Cidade. 

Historiador, lançou Governo do Rio Grande do Norte (1935-2018), em parceria com Honório de Medeiros e André F. P. Furtado e participação de vários escritores potiguares; História da Cidade do Natal; Memórias do Jornalismo no Rio Grande do Norte; As Memórias Alheias; Augusto Severo Neto, Obras Inéditas; e Arquitetura Moderna Potiguar. 

Cronista, legou-nos Cenas Natalenses; Cinco Cronistas da Cidade (publicação, preparação dos originais, seleção, organização e posfácio); e Petrópolis. Na literatura infantil, escreveu e publicou, dentre vários outros, Luísa e a Flor em um Convite para o Chá; Naty e a Natureza; Eva e Bóris.

A par de tudo isso, editou, ilustrou, prefaciou, pesquisou e reuniu acervos históricos e literários quase desaparecidos, muito importantes. Para tanto, viajou, pesquisou e estudou. Recuperou, assim, do limbo, escritores e personagens da história submersos no pó do tempo. E, ainda, organizou revistas, catálogos e textos de ciclos de palestras.

Alguns dos livros exclusivamente seus são obras de referência, sempre consultados, como Oswaldo Lamartine, a Biografia de uma Obra; Rodolfo Garcia; e Memórias do Jornalismo no Rio Grande do Norte. Há diversos, claro.

Um outro, o Governo do Rio Grande do Norte (1935-2018), nele participou, também, com sua apresentação:

Em 1939, o historiador Luís da Câmara Cascudo apareceu com “Governo do Rio Grande do Norte”, reunindo a história e a trajetória dos governantes que andaram por aqui de 1597 até 1935. O tempo foi passando e ficou uma lacuna a ser preenchida com os que vieram depois.

Foi esta a deixa que levou André Felipe Pignataro, Gustavo Sobral e Honório de Medeiros, em 2018, a reunir uma plêiade de pesquisadores e escritores, dentre eles, historiadores, juristas, jornalistas, professores, e continuar até os dias de hoje.

O resultado vem a público em e-book, apresentando a trajetória dos governantes do Rio Grande do Norte de 1935 a 2018. O livro traz, a princípio, uma listagem organizada por ordem cronológica, contemplando cada um dos governos, a que se segue os perfis dos 25 governos que administraram o Estado neste período.

Autores: Adilson Gurgel de Castro; André Felipe Pignataro; Carlos Roberto de Miranda Gomes; David de Medeiros Leite; François Silvestre; Honório de Medeiros; Gustavo Sobral; Isaura Rosado; José Antônio Spinelli; Ludimilla Carvalho Serafim de Oliveira; Maria do Nascimento Bezerra; Ramon Ribeiro; Ricardo Sobral; Roberto Homem de Siqueira; Saul Estevam Fernandes; Sérgio Trindade; Tarcísio Gurgel; Thiago Freire Costa de Melo; Vicente Serejo; Walclei de Araújo Azevedo.

Como se percebe, um conjunto respeitável de escritores potiguares participou do livro.

Dono de um estilo peculiar, Sobral está em sua plenitude no Oswaldo Lamartine, um livro para quem gosta de ler, correr os olhos por um texto muito bem escrito, cuja forma é uma obra de arte e o conteúdo, muito relevante.

Logo no início do livro, dizendo a respeito da opção temática do seu biografado, observa que para a escrita do livro,

Oswaldo Lamartine de Faria tratou de pesquisar, erigir e revelar, série de estudos cujos olhos estão voltados para, dentre os sertões que há, o Seridó, cravado no Rio Grande do Norte por fazendas de gado e algodão, serras e açudes. Oswaldo tratou de construí-lo por mais de cinquenta anos, entalhando-o em suas pesquisas publicadas em jornais, revistas, plaquetes e livros. Proposta que o filia a tradição brasileira dos que se debruçaram sobre o tema1. A opção de Oswaldo se volta para explorar caça, criação de abelhas, construção de açudes, ferros, aspectos do criatório.

Em “Nota de Rodapé”, acrescenta:

Do primeiro romance temático escrito por José Alencar aos sertões de Euclides da Cunha, José Américo de Almeida, Graciliano Ramos, Rachel de Queiroz, Guimarães Rosa, Ariano Suassuna e tantos outros. Na literatura do Rio Grande do Norte, abarca o contista Afonso Bezerra, o poeta Othoniel Menezes e o romancista José Bezerra Gomes. A opção de Oswaldo filia-se a uma tradição de estudos sertanejos no Rio Grande do Norte aos escritos de Manoel Dantas, Eloy de Souza, Felipe Guerra, Juvenal Lamartine e José Augusto Bezerra de Medeiros, todos eles em que o embate é não ficcional, e sim revelado nas suas riquezas e agruras, denunciado como fez Euclides da Cunha. 12 Oswaldo assim se firma no papel de etnógrafo e pesquisador do que ele chamaria depois de “o sertão de nunca-mais”.

Outro exemplo notável é a qualidade do Memórias do Jornalismo no Rio Grande do Norte, assim como do pequeno ensaio Rodolfo Garcia, sem desdouro dos demais.

Não menos interessante, muito antes pelo contrário, é sua larga contribuição na literatura infantil, que vai além dos títulos citados neste texto.

Tudo isso, sem que se mencionasse, com detalhes, sua contribuição intelectual não somente em jornais, mas também em revistas como a “Galo” assim como as da Academia Norte-rio-grandense de Letras, e a do Instituto Histórico do Rio Grande do Norte, dentre várias.

Não por outra razão, aos poucos, mas com consistência de sua parte e respeito dos que o leem, seja como escritor, jornalista, historiador, ou editor, sem esquecer a qualidade dos desenhos de sua autoria com os quais ilustra seus textos, Gustavo Sobral firma seu nome dentre aqueles cuja produção intelectual, no Rio Grande do Norte, adquire significativa relevância.

Honório de Medeiros é professor, escritor e ex-secretário da Prefeitura do Natal e do Governo do RN

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Categoria(s): Crônica / Cultura
domingo - 18/06/2023 - 09:36h

Luiz Fernando Pereira de Melo

Livro aborda cenário de tensão de um "RN arcaico" (Rreprodução do BCS)

Livro aborda cenário de tensão de um “RN arcaico” (Rreprodução do BCS)

Por Honório de Medeiros

Luiz Fernando Pereira de Melo é, em essência, um genealogista. Dos melhores.

