sexta-feira - 07/09/2012 - 23:53h
A morte

A eternidade de cada segundo

Quando a gente começa a enterrar os amigos tem a clara sensação de estar na “fila”. Com um desejo implícito: não há interesse em furá-la.

Acho que a morte nos humaniza mais.

Nos apequena ou nos deixa no exato tamanho do que somos: um átomo. Somos uma partícula do universo.

Ao pó retornaremos, descobrimos aos poucos.

É um retorno que passa obrigatoriamente pelos laços da infância. Serpenteamos por aquele labirinto de memórias em que nos deparamos com o Minotauro, reencontramo-nos com os amigos e constatamos que muito já se foi.

O que nos falta?

A eternidade de cada segundo.

Como átomos.

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
domingo - 02/09/2012 - 08:39h

Olhe-se no espelho!

Por Lya Luft

No mês passado participei de um evento sobre o Dia da Mulher. Era um bate-papo com uma platéia composta de umas 250 mulheres de todas as raças, credos e idades. E por falar em idade, lá pelas tantas, fui questionada sobre a minha e, como não me envergonho dela, respondi.

Foi um momento inesquecível!!… A platéia inteira fez um ‘oooohh’ de descrédito.

Aí fiquei pensando: “pôxa, estou neste auditório há quase uma hora exibindo minha inteligência, e a única coisa que provocou uma reação calorosa da mulherada foi o fato de eu não aparentar a idade que tenho? Onde é que nós estamos?”

Onde não sei, mas estamos correndo atrás de algo caquético chamado ‘juventude eterna’. Estão todos em busca da reversão do tempo. Acho ótimo, porque decrepitude também não é meu sonho de consumo, mas cirurgias estéticas não dão conta desse assunto sozinhas.

Há um outro truque que faz com que continuemos a ser chamadas de senhoritas mesmo em idade avançada. A fonte da juventude chama-se “mudança”. De fato, quem é escravo da repetição está condenado a virar cadáver antes da hora. A única maneira de ser idoso sem envelhecer é não se opor a novos comportamentos, é ter disposição para guinadas.

Eu pretendo morrer jovem aos 120 anos.

“Mudança”, o que vem a ser tal coisa?

Minha mãe recentemente mudou do apartamento enorme em que morou a vida toda para um bem menorzinho. Teve que vender e doar mais da metade dos móveis e tranqueiras, que havia guardado e, mesmo tendo feito isso com certa dor, ao conquistar uma vida mais compacta e simplificada, …….Rejuvenesceu!.

Uma amiga casada há 38 anos cansou das galinhagens do marido e o mandou passear, sem temer ficar sozinha aos 65 anos. Rejuvenesceu!.

Uma outra cansou da pauleira urbana e trocou um baita emprego por um não tão bom, só que em Florianópolis, onde ela vai à praia sempre que tem sol. … Rejuvenesceu!!!.

Toda mudança cobra um alto preço emocional. Antes de se tomar uma decisão difícil, e durante a tomada, chora-se muito, os questionamentos são inúmeros, a vida se desestabiliza. Mas então chega o depois da coisa feita, e aí a recompensa fica escancarada na face. Mudanças fazem milagres por nossos olhos, e é no olhar que se percebe a tal juventude eterna.

Um olhar opaco pode ser puxado e repuxado por um cirurgião a ponto de as rugas sumirem, só que continuará opaco porque não existe plástica que resgate seu brilho.

Quem dá brilho ao olhar é a vida que a gente optou por levar.

Olhe-se no espelho…

Lya Luft é escritora, cronista e tradutora

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica / Grandes Autores e Pensadores
  • Repet
domingo - 08/07/2012 - 03:37h

De onde vem minha força

Por Carlos Santos

À Dona Maura.

Confesso-lhes: não há um único dia de minha vida que não lembre de minha mãe – dona Maura.

Passam dias, anos começam a se distanciar, eu assim mesmo não a vejo ao longe. Parece tão perto, aqui do lado, que nem computo a partida como perda. Não nos largamos. Estamos mais próximos.

Se dificuldades parecem intransponíveis, o ar teima em faltar, nem a perturbo. Poupo-lhe de minhas angústias. Sei que de algum modo virá a luz. Dela. Tem sido assim.

Mas se estou alegre, exultante com alguma vitória, aí sim a procuro: é para dividir minha alegria. É também sua. Partilho.

Nos últimos anos fui sitiado, tenho sofrido as mais profundas vilanias; nem meus filhos foram poupados da má-fé. Mesmo assim não capitulei ou caí na armadilha de ser, como eles são, para legitimar o que fazem.

Dona Maura não gostaria que eu fosse como eles, para deixar de ser como ela me formou. É principalmente pela senhora que optei não reagir à altura. Vem daí minha força silenciosa, meu autocontrole.

O mal sempre volta às mãos de quem o arremessa. É um juiz infalível. Não precisarei levantar a mão.

“(…) Se eu curvar meu corpo na dor
Me alivia o peso da cruz
Interceda por mim minha Mãe, junto a Jesus.”

