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domingo - 23/10/2022 - 12:14h

Xeretando e pedindo mais

Por Marcelo Alves

Por esses dias, andei xeretando o site do Supremo Tribunal Federal. Nada daquilo que alguém afeito a teorias da conspiração porventura esteja pensando. Era uma pesquisa simples, para saber a quantas anda a edição de enunciados da Súmula Vinculante do STF.

Como muitos sabem, sou um fã do instituto da Súmula. A “original”, dita não vinculante, que remonta à década de 1960, quando o STF, sufocado pelo acúmulo de processos pendentes de julgamento, a imensa maioria versando sobre questões idênticas, após alteração em seu regimento (em agosto de 1963) e enorme trabalho da Comissão de Jurisprudência composta pelos Ministros Gonçalvez de Oliveira, Pedro Chaves e Victor Nunes Leal (este último seu relator e grande mentor), em dezembro de 1963, decidiu publicar oficialmente, pela primeira vez, a Súmula da sua jurisprudência, para vigorar a partir de março de 1964.

Leal foi mentor da Súmula Vinculante (Foto: Web)

Leal foi mentor da Súmula Vinculante (Foto: Web)

Então (e depois assim continuou, é bom registrar), a edição da Súmula – e dos seus vários enunciados individualmente –, foi resultado de um processo específico que passou pela escolha dos temas, discussão técnico-jurídica, aprovação e, ao final, publicação para conhecimento de todos e vigência. A Súmula era e é uma bússola na selva do direito brasileiro. Uma enorme sacada, de fato!

E sou também fã da chamada Súmula Vinculante (do STF). Como disposto no art. 103-A da Constituição Federal, o STF “poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei”.

Esses enunciados/súmula terão por “objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica”. Quer melhor? Eu acho o máximo! Inclusive, foi tema da minha dissertação de mestrado na PUC/SP e do meu primeiro livro, “Do precedente judicial à súmula vinculante” (Juruá, 2006).

Mas o fato é que me decepcionei com o que vi. E não foi a primeira vez. O STF tem sido parcimonioso na edição dos tais enunciados vinculantes. Muito parcimonioso. Talvez eles estejam querendo focar apenas nos chamados “temas de repercussão geral”, produzindo, na prática, quase os mesmos efeitos (vinculantes) da Súmula. Ou porque a confusão lá, no STF, esteja tão grande, com tanta coisa para lidar, que eles estejam sem tempo para “alimentar” a minha querida Súmula.

Constatei que até hoje só foram editados 58 enunciados vinculantes. Nos últimos 5 anos apenas 3. É quase nada. E há temas tão importantes, tão caros, tão atuais, para a sociedade como um todo (e, para mim, especialmente, confesso), que mereceriam ser sumulados. Como é o caso do Enunciando Vinculante 57 (de abril de 2020), que versa sobre a tributação de livros eletrônicos (e-books) dispondo: “A imunidade tributária constante do art. 150, VI, d, da CF/88 aplica-se à importação e comercialização, no mercado interno, do livro eletrônico (e-book) e dos suportes exclusivamente utilizados para fixá-los, como leitores de livros eletrônicos (e-readers), ainda que possuam funcionalidades acessórias”.

Quer algo mais atual? Aliás, no precedente (RE 330817) que levou à elaboração do citado enunciado, afirmou o Ministro Dias Toffoli: “as mudanças históricas e os fatores políticos e sociais presentes na atualidade, seja em razão do avanço tecnológico, seja em decorrência da preocupação ambiental, justificam a equiparação do ‘papel’, numa visão panorâmica da realidade e da norma, aos suportes utilizados para a publicação dos livros. (…). Embora esses aparelhos não se confundam com os livros digitais propriamente ditos (e-books), eles funcionam como o papel dos livros tradicionais impressos e o propósito é justamente mimetizá-lo”.

Por fim, aqui rogando por enunciados com esse tipo de conteúdo, ainda milito em causa própria. Ter livros, físicos ou eletrônicos, mais baratos é tudo. E isso inclui os seus suportes, seja o bom e velho papel ou uma tela medida em megapixels. Uma enorme sacada! O máximo!

Marcelo Alves Dias de Souza é procurador regional da República e doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL

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Categoria(s): Crônica

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