Também é um historiador, na justa medida em que suas pesquisas o levaram a encontrar, nas sombras e desvãos do passado, personagens da nossa história, a bem dizer esquecidos, que ele trouxe para nosso conhecimento, com dedicação e esmero.

Aos poucos, dessa forma, Luiz Fernando segue construindo, por vias quase oblíquas, um painel do passado do Rio Grande do Norte valioso e imprescindível, calcado em muito trabalho de campo, na consulta a velhos e carcomidos inventários, livros esquecidos e embolorados, registros arcaicos feitos pela Igreja, anotações antigas de próprio punho que chegam às suas mãos como que atraídas pela competência e talento de quem sabe lidar com essas preciosidades.

Cuida da pesquisa que é própria do genealogista e historiador que se debruça sobre esses registros, chamemo-los assim, e, também, da árdua e complexa tarefa de traduzir os textos estudados, vez que vazados em incompreensível escrita para nós, os comuns dos mortais. Missão para paleógrafos.

Além disso, vai tecendo a teia que extrai da nossa esquecida história, na medida em que interpreta esses dados todos conectando-os uns com os outros, dando-lhes o sentido e a compreensão necessárias.

O resultado não poderia ser diferente: famílias inteiras que povoaram o Rio Grande do Norte, o Nordeste, mesmo o Brasil, surgem com seus laços entre si revelados, ao mesmo tempo em que alguns dos seus integrantes, significativos e importantes para nossa história, obtêm o justo realce.

Tudo começou com Um Ramo Judaico dos Medeiros do Seridó, seguido por Os Fernandes Pimenta: Notas para o Conhecimento Familiar. Depois, veio Crônica do Sertão de Apodi: História do Período Colonial, de 1710 a 1817; Genealogia e Fatos do Sertão do Norte de Baixo; Melos de Campo Grande – Genealogia: Raízes Antigas e Ramos Familiares que delas Derivam; Prelúdio do Cangaço no Sertão do Assu: A Saga do Coronel Antônio da Rocha Bezerra; e Manuel Raposo da Câmara, Morgado Português: História Familiar, Processos da Inquisição, Raízes Judaicas e Ligações à Genealogia Paulistana.

EXEMPLO DE TUDO quanto dito acima, transcrevo, a seguir, trecho do prefácio que tive a alegria de escrever para Prelúdio do Cangaço no Sertão do Assu: A Saga do Coronel Antônio da Rocha Bezerra:

“Foi nessas eras que existiu o Coronel de Cavalaria Antônio da Rocha Bezerra, descendente, dentre outros ilustres, de Arnáu de Hollanda, filho de Henrique de Holanda Baravito de Renoburg, natural de Utrecht, casado com Margarida de Florença, irmã do Papa Adriano VI”.

“Arnáu era, por sua vez, casado com Brites Mendes de Vasconcelos, filha de Bartolomeu Rodrigues, camareiro-mor do Infante D. Luiz, filho do Rei D. Manoel, de Portugal. Sua esposa, natural de Lisboa, veio para o Brasil com os pais, acompanhando o primeiro Donatário de Pernambuco, Duarte Coelho”.

“O Coronel de Cavalaria, a julgar pelos registros a seu respeito tanto dos representantes do Governo Colonial, quanto por aqueles que usavam batina, era homem “facinoroso e perturbador do povo”, “petulante e inquietador da coisa pública”, “desobediente aos Ministros” do Rei de Portugal, “incorrigível”, entre outros apodos que lhe foram assacados pelos homens de batina”.

“Pintaram e bordaram, como se diz popularmente, na Ribeira do Sertão do Assú, sob a liderança do Coronel, dois filhos seus e um aliado, meio jagunço, meio cangaceiro, chamado Felipe Silva, principalmente por conta de uma briga feroz contra o Tenente José dos Anjos, na qual houve de tudo um pouco, desde homicídios a cárcere privado, passando por roubo de gado, em uma longa série de desrespeitos à letra da lei”.

Luiz Fernando Pereira de Melo (Reprodução da Amazon)

Luiz Fernando Pereira de Melo (Reprodução da Amazon)

“Dele, cuidou Luiz Fernando de Melo, seu descendente direto, um dos nossos maiores genealogistas e pesquisadores, autor de livros que já se tornaram referências não somente no que diz respeito à genealogia das famílias nordestinas, que se enroscam entre si desde o solo lusitano, mas, também, pelo cuidado documental com o qual fundamenta suas descobertas, e, porque não deixar claro, também pelo aprofundamento nos fatos históricos que sempre envolvem o entorno dos personagens acerca dos quais trata”.

“Chama a atenção, a partir da leitura de tudo quanto aconteceu com o Coronel e está comprovado pela farta documentação que compõe o livro, o retrato indireto de uma época, o Setecentos, ainda tão pouco conhecida, que se expõe como pano de fundo e nos mostra o Brasil em plena ebulição de um processo de transformação que deixaria para trás seus primeiros duzentos e cinquenta anos de infância, e entrava lentamente na adolescência que antecedia a mocidade do Império”.

“Como se não bastasse a história desse antepassado, importante por si somente, no resgate feito por Luiz Fernando fica demonstrada a marcante presença de sua descendência em momentos cruciais no tempo e espaço nordestinos, qual seja a Revolução de 1817; a participação na Guerra do Paraguai; bem como, até mesmo, a resistência heroica oferecida naquela que foi a mais violenta eleição política no Rio Grande do Norte, a de 1934/1935, aos desatinos do Interventor Mário Câmara e ao Governo de Getúlio Vargas”.

Eis, pois, o resultado: uma malha histórica profunda, solidamente alicerçada em pesquisas da melhor qualidade, revelando um Rio Grande do Norte arcaico, conhecido apenas em alguns recortes específicos, e suas relações com o Nordeste e o Brasil, através das grandes famílias que o povoaram.

E a redenção, digamo-lo assim, de personagens e episódios que jaziam esquecidos nas sombras do nosso passado.

Trabalho meticuloso, necessário e definitivo.

Vem mais por aí. Muito mais.