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
domingo - 01/07/2012 - 08:35h

Minha amada gosta das cidades grandes…

Por Honório de Medeiros

Para Bárbara Lima

Minha amada gosta das cidades grandes, do bulício das ruas elegantes nas manhãs de sol pálido que não lhe agrida a pele muito branca, quando se dedica às compras “virtuais” e compõe mentalmente, enquanto deambula, várias toilettes com as peças à mostra, da rotina dos cafés ao entardecer que são promessas de noite e despedidas do dia, das noites suavemente embaladas por uma discreta taça de vinho, à qual seguem, como um coroamento de um dia feliz, un dessert, e um sono tranqüilo, embalado pela confortante presença próxima do seu ateliê, onde se dedica à requintada arte do “scrap”, no qual obras de arte feitas à mão disputam espaço com as marcas sutis de sua presença diária.

Já lhe ponderei, diversas vezes, acerca das maravilhosas manhãs na Serra, quando a neblina propõe, aos transeuntes, um véu opaco com o qual os envolve enquanto o silêncio, companheiro de nossas caminhadas, somente é perturbado pelo ir-e-vir dos pássaros e o balançar dos ramos e galhos das árvores tangidas pelo vento matinal, e, também, das tardes pungentes tão típicas e plenas de uma profusão de cores cambiantes que esmaecem lentamente anunciando a noite, ah!, a noite, e o imenso céu estrelado, límpido, misterioso, inigualável, do Sertão…

Eu lhe prometi um espaço somente seu, amplo, no qual cada laivo de sua imaginação criadora tenha a condição de se transformar em realidade, separado do chalé com o qual sonho por um caminho margeado pelas flores das quais tanto gosta e pelas árvores das quais sou tão próximo, onde ela poderia receber as pessoas que a procurassem lhes oferecendo um café feito na hora a ser servido nas delicadas e herdadas xícaras onde despontam motivos florais finamente estampados, acompanhado de biscoitos da terra, de gosto suave, que facilmente se dissolvem na boca, ou, quem sabe, nos frios dias de julho, uma taça de chocolate quente enquanto a conversa fluísse animada.

Receio não lhe ter convencido, posto que o prosaico da vida sempre interfere nos sonhos de cada um: é a rotina do trabalho, a rotina dos filhos, a rotina dos compromissos que exigem nossa presença diária e nos impõem atividades que não gostamos, deveres que nos assoberbam, atenções que nos impedem de nos entregarmos plenamente à vida que passa tão rápida enquanto desperdiçamos nosso tempo a ranger os dentes de raiva pelo trânsito que não flui, a nos eriçarmos para o combate com nossos estressados semelhantes, a nos debater com a melancolia que nos assoma no final-do-dia pelo muito que é perdido quando constatamos que nada mais somos que apenas outra peça da engrenagem.

Quantos de nós, envelhecidos, eu não observo enquanto me desloco: são tão poucos os que sorriem! Será que neles há o fastio do acúmulo das horas inúteis, a consciência do tempo perdido com coisas vãs? Será que esse balanço de final-de-vida, quase sempre negativo, é que lhes colocou nos rostos esse olhar vazio, tão distante? Será que essa entrega derradeira, o abandono da condição de controle do próprio destino, é que constitui o caldo de suas amarguras? Como saber?

Enquanto penso dou razão à minha amada e me conformo, mas não perco a esperança. Enquanto espero, e os dias rolam na minha vida como as contas de um terço rolam nas mãos daqueles que rezam, escapo para o último andar do prédio onde moro, prédio entre prédios, subo a escada que conduz ao topo, e lá, derramo meu olhar descontente por sobre a cidade febril enquanto gulosamente sinto, sobre mim, o infinito do céu no qual os limites existente são o vôo dos pássaros e de um ou outro avião.

Honório de Medeiros é professor, escritor e ex-secretário da Prefeitura do Natal e do Estado do RN

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
  • Repet
domingo - 24/06/2012 - 10:54h

A aula de amor

Por Francisco Edilson Leite Pinto Junior

À tarde do dia 15/06/2012 ficará marcada para sempre na minha memória. Interessante é que o meu corpo, cansado do plantão noturno, no dia anterior, na Liga contra o Câncer, dizia: “não vá!”. Mas, algo muito maior, ficava sussurrando no meu ouvido e me empurrava literalmente para aquele encontro: “Vá! Saiba que esta será uma oportunidade única. Imperdível!”.

Não sei se foi com Malba Tahan que li que há quatro coisas que não voltam atrás: a pedra atirada; a palavra dita; o tempo que passou e a ocasião perdida. Então, não poderia perder esta ocasião de estar na companhia de meus três professores de pediatria: Dr. Heriberto Bezerra, Dra. Zélia Fernandes e Dr. Nei Fonseca.

Os dois últimos, juntamente comigo e o jornalista Leonardo, da oficina da notícia, faríamos uma entrevista – que na verdade virou uma verdadeira aula de amor -, com o Prof. Heriberto Bezerra que passara, recentemente, a condição de membro EMÉRITO da Academia de Medicina do RN.

