Atravessamos o rio e desembarcamos na Ponta do Tubarão, onde acampamos e catamos conchas. Há ilhas entre os mangues, formadas por raÃzes e plantas aquáticas, onde habitam guaxinins. Praia de difÃcil acesso, conhecida apenas pelos nativos, em noites de lua cheia vem uma ou outra forma confraternizar nas areias dessa praia quase secreta, cujo acesso só é possÃvel através de canoa.
A “Ponta”, uma estreita faixa de praia que alcançamos após a travessia do rio Tubarão, lembra uma espécie de baÃa com fortificações de manguezais, como o rio Potengi em Natal. Aqui, recém-chegado, visitei primeiro um dos velhos sábios do lugar, bodegueiro e memorialista vivaz, historiador e cronista da Vila de Diogo Lopes.
Em sua memória hospitaleira refulge a vida cotidiana com o seu imaginário plástico, vivo e intenso. Conversamos todos os dias, por algumas horas, sentados em tamboretes, em frente da sua bodega, um lugar modesto e sossegado, a poucos metros de um estaleiro onde homens trabalham na construção e reparos de barcos.
Conheci primeiro seus netos, rapazes entre si tão diferentes, mas como o avô enraizados na terra, sociáveis e louvados por seu caráter sem manchas. O mais velho, moreno, é um homem da rua e se dedica a cortar cabelos; o mais novo, alourado, não resistiu aos apelos do mar. Mergulhador e pescador profissional, levou-me até às personagens mais interessantes e curiosas de Diogo Lopes.
Denilson é o seu nome.
Quando conversávamos, no lugar dos banhos, após caminharmos a pé muitos metros de ida e volta, ele me disse que eu certamente gostaria de conhecer o seu avô, homem já idoso, esperto e bem humorado, amante das letras e da leitura. Fez as apresentações com simplicidade, despediu-se lamentando ter compromisso de trabalho e, após o aperto de mão, foi cuidar da vida.
A Vila tem uma capelinha consagrada a São Francisco, de quem todos se engraçam por sua humildade e sangue-bom. O povo do lugar dedica-lhe todos os anos, em outubro, uma festa animadÃssima e tradicional que atrai gente até de Canoa Quebrada, vinte ônibus lotados de cearenses.
Há danças no clube local, passeios, excursões às dunas, banhos na Ponta do Tubarão, a inesquecÃvel travessia do rio, música, ritmo, envolvimentos durante um mês de festa. O povo de Diogo Lopes, orgulhoso de seus costumes, preza as leis da hospitalidade e valoriza a cultura. É também permeável aos modismos e absorve tudo com naturalidade.
Lá, com alguns alunos da Oficina de Jornalismo e Cidadania que fiz em Macau, como parte do “ Projeto Percursos ”, de interiorização cultural, “penteamos as dunas” de Mangue Seco, catando todo o lixo produzido pela negligência de eventuais turistas.
Vários jovens vieram para a tarefa e à sombra de cajueiros conversamos sobre arte e meio ambiente, cultura e cidadania. Deu vida a tudo isso uma experiência pioneira e revolucionária de Véscio Lisboa, em 1993, como parte de uma Ação Cultural desenvolvida ao longo de cem dias. Artista de incontáveis méritos e grande educador, Véscio fixou-se nessas terras com o propósito de contribuir para o desenvolvimento humano, através da criação de uma fábrica de artistas.
Cursos, oficinas, exposições, num congraçamento de idéias e informações, cujos frutos já se fazem notar, sobretudo através do teatro, numa Macau reinventada pela arte que fala sempre a linguagem mais lúcida. Uma Macau sem escândalos, sem secretário tarado e sem prefeito omisso.
Franklin Jorge é escritor e jornalista (franklinjorge@yahoo.com.br)
* (Trecho do livro "Viagens na minha terra," ainda inédito)
É sem dúvida uma lugar muito lindo. Eu sou filho de Barreiras, distante 2KM. Vale a pena conhecer, a foto em meu gblog é do por do sol de Barreiras.
Um abraço.