Honório de Medeiros é professor, escritor e ex-secretário da Prefeitura de Natal e do Governo do RN

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Categoria(s): Artigo
  • Art&C - PMM - PAE - Outubro de 2025
domingo - 28/05/2023 - 04:44h

Por que escrevemos

Por Marcos FerreiraPor que escrevemos #

Todo domingo é assim. Pomos a cara fora e tratamos sobre um monte de assuntos. Há uns que caem no gosto do público leitor, e o cronista é logo aplaudido por seu texto. Pois bem. O Blog Carlos Santos (Canal BCS) é isto: um reduto desses intelectos, e atrai pessoas dos mais diversos estratos humanos e níveis críticos. São um show à parte os comentários vistos no espaço reservado à opinião dos leitores.

Assim como eu, alguns articulistas se autodenominam escritores. Não tiro a razão de ninguém. Já outros, mais contidos quanto modestos, preferem informar suas profissões e status curriculares. Para os quais tiro o chapéu.

Aos domingos, então, expomos nossa escrita acerca de um sem-número de temas. Há aqueles, todavia, que se atêm a um determinado campo temático, a exemplo do doutor Marcelo Alves Dias de Souza, aguçado bateador da história da Literatura e dos seus autores, tanto os bambas das letras nacionais quanto estrangeiras. Temos também a verve suave e envolvente do cronista Odemirton Filho.

Vez por outra é François Silvestre quem ataca com uma crônica, artigo ou poema neste espaço. François, com legitimidade, é mais um que se declara escritor. Possui biografia, histórico e estatura para dizer-se como tal.

Temos, ainda, o não menos doutor e professor Marcos Araújo, cuja inteligência e mérito literário não ficam a dever a nenhum de nós. O mestre Honório de Medeiros é outro que volta e meia dá o ar da graça com uma página de apreciável rutilância. Semana passada deu-se a estreia do ilustrado Hildeberto Barbosa Filho, professor da UFPB, poeta, escritor e membro da Academia Paraibana de Letras.

Por essa ou aquela razão, enfim, todos escrevemos. Uns com periodicidade definida, enquanto fulano e beltrano comparecem de maneira esporádica, feito procedem o doutor Marcos Araújo e Honório de Medeiros. O importante é escrever, ter onde publicar e contar com o interesse de nove ou dez leitores.

Se me perguntarem por que escrevemos, digo que é menos por dom que necessidade. Abrimos uma brecha em nossas agendas (a maioria possui isso) e nos dedicamos a compor algo com um mínimo de literariedade.

Marcos Ferreira é escritor

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quinta-feira - 11/05/2023 - 09:06h
Crônica

Padre Vieira e D. Helder…

Por François Silvestre

…a repetição que não foi farsa.

Foto ilustrativa (Reprodução)

Foto ilustrativa (Reprodução)

Na abertura do Dezoito de Brumário Karl Marx retoma Hegel para lembrar que o genial pensador declarara ser repetitivo na História grandes eventos ou ilustres personagens. Porém, Marx ressalva que Hegel esquecera de afirmar outra verdade, qual seja, que na repetição o fato ou personagem é a farsa da tragédia repetida.

O Padre Antônio Vieira, pensador, orador, argumentador ferino, sábio da igreja católica, infernizava, com seus Sermões, o sossego do poder oficial da Corte, nos idos da metade do século XVII. E esse poder agiu, conseguindo da Cúria Romana a imposição do silêncio ao padre Vieira. O famigerado silêncio “obsequioso”. A língua do Padre Vieira incomodava.

Padre Vieira obedeceu, não sem antes ferir, ferinamente, a estupidez. E declarou: “Deus, na sua infinita misericórdia, fez surdos os que eram mudos e fez mudos os que eram surdos. Posto que até a natureza, provocada pelo grito, responde com o eco”.

Honório de Medeiros escreveu sobre D. Helder e o chamou de Santo (veja AQUI). Pois pois, confirmaria o Padre Vieira. O Bispo D. Helder Câmara também foi vítima do Silêncio “obsequioso”. Repetição de Vieira. Só que, em vez de farsa, foi a tragédia repetida e agravada. Por que agravada? Porque ocorrida quatro Séculos depois. Sem reinos e sem reis absolutos. Apenas Ditadores truculentos e assassinos, nos tempos da modernidade.

A Ditadura militar do Brasil conseguiu, tal qual a Corte de Lisboa, que a Cúria Romana calasse a voz de D. Helder. Diferentemente do Padre Vieira, D. Helder silenciou humildemente. E fez mais. Quando o papa silenciador veio ao Brasil, D. Helder ajoelhou-se aos seus pés e beijou-lhe as mãos. O Papa, inteligente e culto, deve ter pensado: “Meu Deus, isso é Jesus beijando as mãos lavadas de Pôncio Pilatos” . Baixe o pano.

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Categoria(s): Crônica
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domingo - 07/05/2023 - 11:10h

Eu conheci um santo

Por Honório de Medeiros

Eu tinha dez ou onze anos quando conheci um santo. Chamava-se Helder Câmara, era Arcebispo da Igreja de Cristo em Recife e Olinda.Dom-Helder-Camara-NE2

A ele fui levado pela secretária particular do Governador Nilo Coelho, que eu suponho ter sido, muitas vezes, um canal de comunicação entre a Igreja, o Poder Civil e o Poder Militar em Pernambuco, dada sua condição singular de amiga pessoal dos líderes dessas instituições.

Fomos eu, ela, uma tia, funcionária da Sudene, minha mãe e minha irmã, no começo da noite, na sede do arcebispado.

Estávamos de férias em Recife.

D. Helder nos recebeu com aquele seu sorriso luminoso, tão característico, olhos pisados pela falta de sono, o corpo mirrado, frágil, em seu ascético gabinete.

Para mim, naquela época, era impossível sequer imaginar que ali estava um gigante moral. Um dique, que com a força de suas palavras, atitudes, e carisma, tantas vezes contivera o furioso redemoinho, em Pernambuco, das águas turbulentas da repressão pós 64.

Pregava defendendo uma Igreja simples, voltada para os pobres, e a não-violência. Orador que galvanizava multidões, também era um escritor cultuado. Dele li o belo “Um Olhar Sobre a Cidade”, depois perdido em alguma das mudanças que minhas muitas vidas me impuseram.

Entretanto, dele, guardei mesmo, em meu coração, em minha mente, sem nunca esquecer, não somente a benção que seus dedos magros desenharam sob a minha testa ainda infantil, como também uma frase sua, lida em algum lugar, que é a síntese, para mim, do seu apostolado, tão bela quanto densa: “me enriqueces quando discordas de mim”.

Eis uma epistemologia em forma de poesia direcionada ao espírito dos homens de boa-fé do povo de Deus. Minha benção, padre. Quando me lembro do senhor, acredito na humanidade.