Logo na primeira pergunta que fiz, disse-lhe que iria contar uma história, de pronto o Prof. Heriberto respondeu: “Vamos ver se o peso da idade me permitirá lembrar!”. É: 87 anos, não são 87 dias… Aí surgiu, no canto esquerdo da varanda, uma voz: “Pode deixar que eu estou aqui para lhe ajudar a lembrar de tudo!”. Era a voz, doce e meiga, de D. Maria, esposa do professor Heriberto.

Deu para perceber, então, que entrevistar o Professor Heriberto era também entrevistar a sua companheira de mais de 65 anos, pois ali, havia duas almas num só corpo. Ali, a frase de Nietzsche – “terei o prazer de conversar com ela quando for velho…”- fazia todo o sentido.

Meu Deus! Agradeci por este momento inesquecível! As perguntas iam sendo feitas, mas o meu interesse, era saber quando todo aquele amor tinha começado: “Sempre fui radical”, dizia o professor Heriberto, “ai, participei de uma greve, quando estudante na faculdade de medicina, em Recife, em 1942, contra o professor de patologia que tinha uma didática péssima. Então, após a greve só tive duas escolhas: sair da faculdade ou ir transferido para Salvador”.

Bendita greve! Bendito Professor de patologia e a sua péssima didática, pois foi, na cidade de todos os santos, que o amor brotou. E continua até hoje. Dava para perceber, a alegria estampada nos olhos dos dois a cada revelação, a cada caso contado, a cada história. Era uma verdadeira cumplicidade que o tempo não fora capaz de destruir; é isso mesmo: “O Amor tudo crer, tudo espera, tudo suporta…!”.

E meninos, eu vi! Vi o amor do Dr. Heriberto pela sua profissão (que contagiou os eternos alunos: Dr. Nei Fonseca e a Dra Zélia Fernandes a escolherem a pediatria como especialidade); vi o seu amor pela docência; vi o seu amor pelo seu time de coração, o America; vi o seu amor pela academia de medicina (“Patrimônio das minhas vaidades”, como ele bem disse), mas vi, principalmente, o seu amor pela sua companheira de anos, D. Maria.

É lógico que não poderia sair dali sem saber qual o segredo de tanta paixão e tanto amor, sentimentos tão raros entre os casais hoje em dia. “O segredo?! Acho que foi deixar que ela sempre mandasse em tudo!”, afirmou o velho mestre.  Todos nós rimos: mestre, alunos e a sua amada. E por fim, a grande revelação: “Sou um homem feliz!”. Também pudera: amando e sendo amado, até hoje, não poderia ser diferente.

Chegando ao carro, agradeci a Deus por essa transfusão de energia que tinha recebido. Eu, que depois de duas semanas vivenciando momentos tão difíceis, onde a ingratidão, a incompreensão e a decepção estavam rondando a minha alma, recebia como um bálsamo dos deuses, esta senhora aula sobre a vida, sobre o amor.

É claro que fiz logo um pedido a Deus: “Oxalá, Meu Pai! Permita-me viver com a minha adorada esposa o mesmo tempo! Permita-me que as projeções do estimado professor Carlos Dutra, de que viverei 92 anos estejam certas, mas que só farão sentido se for ao lado da minha amada Viviane!”.

Para quem ainda não sabe, minha Viviane também surgiu de uma forma interessante na minha vida.

Estava iniciando a minha segunda residência, a de oncologia no INCA (Instituto Nacional de Câncer), quando ficou determinado que teríamos também que estagiar nas outras unidades, fora do INCA. Como sempre sou do contra… logo me revoltei, ensaiei até uma greve, mas o bom senso – do meu colega de turma Luciano Luís -, prevaleceu: “Homem, deixe de besteira! Quem sabe lá não vamos aprender mais do que aqui?…”.

E lá vou eu para o Hospital de Oncologia, próximo à rodoviária do Rio de Janeiro. E num domingo ensolarado, tive o primeiro contato com a minha adorada. Ela apareceu no refeitório e eu nunca mais a deixei. Nem poderia! Afinal, Viviane é a minha outra metade que veio me completar. Tem razão Mario Quintana ao dizer: “O amor é quando a gente mora um no outro”.

Viviane é uma verdadeira garrafa de náufrago jogada ao mar, e ao encontrá-la, salvei a mim mesmo. Ela é aquele “anjo lindo que apareceu com olhos de cristal; me enfeitiçou… e meu coração quando está ao seu lado, fica louco de satisfação: solidão nunca mais!”.

Dia 02 de julho de 2012, fará vinte anos do nosso primeiro beijo. E que me perdoem os meus estimados enólogos Prof. Elmano Marques, José de Medeiros Jr., Gilvan Passos e Ivan Brasil, pois não há Cabernet Sauvignon, Pinot Noir, (nenhum Barolo, nenhum Brunello), nada que suplante o aroma e o sabor daquele beijo…

Pois é, meu estimado professor Heriberto Bezerra: muito obrigado por mais uma aula; e a você minha adorada Viviane, muito obrigado: por me fazer conhecer a felicidade! Por me dar o maior tesouro, Lucas! Pelo seu amor, pois é através dele que consigo respirar…

Francisco Edilson Leite Pinto Junior – Professor, médico e escritor.

