Por Marcos Ferreira
Outra vez, falhando em uma disciplina que almejo, deixei esta moita pornográfica, indecente, ficar deste tamanho. Aqui estou (carrancudo) parecendo com o rosto de um porco-espinho. Invejo, até certo ponto, aqueles indivíduos de carinha andrógina, sem barba nenhuma. Às vezes, quando muito, exibem uns fios ralos, finíssimos, quase imperceptíveis. Admiro os sujeitos que, diariamente, como cumprissem uma promessa inquebrável, enfrentam o espelho, fazem um pouco de espuma, dão de garra da navalha e raspam a cara de novo, eliminando vestígios dos pelos.
Os meus heróis da resistência (a pouca telha que me resta) também carecem de uma poda cuidadosa, cirúrgica. Preciso ir ao Beco das Frutas, entregar-me aos cuidados do senhor Fernandes, e readquirir as feições de um ser humano. O salão é de primeira. Aí está o poeta Aluísio Barros que não me deixa mentir. Há mais ou menos dois meses me deparei com Aluísio no referido espaço. O poeta, agradável e gentil como sempre, avaliou o meu jeitão pé-na-cova, falou que estava sem pressa e me convenceu a ficar com a vez dele. Isto é, fui inserido no atendimento preferencial.
Recordo bem que era uma tarde de segunda-feira. Guardo essa lembrança porque foi justamente quando (embora eu não saiba dizer qual santo baixou em mim) resolvi fazer uma caminhada. Então, me fiando nos meus cambitos, coloquei uma roupinha apropriada, calcei o meu único e malhado par de tênis, deixei o Conjunto Walfredo Gurgel e desci a Presidente Dutra na contramão. Cheio de gás!
O meu plano era mesmo aproveitar a viagem e cuidar das fuças. Então prossegui avenida abaixo. Dessa forma, compensando o meu frágil condicionamento físico, utilizei-me da ladeira. Porque descendo todo santo é puxa-saco. Ao fim e ao cabo, sem querer contar vantagem, mas contando, cheguei ao meu destino. Consciente, no entanto, de que o retorno seria através de um telefonema para o número 192: o velho e bom Samu. Como raras vezes acontece, o salão estava quase que vazio.
Depois do cabelo cortado e da barba feita, animei-me, recobrei as forças e fui parar na TecMicro, loja e oficina de informática dos amigos Nilson e Marquinhos Rebouças, situada na Alberto Maranhão, defronte do ginásio de esportes. Riram bastante da minha aventura e ousadia, mas arrumei uma carona com eles.
O senhor Fernandes, ao lado da sua equipe de mulheres, todas reconhecidas profissionais da beleza, oferece tudo o que um salão de responsa deve oferecer. O corte de cabelo (ao menos o masculino) custa dez reais. A barba, vinte. Não é, portanto, algo para quem quer; é para quem pode. Ignoro os preços dos demais serviços. O que sei é que a alta-roda mossoroense só pisa naquele beco a fim de melhorar o visual. Ali, em meio ao cheiro das frutas e ao ruído do comércio, encontramos destacadas figuras do âmbito político, empresarial, literário e religioso desta cidade.
É no Beco das Frutas, de segunda a sábado, onde muita gente cuida da aparência e da autoestima. Só não revelo o nome do estabelecimento para não abespinhar marqueteiros, publicitários, relações-públicas e colunistas sociais, dignos arautos da honra, solidez e glória do café-soçaite destes confins do mundo.
Marcos Ferreira é escritor