Honório de Medeiros é professor, escritor e ex-secretário da Prefeitura de Natal e do Governo do RN

*Crônica extraída do livro De uma longa e áspera caminhada, pela Editora Viseu.

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domingo - 16/04/2023 - 11:44h

Aos que são vítimas de plágio

Por Honório de Medeirosplagio

Recentemente passei pelo que a doutrina jurídica brasileira denomina de “plágio indireto”.

Ocorre plágio indireto quando o redator do texto, com o uso de paráfrases, ideias sistematizadas ou mesmo de palavras-chave, apropria-se  e transcreve conteúdo de outro autor, sem a devida citação.

Cometer plágio indireto é crime contra a propriedade intelectual, conforme o  artigo nº 184, do Código Penal brasileiro.

Ao todo, o tempo de reclusão por plágio pode variar entre 3 meses até 1 ano. Ou seja, é o mesmo tempo em reclusão que diversos outros tipos de crime penalizam seus praticantes.

Evidentemente, esse crime também suscita efeitos de natureza civil, tal qual indenização por danos causados.

No plágio do qual fui vítima, o redator praticamente parafraseou um livro de minha autoria, sem qualquer citação ao meu trabalho, exceto quanto a um parágrafo, interpretado de forma absolutamente equivocada.

Pior, veiculou informações como sendo suas, quando na verdade foram extraídas do meu livro. Tais informações, antes de serem por mim publicadas, eram completamente desconhecidas.

Caso não haja retratação, pretendo acionar a Justiça.

Recomendo a todos quanto passam pela mesma situação, a mesma atitude.

Defender a propriedade intelectual é uma das formas de assegurar o respeito pelo seu trabalho realizado. No caso do meu livro, passei cerca de dez anos dedicado a ele, entre pesquisa – inclusive de campo -, estudo, leitura de outros autores, escrita, revisão, edição e publicação.

Sem contar o custo para a publicação da obra.

Nunca é pouco defender algo assim.

A defesa da lei, e de sua correta aplicação, é um dos baluartes da Democracia.

Não por outra razão Heráclito de Éfeso disse:

É necessário que os que falam com inteligência se fortifiquem com a coisa comum a tudo, assim com a lei a cidade e a cidade com mais força: pois as leis humanas se alimentam todas de uma lei una, a divina: pois (essa) domina tanto quanto quer e dá princípio a todas e as excede (Fragmento 114).

Honório de Medeiros é professor, escritor e ex-secretário da Prefeitura do Natal e do Governo do RN

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  • Art&C - PMM - PAE - Outubro de 2025
domingo - 09/04/2023 - 07:26h

Pontear um assunto

Por Honório de Medeiros 

“Sente aqui”, me disse Seu Antônio de Luzia, segurando o braço de uma espreguiçadeira próxima a ele.

Era cedo da manhã, umas seis horas, a bem dizer, mas a passarinhada já tomara conta dos pés de caju no terreno em frente, do outro lado da rua de chão batido, no Feijão, Sítio Canto, Serra da Conceição, Sertão do Norte de Baixo.

Foto ilustrativa

Foto ilustrativa

“Já tomou café da manhã”? Respondi que sim, e agradeci.

“Traga uma caneca de café para o doutor, essa menina, sem açúcar. Foi coado agora?” A neta, filha de João, fez carreira casa a dentro, largando o bordado com o qual se divertia sentada no chão, escorada na parede.

Enquanto a caneca não chegava às minhas mãos, cuidamos de pastorar os passantes que iam no rumo da cidade, ou dela vinham, e olhávamos o vai e vem dos canários e sabiás, sem dizer qualquer palavra.

Caneca na mão, café fumegante, tapioca recusada, Seu Antônio virou-se para mim e me perguntou: “Doutor, me responda uma coisa, o senhor que é um homem sabido, estudado e viajado, vai haver uma guerra grande?”

Fiquei surpreso. Conhecia Seu Antônio de muito tempo, e tínhamos uma amizade até certo ponto estreita, nos limites bem claros da antiga cultura arcaica sertaneja. Homem calado, dado à introspecção, de pouca conversa, limitava-se, aqui e ali, a um dito, ou pequena história, para pontear um assunto, nunca o tinha visto agir dessa forma.

“Seu Antônio, não sei dizer. O Senhor, mais que ninguém, sabe que somente Deus conhece tudo, e eu sou um homem até certo ponto viajado, que já bateu algumas capas de livro, é certo, mas quanto mais vivo, tenho por mim mesmo que menos sei das coisas”.

“É, eu esperava que o Senhor dissesse isso mesmo. Agora, veja o Senhor: se os passarinhos estão voando baixo, as formigas assanhadas, se as pedras estão suadas, o mandacaru florando, é arriscado chover. Não é que vai ser, é que pode ser”.

Durante um fragmento de tempo me lembrei dos escritos do maior dos filósofos do século vinte, Karl Popper, que dizia o mesmo em sua epistemologia, para condenar o determinismo. “Meu Deus do Céu”, suspirei para mim mesmo.

“É verdade”, respondi. “O Senhor me pegou”. “Eu compreendo e admiro suas palavras, que são de sabedoria”. “Está conforme”. “O que eu posso dizer para o Senhor, sem medo de errar, é que eu nunca tinha visto um desmantelo tão grande quanto este que está tomando conta do mundo. Pode ter tido, mas eu não dou conta”.

“É como eu penso, Doutor. Parece o fim das eras. Pode não ser, mas é muita briga, muito ódio”. “Já me conformei”. “Vivi muitos invernos e secas, passei fome e hoje tenho umas coisinhas de nada, uns palmos de terra, andei légua tirana muitas vezes, conheci o coração do homem na sua maldade e bondade, mas tempos como estes, eu nunca vi”.

A conversa prosseguiu por muito tempo. Alguns passantes paravam, tomavam um gole de café mordendo um pedaço de rapadura, davam conta do que ocorria na cidade e no campo, arriscavam uma estória ou outra, formava-se um círculo de pessoas que se desfazia, depois outro, e mais outro, todos reverenciando Seu Antônio de Luzia.

De há muito as cadeiras tinham sido arrastadas para debaixo da cajaraneira frondosa, ao lado da casa, espécie de salão de visitas a ser usado quando o sol chegava forte.