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
sexta-feira - 01/06/2012 - 22:13h
Tudo ou nada

A última e decisiva batalha na ‘guerra das moscas’

A administração do Mossoró West Shopping (MWS) está com uma missão quase impossível: colocar fim à ‘esquadrilha de moscas’ que diariamente ocupa seu ambiente interno, da Praça de Alimentação às suas lojas de produtos/serviços diversos.

A tarefa não é fácil. E não se pode dizer precipitadamente que não tenha ocorrido empenho à eliminação desse incômodo inaceitável num equipamento mercantil com tais características. O esforço é cotidiano e frenético, mas sem êxito.

Desde sua inauguração há mais de quatro anos, o MWS teve pelo menos duas empresas especializadas em pragas e detetização – com conceito no mercado – atuando no local. Sem sucesso. Perderam feio a guerra para esses “dípteros” (animais que possuem duas asas).

A praga, de fazer inveja às maldições que teriam assolado o Egito, conforme contam as sagradas escrituras, tem demonstrado enorme resistência. Fazem acrobacias e transitam soberanas, imponentes, de ‘nariz empinado’. Não parecem se incomodar com a impertinente presença humana, coabitando o mesmo espaço comercial.

As moscas tornaram-se habituês do lugar. Revelam um lado refinado e chique, como se fossem de uma nova espécie: a ‘Musca Patricinha’.

Sentem-se bem entre mármores, escadas rolantes, granitos, colunas e vitrines iluminadas. O que não chega a ter a concordância da clientela capitalista, obrigada a dividir mesas, cadeiras e os espaços físicos do shopping com esses insetos gosmentos. Eles, de graça; o consumidor, pagando.

Fala-se no shopping, na contratação de uma terceira empresa, sob custo não revelado, para finalmente bani-las. Colocar um fim no problema. Se a nova tentativa falhar, o jeito é recorrermos à turma da lagoa: os sapos. A partir daí, passaremos a testemunhar uma batalha de caráter biológico, com esse exército saltitando entre nossos pés, em lojas e corredores, numa cruzada definitiva.

Predadores naturais das esvoaçantes moscas, os batráquios podem ser chamados a essa ‘deliciosa’ (para eles) refeição. Não duvidemos. Uniriam o útil ao agradável. Com sorte, podem até realimentar o lirismo dos contos de fadas, cedendo um beijo para quem acredita poder descobrir um príncipe encantado em seus lábios finos e gélidos.

Quem duvida, heim?

Princesas, candidatem-se! Moscas, cuidem-se!

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
  • San Valle Rodape GIF
terça-feira - 15/05/2012 - 09:01h
Para Manoel Barreto

Imagens de uma ópera popular em vermelho e branco

Por Carlos Santos

Duas imagens fixaram-se em mim às primeiras horas de hoje. As duas em vermelho e branco. São imagens inesquecíveis, simbológicas. São desenhos rabiscados a partir de fatos reais do passado.

Com a morte do meu amigo Manoel Barreto, ontem, ex-presidente do Potiguar – tratado pela imprensa e pelos amantes do alvirrubro como “eterno presidente”, é difícil não ficar um pouco lerdo, grogue. Mas, me refaço na luta cotidiana, confessando – por exemplo – que sou todo sentimento.

Não escrevo uma crônica para ele – Manoel. É, também, para Manoel. Escrevo para ficar mais leve. É para mim. Escrever é uma forma de libertação, uma terapia existencial, válvula de escape. O que me faz vivo. Inteiro.

Resgato imagens, que aleatoriamente emergiram nesta manhã, quando me fixei diante do computador para começar a trabalhar.

Lembro-me de abril de 2004, ano em que o Potiguar ganhou seu primeiro título estadual sob a presidência de Manoel. A alegria esperada por décadas, que empanzinou o Estádio Nogueirão de gente, catalizou multidões diante da TV para ver o segundo jogo decisivo em Natal (contra o América) e invadiu a Avenida Presidente Dutra para receber os campeões.

Lembro-me do trajeto pela BR-304 – Mossoró a Natal – e a visão em Lajes, com dezenas de ônibus, vans, carros particulares e gente aos montes, avisando que aquele sábado seria do Potiguar, em Natal.

Ah, as imagens!

Nas minhas digressões, com as palavras sendo disparadas a esmo, quase esqueci das imagens. A narrativa até aqui serve para ambientar, contextualizar e exumar a atmosfera daquelas horas e dias.

A primeira imagem: numa cabine de rádio no Estádio Machadão, quando a segunda partida estava finalizada e o Potiguar erguia a taça. Acorri àquele espaço de pequenas proporções para abraçar Lupércio Luiz, comentarista esportivo, mossoroense, torcedor do Potiguar. Ele estava agarrado a uma bandeira do alvirrubro. Chorava como menino.

A mim, Lupércio fez a confissão de uma ausência, diante de uma multidão que ‘invadiu’ Natal e o Machadão, tomando praticamente a metade dos lugares no estádio. Eram quase 15 mil pessoas no ‘caldeirão’ alvirrubro.

– Meu pai não viu o Potiguar ser campeão estadual, Carlos!

– Ele está vendo agora, por seus olhos, Lupércio – confortei-o.