Para o fim da manhã, mormaço se instalando, Seu Antônio me intimou a entrarmos, para pegarmos o feijão da comadre, misturado com arroz vermelho e um pouco de farofa d’água temperada com cheiro verde e cebola. Acompanhado por um guisado de carneiro, e rebatido com um naco de rapadura e um copo d’água gelado, seguido por um gole de café coado na hora.

“A rede está armada”, disse Seu Antônio, e eu embioquei quarto a dentro, me deitei alisando o lençol cheirando a flor de laranjeira, cobri os olhos, mergulhei em um sono de meia hora, mais não podia ser, até sonhei que voava feito um beija-flor, mundo afora, e via os homens, mulheres e crianças, em todos os lugares, felizes, sem malquerença, mágoa ou tristeza em seus corações.

Deus há de nos proteger…

Honório de Medeiros é professor, escritor e ex-secretário da Prefeitura do Natal e do Governo do RN

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Categoria(s): Crônica
sexta-feira - 07/04/2023 - 11:42h
Lírico

Pau dos Ferros das águas

Barraem de Pau dos Ferros - foto de Honório de Medeiros - 6 de Abril de 2023Foto belíssima de Honório de Medeiros, nessa quinta-feira (6), na barragem de Pau dos Ferros.

Lírica, digo.

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  • Art&C - PMM - PAE - Outubro de 2025
sábado - 25/03/2023 - 19:44h
Leitura

Prazer, estou de volta

Voltei à leitura de 2 ou mais livros no mesmo espaço temporal. Tinha me desfeito do hábito há tempos, com a rotina de muitas horas diante de telas de computador, tablet e smartphone. Ler, por prazer, tinha virado sobrepeso de labuta, que a ‘vista’ e o corpo não aguentavam.

As boas companhias do fim de semana (Foto: pessoal)

As boas companhias do fim de semana (Foto: pessoal)

Agora vai.

Fim de semana embalado com “De uma longa e áspera caminhada” (Honório de Medeiros), “Doze contos peregrinos” (Gabriel García Márquez) e releitura de “Os cães ladram” (Truman Capote).

Não sei qual o melhor, cada um com seus atrativos, me instigando mais à cada página.

Prazer. Estou de volta.

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Categoria(s): Crônica
quinta-feira - 09/03/2023 - 20:24h
Livro e vida

Para caminharmos juntos

Livro está no catálogo da Editora Viseu (Foto: pessoal)

Livro está no catálogo da Editora Viseu (Foto: pessoal)

Com novo livro de Honório de Medeiros à mão, minha noite será a moldura de uma leitura que vai chegar à madrugada, presumo.

Se a vida nos religou por um fio que tinha se esgarçado e, parecia rompido desde a distante juventude, a proximidade do outono não nos dispersará outra vez.

Há muito a caminhar. Juntos!

Mossoró, na República da São Vicente, 09 de Março de 2023.

*De uma longa e áspera caminhada – Editora Viseu – adquira AQUI.

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Categoria(s): Crônica / Cultura
  • Repet
domingo - 05/03/2023 - 08:52h

Uma nova Casa Branca

Por Marcos Ferreira

Imóvel que foi demolido para que pudesse nascer um lugar habitável...

Imóvel que foi demolido para que pudesse nascer um lugar habitável…

... e decente à vida modesta, mas digna (Fotos: Marcos Ferreira)

… e decente à vida modesta, mas digna (Fotos: Marcos Ferreira)

Tudo começou com o escritor David de Medeiros Leite. Àquela época David estava presidente da Companhia de Habitação do Rio Grande do Norte (Cohab/RN). O filho da saudosa senhora Hilda foi quem me apontou a disponibilidade do imóvel situado no Conjunto Walfredo Gurgel, no Alto de São Manoel.

Eu contava com um cargo miúdo na Prefeitura de Mossoró, e fomos (eu, David Leite e o também escritor Clauder Arcanjo) dar uma olhada na casa, que encontramos em escombros. Assim mesmo, com o apoio de David e Clauder, conseguimos tornar aquelas ruínas em algo habitável. Esse, portanto, foi o início.

Depois de vários anos, sempre entremeados de incontáveis apuros, não pude mais realizar nenhum benefício na residência, e esta foi estiolando-se rapidamente. Decorridos cerca de quinze anos, portanto, a situação se agravou. A ponto de eu colocar uma placa de venda, buscando assim adquirir outro imóvel noutro subúrbio mais distante deste município. Ressalto que o Walfredo Gurgel, exceto por alguns problemas estruturais, ainda é um bairro bem familiar, de cadeiras nas calçadas.

Ao saber da placa de venda, meu amigo petroleiro Elias Epaminondas bateu os coturnos e se opôs com veemência à venda de meu endereço. Sim. Eu costumava dizer que não tinha uma casa, mas somente um endereço. A placa de venda foi retirada. Miriam Ferreira, esposa de Elias, elaborou um simples e belo projeto para minha nova habitação e Elias deu início a um mutirão entre nossos amigos.

Agora, extremamente grato, eu me sinto na obrigação de relacionar aqui os nomes daqueles que se sensibilizaram e contribuíram, de maneira relevante, para tornar meu sonho e o projeto de Miriam Ferreira em realidade.

De largada, cito o amigo Clauder Arcanjo, que prontamente se comprometeu em adquirir todas as telhas. A seguir, embora sempre discretos, vêm Túlio Ratto e José Antero dos Santos, responsáveis por grande parte do cimento. Na sequência, em ordem aleatória, vou citando o restante dos nomes. Torço que isso não lhes pareça maçante ou enjoativo, tendo em vista que o nobre leitor sempre espera encontrar neste espaço o mínimo possível de literatura, sobretudo no gênero crônica.

Mas, repito, eis os bons samaritanos em ordem aleatória: Luiza Maria Freire de Medeiros, Raimundo Antonio, Fabrício Caymon, Raimundo César Barbosa, Odemirton Filho, Zilene Medeiros, Dr. Dirceu Lopes, João Bezerra de Castro, Aluísio Barros, Francisco Wanderley, Cristiane Reis, Marconi Amorim.

Acho que isto, com perdão do leitor, não se trata de prestação de contas ou cabotinismo imobiliário. Não é isso. Também não é subserviência, servilismo púbico. Quero apenas, no breve espaço de uma crônica, quiçá duas páginas, exibir, de maneira honesta, minha gratidão a essas pessoas que venho citando. Porque a gente não tem rédeas no instante de fazer determinadas críticas a terceiros, todavia se omite no momento de tornar notório aquilo de bom que lhe foi feito. Aqui eu falo de gratidão. E gratidão não está nem nunca esteve fora de moda. É algo bom a se praticar.

Contei, entre outros, com figuras como Rogério Dias, Flávio Quadrado, Ranniere Ferreira, Sandro Jorge, Jessé de Andrade Alexandria, Alexsandro Lopes Pinto, Laélio Ferreira, André Luís, Carlos Silva, Antonio Alvino, Dr. Lúcio Leopoldino, Francisco Nolasco, Francisco Amaral Campina, Gildemar Condados, Elder Nolasco, Anchieta Albuquerque, além do meu culto Editor Carlos Santos.

Não paramos por aqui. O mutirão prossegue. A velha choupana foi inteiramente demolida e uma nova casa branca (que não é a dos americanos) ergueu-se bela e majestosa sob as mãos dos pedreiros Jailson Batista, Rogério Cordeiro e Wellington Azevedo. “Agora não tem mais volta”, falei comigo mesmo.

Vamos aos demais: Francinaldo Rafael, Honório de Medeiros, Cid Augusto, Elisabete Stradiotto, Valdemar Siqueira, Ênio Souza, Luzia Praxedes Arcanjo, João Helder Alves Arcanjo, José Anchieta de Oliveira, Afrânio Melo, João Maria Souza da Silva, Antônio Railton, Marquinhos Rebouças, Nilson Rebouças, Jorge Alves, Vanda Maia, Arlete Jácome, Dr. Diego Dantas e Alexandre Miranda. Creio que não esqueci ninguém, isto graças a Natália Maia e às suas planilhas cheias de nomes e números. Também agradeço àqueles que, por um motivo ou outro, não puderam ajudar. Sei que muitos torceram pelo êxito desta empreitada construída graças a várias doações.

Não tenho, pois, o menor embaraço em escrever expondo meu agradecimento a todos esses amigos de primeira e de última hora. Porque a gratidão, repito, faz parte do meu DNA, da minha constituição e personalidade.

Todos são bem-vindos para um cafezinho.

Marcos Ferreira é escritor

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Categoria(s): Crônica
domingo - 22/01/2023 - 09:24h

O fio que conecta a trama

Por Gustavo SobralDe uma longa e áspera caminhada - livro de Honório de Medeiros - foto

Faltava à vertente escrita de Honório de Medeiros, jurista, filósofo, ensaísta e biógrafo, escritor, o livro pessoal. Aquele em que o escritor reúne fragmentos de sua pensata, impressões, expressões, leituras, ficções e que revela um mundo de uma viagem pelo pensamento.

De uma longa e áspera caminhada (Viseu, 2022, 148p), de Honório de Medeiros, é um tanto isso e muito mais. É aquele livro que a gente vai e volta, para, pensa, grifa, relê, anota. É aquele livro que nos faz sair do mesmo e nos faz dialogar com o autor.

Recém-lançado e disponível para compra no site das livrarias e magazines, no Brasil, Portugal e Estados Unidos, em versões impressa e digital, o livro é um navego de um leitor vocacionado pela literatura universal e que revela o escritor cuja vida foi traçada pela leitura e pelos livros, desenhando o seu olhar sobre o mundo.

O leitor há de se aventurar palmo a palmo, a cada página de um pouso no inesperado, o que faz do livro um caminho de surpresas e que faz da leitura um caminho que pode ser próprio além do preposto pelo sumário. É um livro de ir e vir, é um livro para navegar.

O áspero do título pode até ir de encontro a um certa incredulidade e ceticismo que se contrapõe ao leitor do mundo abismado, surpreso, encantado, que toma água de coco na praia e conversa, anda pelo cemitério de Paris e tece uma perfeita crônica em ode ao ipê amarelo, uma beleza à Rubem Braga.

Honório de Medeiros é também aqui filósofo, lógico, matemático, político, cidadão, literato; é também o colecionador de paisagens, sensações, surpresas.  É Rousseau acima de Voltaire e Voltaire acima de Rousseau, com Platão, Popper e outros mais caros ao seu pensamento.

Este é o livro que faltava na biblioteca potiguar pela solidez do conteúdo, forma e o jeito de sabor de conversa que nos conduz. Vale ter na cabeceira como companhia.

A pré-venda é no site da editora Viseu e o livro físico está nos sites da Amazon, Americanas, Magazine Luiza, Shoptime, Submarino. E o e-book nestas e Apple, Barnes & Noble, Google, Kobo, Livraria Cultura e Wook.

Gustavo Sobral é escritor, ensaísta e jornalista

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Categoria(s): Crônica
  • Art&C - PMM - PAE - Outubro de 2025
domingo - 08/01/2023 - 09:00h

Paulo Maia

Por Honório de Medeiros

Da esquerda para a direita de quem olha: Fred, Paulo Maia, Hélton, eu, Fernando Negreiros, Segundo Paula, Lenilson, Anchieta, Delevan, Jânio Rêgo. Turma da Quarta Série Ginasial, 1972, Colégio Diocesano Santa Luzia, reunidos em 2011 (Foto: arquivo do autor)

Da esquerda para a direita de quem olha: Fred, Paulo Maia, Hélton, eu, Fernando Negreiros, Segundo Paula, Lenilson, Anchieta, Delevan, Jânio Rêgo. Turma da Quarta Série Ginasial, 1972, Colégio Diocesano Santa Luzia, reunidos em 2011 (Foto: arquivo do autor)

Paulo Maia dizia que era baixinho por minha culpa: eu tinha roubado o leite dele, quando recém-nascido.

Tudo porque eu nasci três dias depois do 23 de abril de 1958, no qual ele veio ao mundo, ambos na Maternidade Almeida Castro, em Mossoró.

Como mamãe não conseguia matar minha fome com seu pouco leite, valeu-se da generosidade da mãe dele, Manolita Pereira, que nos alimentou.

Manolita diz que é minha mãe de leite. Eu respondo, sempre respondi, que eu e Paulo tínhamos que ser irmãos, estava escrito no livro da vida, e beijo a mão dela, reverente.

Entre idas e vindas, altos e baixos, seguimos próximos vida afora, sempre próximos. Amigos desde a maternidade.

Ontem (05/01/2023 – veja AQUI), eu lá pelas bandas de São João do Sabugi, muito longe, em busca das misteriosas raízes genealógicas do meu avô paterno, acordo cedo, abro o celular, e leio a notícia de sua morte.