A segunda imagem: em Mossoró (domingo, 18 de abril de 2004), com um sorriso contagiante entre os jogadores campeões e diante de uma multidão em êxtase, Manoel é o resumo de uma ópera popular em vermelho e branco. Seu sorriso é incessante. Apesar do burburinho, ele localiza-me em meio às milhares de pessoas e brada uma palavra que resume a sua própria essência generosa. Uma conquista que era muito sua, Manoel deixava que também fosse minha e nossa:

– Conseguimos!

Nota do Blog – Naquele campeonato inesquecível para os torcedores do Potiguar, a decisão foi em dois jogos. No primeiro, em Mossoró, o Potiguar fez 4 x 0 contra o América (dia 13 de abril) e no jogo seguinte (17 de abril), o time mossoroense – que poderia perder até por três gols de diferença que ainda  assim seria campeão, foi derrotado por 0 x 1 em Natal.

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
domingo - 29/04/2012 - 09:57h

Os livros nos escolhem!

Por Honório de Medeiros

Muito poucas foram as vezes em que entrei em uma livraria sabendo o que buscava. Ao contrário. A grande maioria das vezes entrei somente pelo prazer de entrar, de ver, de sentir o cheiro dos livros, de ouvir o murmúrio de outros apaixonados como eu para quem eles foram, desde sempre, um grande amor.

Poucas vezes saí sem nada nas mãos. Sempre – e isso é o que importa neste relato – fui buscado por algum ou alguns livros. Sim, porque são eles que nos escolhem.

Como poderia ser diferente se outra explicação não há para esse amor que surgiu quando minha mãe me colocava para dormir lendo estórias em quadrinhos do Pato Donald, enquanto nos balançava na rede, e, um dia, para sua surpresa, me pegou soletrando as sílabas?

Os livros dos meus vizinhos, abandonados, valeram-se de mim para saírem de sua solidão – em minha casa sequer Bíblia existia. Os livros, ah!, os livros, eles nos escolhem, e da minha infância para a meninice, lá estavam eles: “O Mundo da Criança”; “O Tesouro da Juventude”; e, depois, logo depois, Julio Verne, Alexandre Dumas, Victor Hugo, Edgar Rice Burroughs, Karl May…

Pois bem, é como digo, os livros nos escolhem. Chegam a nós das mais estranhas maneiras, desde o presente de um amigo, que pensa ter acertado na escolha por um motivo qualquer, muito embora tenha acertado por outro totalmente diferente, a aquele decorrente do inexplicável oferecimento visual ocorrido quando, cansados de perambular pela livraria, nos sentamos em uma poltrona, a única vaga, e – como se fosse algo inesperado – aquele livro que nos escolheu aparece imediatamente no nosso campo visual. Não há como resistir.

Ele estava nos esperando. Agradecidos pela escolha pegamo-lo carinhosamente, e o folheamos, sentimos seu cheiro inigualável, sua textura, passamos uma vista d’olhos por suas páginas e o levamos conosco, ambos muito felizes. Assim aconteceu certa noite quando, em um aeroporto qualquer, aguardando a hora de embarcar e vagando pela livraria, já imaginando que daquela vez eu teria que me contentar com as revistas – fraco sucedâneo – meus olhos foram atraídos por “Os Devaneios do Caminhante Solitário”, de Rousseau!

Quantas e quantas vezes não falara acerca do “Contrato Social” para meus alunos de Filosofia do Direito, ao lhes explicar em que crença se fundava nosso fé no Ordenamento Jurídico enquanto expressão da Vontade Geral da Sociedade. Antes Rousseau que Niklas Luhmann.

Antes Rousseau, que dera um lavor inigualável à genial intuição de Protágoras de Abdera… Agora, ali, outra vertente desse mal-amado e original filósofo francês, me convidava a, com ela, travar conhecimento. Abri o livro ao acaso. Li o que se me ofereceu aos olhos: “É dessa época que posso datar minha total renúncia ao mundo e esse gosto vivo pela solidão que não me abandonou desde então.”

“Como?”, me indaguei, “Vila-Matas escreve toda uma obra, Doutor Pasavento”, em homenagem à arte de desaparecer, que é a face mais exposta da renúncia, usando como pano-de-fundo a história de Robert Walser, e não cita Rousseau?” Segurando firmemente o livro de Rousseau tomei o caminho que me conduzia ao caixa para compra-lo e, em seguida, feliz por ter sido escolhido, entrar no avião onde me esperavam algumas horas de voo e de leitura.

Honório de Medeiros é professor, escritor e ex-secretário da Prefeitura do Natal e do Estado do RN

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
  • Repet
domingo - 08/04/2012 - 03:19h

Os holofotes que não me veem

Por Carlos Santos

O esporte nacional brasileiro não é o futebol, como muitos imaginam: é a ‘inveja’. Inveja-se não apenas o ‘ter’, mas também o ‘ser’. Daí vem a ira. Parte das depressões advém da mesma fonte.

Na rede social denominada de Facebook, por exemplo, virou mania reproduzir foto de celebridade que era pobre e descabelada e ficou rica e bonita. São punidas pelo sucesso. Pode?