Um baque. Boto o carro na estrada e venho mudo, de lá até Mossoró, rasgando o centro do Estado, percorrendo um mundão de terra.

Uma espécie de solidão amarga, ensimesmada, uma onda de tristeza que teima em vir, toma conta da gente. Sensação de impotência. Solidão, tristeza e impotência.

Falam que há conforto na partida de alguém que lutou bravamente por dois anos contra essa maldita doença cujo nome, amedronta tanto, que o abreviaram.

Pode ser. Sei que lutou ele, a esposa, filhos, a família toda, os amigos, os amigos dos amigos. Rezamos muito. Luta vã. Que seja feita a vontade de Deus.

Descansou, então, e por fim.

E a saudade?

Paulo, você se lembra daquele dia no qual Antônio de Bé nos levou em sua jangada, começo da madrugada, para além da última visão de terra, como companheiros de pescaria?

Lembra das tardes de cerveja e Belchior, lá no Asfarn, em Natal?

Lembra dos veraneios em Tibau? Do jipe, das meninas, dos amigos comuns, das pescarias no Arrombado?

Do Diocesano e da turma da quarta série ginasial de 1972?

Lembra como decidimos, junto com Delevam, quem seria o padrinho de Paulinha?

Lembra daquele dia no qual fomos barrados na ACDP?

Lembra daquele dia… melhor não contar, não é?

Ê Paulo, são tantas e tantas memórias. Um dia eu conto para meus sobrinhos! As que eu puder, claro.

Ei, Paulo, aguarde aí. Um dia, chego.

Descanse em paz, meu irmão.

Honório de Medeiros é professor, escritor e ex-secretário da Prefeitura do Natal e do Governo do RN

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Categoria(s): Crônica
domingo - 25/12/2022 - 05:22h

O bem e o mal

Cainismo. Caim. Zoroastrismo e Heráclito de Éfeso - unidade dos opostos constituindo a Realidade.

Por Honório de Medeiros

O caminho que sobe e o que desce é o mesmo (Heráclito de Éfeso, dito “O Obscuro”)[1].

– Mas terá que aceitar isso – retrucou Woland, e o sorriso irônico entortou sua boca. Você mal apareceu no telhado e já disse bobagens, e vou dizer onde elas residem: na sua entonação. Você pronunciou suas palavras de tal maneira como se não reconhecesse as sombras, e muito menos a maldade. Não seria muito trabalho de sua parte pensar na seguinte questão: o que faria a sua bondade se não existisse a maldade, como seria a terra se dela sumissem as sombras? (O Mestre e Margarida, Mikhail Bulgákov)[2].O bem e o mal, luz e trevas, vida e seca

“A ave sai do ovo. O ovo é o mundo. Quem quiser nascer tem que destruir um mundo. A ave voa para Deus.” (Demian, Hermann Hesse)[3].

Quem, nos anos 70 do século passado, gostava de ler, possivelmente teve entre as mãos algum livro de Herman Hesse.

Talvez Sidarta, no qual ele romanceou a vida de Gautama Buda, ou mesmo O Jogo das Contas de Vidro e O Lobo da Estepe, os mais cultuados; quem sabe DemianPequenas HistóriasNarciso e Goldmund, os menos conhecidos.

É possível que dentre esses, Demian seja considerado um livro menor.

Na verdade, a crítica teceu e tece loas à O Jogo das Contas de Vidro e, em menor escala, a O Lobo da Estepe, muito embora o mais famoso seja Sidarta, cuja fonte foi a vida do grande líder espiritual Buda (Siddhärtha Gautama), Príncipe de Sakyas, “o Iluminado”, que viveu entre 563-483 a.C., um homem extraordinário.

Quando adulto, Sidarta, rebelado contra a hierarquia bramanista, largou todos os confortos materiais dos quais dispunha no palácio do seu pai, o rei, para ir em busca do real sentido da existência, ganhando fama imorredoura em todo o Oriente como Gautama, o Sublime.

Em Demian, Hesse nos apresenta a um enigmático adolescente e sua mãe, mulher bela e misteriosa iniciada em uma seita pouco conhecida, o Cainismo, que fascina Emil Sinclair, colega dele de escola e relator da história.

O Cainismo foi uma seita gnóstica cristã surgida no século II d.C. que venerava Caim como filho de um espírito superior ao que teria criado seu irmão Abel, considerada herética pela Igreja Católica.

Quando o Cainismo aparece na convivência entre Demian e Sinclair, aquele aponta, como ponto-de-partida para uma possível iniciação do amigo na doutrina Cainista, o conhecimento da vida de uma relação de personagens significativos, embora condenados pela história oficial, começando por Eva, depois Caim, cujo nome batiza a seita, bem como Judas Iscariotes, dentre outros.

Sabe-se que o Cainismo foi resgatado no século XIX da total obscuridade por Lord Byron, o cultuado e maldito poeta romântico inglês, e hoje é possível que somente exista em obras emboloradas praticamente desconhecidas, a grande maioria ocupando estantes empoeiradas no imaginário “Cemitério dos Livros Esquecidos” que fica em Barcelona, e do qual nos deu a conhecer Carlos Ruiz Zafón, em famosa tetralogia.

Voltando a Demian, a pergunta que ele faz a Emil Sinclair, durante o transcorrer da trama, no processo de sua iniciação nos segredos da seita, é se haveria Adão sem Eva; Abel sem Caim; Jesus, sem Judas, e assim por diante. Evidentemente, a verdadeira questão, implícita e fundamental, é se haveria o Bem, sem o Mal; e, fundamentalmente, a Ordem, sem o Caos.

Não é ousadia supor que o Cainismo seja descendente do Zoroastrismo ou Mazdeísmo, a religião dominante no Império Persa mais ou menos no século VI a.C. até sua invasão e dominação, no reinado de Dario III, por Alexandre “O Grande”, rei macedônio.

O zoroastrismo professava uma interpretação dualista da realidade, entendendo-a como governada pelas forças antagônicas do Bem e do Mal: existiria um deus supremo, criador de dois outros seres poderosos que seriam extensões de sua própria essência: Ormuzd (ou Ahura-Mazda, ou ainda Oromasdes, segundo os gregos), a fonte de todo o Bem, e Ariman (Arimanes), a fonte de todo o Mal, depois que se rebelou contra seu criador.