Muitos esquecem que vários desses exemplares humanos apenas estão ‘caiados’ por fora, para que pareçam também belos por dentro. Faz parte do ‘show’. Precisam parecer melhores, verdadeiras divindades.

Mas, independentemente do que tenham de bonito por dentro, todos possuem o direito de melhorar por fora. Ou será que não é esse um exercício diário de cada um de nós, feios ou bonitos, diante do espelho?

Quem é ‘normal’ é assim: cuida da própria aparência físico-exterior. Os que pretendem ser melhores, priorizam o interior. E os dois zelos não são excludentes.

No fundo, essa atitude de condenação ao êxito alheio, é inconscientemente uma crise de identidade: não nos conformamos com a própria cara e biografia. É como se disséssemos que os holofotes estão apontados à pessoa errada.

“Olha eu aqui, ó! Por que não eu?”, rosna nosso ego ferido. A inveja latente, a mesma que levou Caim a eliminar Abel. Os dois, irmãos, eram paupérrimos e anônimos pastores de ovelhas.

Entre eles, onde não existia quase nada de bem material, havia a pior das pobrezas: a do espírito.

Caim não é um personagem bíblico. É um ser humano que habita muito de nós até hoje.

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
domingo - 25/03/2012 - 12:44h

Entre os mais ricos do mundo, um ‘excluído’

Por Armando Fuentes Aguirre (Catón)

Tenho a intenção de processar a revista “Fortune”, porque fui vítima de uma omissão inexplicável. Ela publicou uma lista dos homens mais ricos do mundo, e nesta lista eu não apareço. Aparecem: o sultão de Brunei, os herdeiros de Sam Walton e Mori Takichiro.

Incluem personalidades como a rainha Elizabeth da Inglaterra, Niarkos Stavros, e os mexicanos Carlos Slim e Emilio Azcarraga. Mas eu não sou mencionado na revista. E eu sou um homem rico, imensamente rico.

Como não?

Vou mostrar a vocês: Eu tenho vida, que eu recebi não sei porquê, e saúde, que conservo  não sei como. Eu tenho uma família, esposa adorável, que ao me entregar sua vida me deu o melhor para a minha; filhos maravilhosos, dos quais só recebi felicidades; e netos com os quais pratico uma nova e boa paternidade.

Eu tenho irmãos que são como meus amigos, e amigos que são como meus irmãos. Tenho pessoas que sinceramente me amam, apesar dos meus defeitos, e a quem amo apesar dos meus defeitos.

Tenho quatro leitores a cada dia para agradecer-lhes porque eles lêem o que eu mal escrevo.

Eu tenho uma casa, e nela muitos livros (minha esposa iria dizer que tenho muitos livros e entre eles uma casa).

Eu tenho um pouco do mundo na forma de um jardim, que todo ano me dá maçãs e que iria reduzir ainda mais a presença de Adão e Eva no Paraíso.

Eu tenho um cachorro que não vai dormir até que eu chegue, e que me recebe como se eu fosse o dono dos céus e da terra. Eu tenho olhos que vêem e ouvidos para ouvir, pés para andar e mãos que acariciam; cérebro que pensa coisas que já ocorreram a outros, mas que para mim não haviam ocorrido nunca.

Eu sou a herança comum dos homens: alegrias para apreciá-las e compaixão para irmanar-me aos irmãos que estão sofrendo. E eu tenho fé em Deus que vale para mim amor infinito.

Pode haver riquezas maiores do que a minha?

Por que, então, a revista “Fortune” não me colocou na lista dos homens mais ricos do planeta? E você, como se considera? Rico ou pobre?

Há pessoas pobres, mas tão pobres, que a única coisa que possuem é … DINHEIRO.”

Armando Fuentes Aguirre (Catón) é escritor mexicano

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
  • Art&C - PMM - Sal & Luz - Julho de 2025
domingo - 25/03/2012 - 11:00h

Amor dos anos 60 deixava muito a desejar

Por Arnaldo Jabor

Eu sou do tempo em que as namoradas não davam. É. Estou enojado dos dias de hoje, nesta torpe função de comentarista, em que as notícias batem-me na cara como pedras. Estou cansado. Volto ao passado, sugado por um túnel de flash-backs. Pois é; as namoradas não davam.

A pílula foi a maior revolução cultural dos anos 60, pois as meninas, com pavor de engravidar, deixavam quase tudo menos o principal e os rapazes iam para casa com dor nos rins e perpetravam masturbações feéricas, ejaculando nos banheiros como foguetes à Lua. Os meninos de hoje vivem em haréns.

Estes “pequenos canalhas” que eu tanto invejo torcem o nariz para deusas de 18 anos, entediados, enquanto, no meu tempo, quantas meninas eu tentei empurrar para dentro de apartamentos emprestados, ficando elas empacadas na porta, quantas unhas quebradas em soutiens inacessíveis, quantas palavras gastas em cantadas intermináveis, apelando para Deus, para Marx, para tudo, desde que as saias caíssem, as blusas se abrissem, as calcinhas voassem. Não havia motéis, então.

Namorávamos em qualquer buraco: terrenos baldios, cantos da praia de noite; eu confesso que já “amassei” uma namorada dentro de uma grossa manilha encalhada na Praia de Ipanema. Os carros eram poucos e deixavam um rastro de silêncio depois que passavam. Havia menos gente. Aconteciam menos coisas.

As pessoas eram mais individualizadas – fulano, sicrano, rua tal, número tal, bar tal, comida tal, um dia depois do outro… Havia tempo para o tempo passar.

Mas, deixemos de filosofias e fiquemos na sacanagem. Minha primeira namorada não era mais virgem. Era uma raridade. Era uma morena febril, agressiva que dirigia uma Rural Willis do pai. Eu, que vivera até então na horrenda divisão entre puteiros e romances líricos, entre lágrimas e baldes de despejo, achei que ia começar meu primeiro amor adulto.

Mas, acontece que minha namorada resolvera reconstituir sua virgindade, recusando-se a perpetuar comigo seu “erro” do passado. Arrependera-se de ter cedido uma única e sangrenta vez ao “canalha” que me antecedera e, depois de lágrimas em confessionários, resolvera manter sua pureza intacta. Para mim, foi um calvário de desejo insatisfeito.

Na Rural Willis do pai dela, quase tudo era permitido, mas tudo sôfrego, apavorado, desespero e gozos no ar, ejaculações no painel – nada terminava. O apartamento era a grande esperança; se a menina entrasse, depois era mole. O problema era entrar. “Não, não adianta, Arnaldo, aí eu não entro!…”

Eu, jovem comuna, tinha a chave de um “aparelho” secreto do Partidão, ali na Rua Djalma Ulrich, com um sofá-cama rasgado com o algodão aparecendo, para onde eu, da “base” cultural da UNE, tentava levar, sem sucesso, menininhas de esquerda, com triplo medo: sentimento de culpa, medo de broxar e de ser apanhado pelos comunistas “caxias”. “Não. Aí eu não entro!”, gemia minha namorada.

Eu tentava argumentos que iam de Sartre e Simone até à revolução. “Mas, meu bem… deixa de ser ‘alienada’… A sexualidade é um ato de liberdade contra a direita…” E ela: “Não entro! Isso seria também uma indisciplina pequeno-burguesa.” “Mas, meu anjo – eu suplicava -, não há essência, só existência… Inclusive – disparei – você tem que assumir que não é mais virgem!” E ela, com boca de nojo: “Eu sabia que você ainda ia jogar isso na minha cara!!!” E fugia pelas escadas.

O medo era a barriga, medo que a pílula matou anos depois, mas era medo também de um labirinto de liberdades assustadoras, de apego a vestidos de debutantes, organdi branco, a véus de noiva esvoaçando nas almas românticas. Ninguém dava.

As poucas que o faziam eram apontadas pelos rapazes, com fascínio e suspeita, um respeito desconfiado. Quantos teriam coragem de casar com elas? Lembro de uma menina da universidade que entrava num transe meio epiléptico, de olho virado em alvo, que “dava” num sacrifício ritual de gritos e choros do qual acordava sem lembrar de nada… Era um sucesso entre comunas caretas, uma espécie de “louca da aldeia”.

Por isso, homens falando em “liberdade” viviam em “rendez-vous” e em aventuras com mulheres casadas, infelizes matronas (uma que levei ao “aparelho” chorava pelo marido militar e gemia de vingança: “Ele odeia comunistas… ahh… se ele soubesse…”). Ou então eram pobres empregadas carentes, “lúmpens” de rua (como se dizia); um companheiro nosso papou até uma cega do Instituto Benjamim Constant. E havia também o recurso a mulheres turistas e estrangeiras.

Um comuna amigo meu “traçou” uma funcionária do consulado americano, a quem ele obrigava a chamá-lo de “Fidel Castro” (esse já foi até ministro…). Tudo era complicado, proibido, ao som do rock e bossa nova. Éramos assim em 1962.

Aos poucos, melhorou… Em 63, conheci minha primeira grande paixão, minha vertigem e cegueira, pois, antes da pílula e sem recuos, ela tinha adentrado gloriosamente o “aparelho” secreto do Partidão na Rua Djalma Ulrich e, em meio a livros da Academia de Ciências da União Soviética, sob um pôster de Lenin e uma reprodução dos Girassóis de Van Gogh, “dera” para mim com amor e coragem.

Foi um raio de triunfo em minha juventude. Lembro até hoje que, lá embaixo, na loja de discos, tocava o sucesso da época, “Chove Chuva Chove sem parar…”, com Jorge Ben (ou seria Bicho do Mato?) Não sei. Mas, até hoje guardo na alma aquela tarde mágica e revolucionária de 63, com música do Jorge ao fundo, com a mulher com quem vivi até 69, ano em que ela resolveu me abandonar por outro, quando o grande sucesso musical era também de Jorge Ben: “Sou flamengo e tenho uma nega chamada Thereza…”, o que fazia esse jovem comuna chorar pelas ruas, ao ouvir seu nome nos rádios e nas esquinas…

Arnaldo Jabor é cineasta, escritor e comentarista de variedades na Rede Globo de Televisão

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica / Grandes Autores e Pensadores
domingo - 18/03/2012 - 11:02h

Da arte de largar a velha nicotina

Por Mário Prata

Largar de fumar é facílimo! A frase não é minha. É do sempre ótimo Millôr Fernandes, que complementava:

– Eu, por exemplo, já larguei umas quinze vezes!