Os conflitos entre o Bem e o Mal seriam constantes até o momento em que Ormuzd venceria, condenando Ariman e os que o seguiam às trevas eternas.

Tampouco é ousadia crer que o Maniqueísmo seria continuação dessa linhagem herética e gnóstica originada na Pérsia, muito tempo depois renascida no Império Romano (sécs. III e IV d.C.). Sua doutrina, plena de um dualismo religioso sincretista, consistia em afirmar, também, a existência de um conflito cósmico entre o reino da luz (o Bem) e o das sombras (o Mal), assim como em localizar a matéria e a carne na escuridão.

Do Maniqueísmo foi seguidor, por um longo tempo, ninguém mais, ninguém menos, que Santo Agostinho de Hipona, Doutor da Igreja Católica, talvez seu mais importante pensador, autor da “magnum opus” De Civitate Dei (A Cidade de Deus), por quem Santa Mônica, sua mãe, tanto rezou para o converter.

Avançando no tempo, mas ainda na mesma linhagem, essa mesma percepção gnóstica, dualística, da realidade, constituiria o cerne da doutrina do Catarismo, professado pelos Perfeitos, a quem a Inquisição, no Século XIII, varreu da face da França na Primeira Cruzada da Igreja Católica, liderada por São Luis, o nono Rei francês.

É um fato que questões como essas, acerca do eterno embate entre o Bem e o Mal (a Luz e as Trevas), e a Ordem e o Caos, suscitaram debates ardentes e sinceros durante os famosos e esotéricos anos 60 e 70 do século passado, quando se questionava, entre outras coisas, o modelo de vida que o capitalismo “selvagem” ou o socialismo “científico” impunham ao mundo.

Era o tempo da Revolução de maio de 1968, na França, e do Festival de Woodstock nos Estados Unidos.

Havia, então, um inebriante fascínio pelo Oriente misterioso dos zoroastristas, cainitas, maniqueístas, iogues, faquires, dervixes, sadhus, budistas, taoístas, e seus estilos de vida, enquanto contraponto à possibilidade de hegemonia da sociedade de consumo ou do marxismo-leninismo.

Ainda hoje encontramos, em alguns nichos na internet, tal percepção esotérica acerca da realidade, herdeira longínqua dessas arcaicas seitas, que parece muito distante do feijão-com-arroz cotidiano ao qual estamos acostumados.

Existem também espaços diminutos, embora alvoroçados, no campo das ideias, resultantes de raízes solidamente firmadas na tradição oriental, que se voltam para a tentativa de explicar fenômenos tais como a antimatéria, física quântica, ou a teoria do Caos, em uma perspectiva que resvala para a metafísica, menos atenta ao rigor metodológico ortodoxo próprio da ciência. Que o diga Fritjof Capra, famoso físico teórico autor de O Tao da Física e O Ponto de Mutação.

Fritjof Capra traça um suposto paralelo entre a física relativística, assim como a quântica e a das partículas, e as filosofias e pensamentos orientais tradicionais, tais quais o taoísmo, o Budismo, e o Hinduísmo. Surgido nos anos 70, seu livro O Tao da física busca os pontos comuns entre as abordagens oriental e ocidental da realidade.

Por fim, voltando a Herman Hesse, com o qual abrimos este ensaio, é possível entender que, em Demian, ele tratou obliquamente, ao utilizar o Cainismo como pano de fundo da trama cujo epicentro é a relação entre Demian, Emil Sinclair e Gertrud, em uma perspectiva esotérica, acerca do que seja a Realidade, e cujo ponto de partida é a onipresença da eterna guerra entre o Bem e o Mal.

Mais: ao fazê-lo, trouxe para a claridade, ou pelo menos tentou, a misteriosa seita que seus personagens professavam e, para quem optou por se aprofundar na questão, como consequência, os mistérios do Zoroastrismo, Maniqueísmo e Catarismo, seus parentes próximos pela linhagem.

Teria o Zoroastrismo, cujo apogeu ocorreu aproximadamente no século VI a.C., influenciado Heráclito de Éfeso (aproximadamente 500 – 450 a.C.)?

Pode ser que sim. O certo é que antecede o filósofo em um ponto principal de sua cosmovisão, a de que os opostos são idênticos, embora apareçam para os homens como diferentes:

Vida e morte, vigília e sono, juventude e velhice, tudo é o mesmo. (…) pois um virado, é o outro e o outro, virado, é o primeiro. (…) O caminho que sobe e o que desce são o mesmo (…) bem e mal são idênticos. (…) Para Deus todas as coisas são belas e boas e justas, mas, para o homem, há algumas coisas justas e outras injustas (…). Não pertence à natureza ou caráter do homem possuir o verdadeiro conhecimento, mas sim à natureza divina[4].

                   Sir Karl Popper, analisando esse trecho, observa que:

Assim, na verdade (e para Deus) os opostos são idênticos: só aos homens eles aparecem como não idênticos. E todas as coisas são uma só – todas elas são parte do processo do mundo, o ‘Fogo’ perene[5].

Todo esse Conhecimento arcaico, mas fundante, de natureza esotérica, é calcado na crença de que a Realidade é a extensão visível e material de uma divindade única e suprema, da qual são emanações antagônicas o Bem e o Mal; por outro lado, de natureza filosófica, é calcado na conjectura da unidade do mundo, identidade dos opostos e da aparência e realidade.

                   Para o Zoroastrismo, o Bem e o Mal são forças antagônicas que seriam extensões da essência de um Deus supremo. Heráclito de Éfeso disse que o Bem e o Mal são idênticos, “Somos e não somos”[6], e concluiu que para Deus, todas as coisas são belas, boas e justas, e todas as coisas são somente uma.

                   O Bem e o Mal: o Um.

Honório de Medeiros é professor, escritor e ex-secretário da Prefeitura do Natal e do Governo do RN

[1] POPPER, Sir Karl. O Mundo de Parmênides: Ensaios sobre o Iluminismo Pré-Socrático. São Paulo: Unesp, 2019.

[2] BULGÁKOV, Mikhail. O Mestre e Margarida. Rio de Janeiro: Alfaguara. 2003.

[3] HESSE, Hermann. Demian. Rio de Janeiro: Record. 2015.

[4] POPPER, Karl. O Mundo de Parmênides: Ensaios sobre o Iluminismo Pré-Socrático.

[5] Idem.

[6] Ibidem.

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Categoria(s): Crônica
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