O pior problema dos tabagistas, não é fumar. É passar a vida inventando maneiras de deixar de fumar. Sempre achei que um dia irão proibir a fabricação e a gente vai fumar unzinho só, traficado, por dia. Da lata! Mas, enquanto os governos não tomam providências, cada um vai se virando da sua maneira para deixar o vício.

Conheço várias histórias de tentativas verdadeiras (todas frustradas, é claro) de amigos e amigas. A minha comadre Joana Fomm, por exemplo, foi me visitar um dia em Cascais, tirou o maço do bolso e me pediu:

– Não rias! Não rias!

Cortou com a mão metade do cigarro e fumou a outra parte. Claro que eu ri. Joana continua fumando até hoje. Só que, no lugar de um maço, fuma dois, pela metade. Mas tem seu fundo científico. Segundo o doutor Castanho, do spa São Pedro, este método está sendo testado nos Estados Unidos e muita gente vem abandonando o prazer. Sabia, Joaninha?

Meu querido colega João Ubaldo Ribeiro, por exemplo. Foi proibido de fumar porque a nicotina estava afetando a visão dele. Na Copa dos Estados Unidos, onde quer que a gente estivesse, ele se encostava em mim e falava baixinho no meu ouvido:

– Me dá um.

– Mas você não está proibido?

– Mas eu vou fumar escondido.

– Escondido de quem?

– De mim, uai.

E ia fumar atrás de uma árvore. Parecia que estava a fazer xixi.

Tenho um amigo, em Lins, de mais idade, que também está proibido. E olha que ele é médico. Sabe o que ele faz? Nem fuma, nem traga. Come cigarro. Isso mesmo, come.

Mas os métodos vão evoluindo. Na minha infância tinha um tal de Nicotinex. Depois inventaram chichetes de nicotina. Dava um hálito horroroso. Hoje em dia tem as tais placas que você gruda no peito. Com todo o meu respeito às indústrias farmacêuticas, sei não…

E o furo na orelha, você lembra? Grande moda do final dos anos setenta. Chegou um gringo aqui e começou a furar orelha de todo mundo. Parecia o Tyson. Não podia ver um fumante com orelha que mandava o bisturi. Depois dava um ponto. Tinha uma fila.

Ele operava trinta, quarenta pessoas de cada vez. Deve ter ficado rico. Sem falar na acupuntura. Sei não… Me lembro de um famoso advogado que fez a operação da orelha (eu também fiz) e começou a fumar escondido da família e dos amigos. Pode? Pode, porque eu também fiz a mesma coisa.

Agora, o pior não-fumante é o ex-fumante. Como fica chato. É como aquele que para de beber e não consegue mais acompanhar o papo dos que bebem. Além do mais, passam a fumar charutos e/ou cachimbo. Quer cheiro pior?

Toda essa tergiversação começou com um encontro casual que eu tive com uma ex-namorada que eu não via há quase 30 anos. Foi domingo num spa. Ela estava com as tais placas peito acima, me garantindo que, desta vez, ia largar o vício de mais de 40 anos. Ela estava de visita ao irmão e eu num almoço para uns publicitários. Cinco horas, ela indo embora. Meu cigarro acabou e eu ainda ia ficar mais umas duas horas.

– Aninha, você não se incomoda de deixar o seu maço comigo? O meu acabou e a lojinha está fechada.

– Tenho vergonha, me disse toda tímida.

– Vergonha do quê, de me dar o seu maço?

– É que você não vai acreditar.

Me deu um maço de Free. Já tínhamos (novamente) alguma coisa em comum.

– Olha. Olhei.

– Mas o que é isso? Juro:

– É que, para fumar menos, puxar menos fumaça, eu pego o maço, ainda fechado e faço vários furos nele. De um lado até o outro do maço, está vendo. Igual àquelas espadas nas caixas de mágico com, mulher dentro. Acerto o filtro e várias partes do cigarro.

Você não pode imaginar o estrago que estava o maço da Aninha. Ela foi embora. Eu tentei fumar. Tentei. Pode ser uma solução. Furar o mal pela raiz.

Mário Prata é escritor e cronista

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
  • Art&C - PMM - Sal & Luz - Julho de 2025
domingo - 19/02/2012 - 13:34h

História de mineiro

Por Dinah Silveira de Queiroz

Estou sabendo de uma historinha que bem valia um conto e feito por quem a narrou, o contista que anda arrebatando todos os prêmios dos concursos em que se inscreve: Edson Guedes de Morais. É um caso de mineiro.

Trata de gente pobre e de filho que veio trabalhar no Rio, prosperou e um dia mandou uma carta ao pai:

Meu pai, com a graça de Deus, posso dizer que já tenho economia suficiente para pretender realizar qualquer sonho seu. Minha maior felicidade estará em poder propor: que possa fazer para alegrá-lo? 0 que mais desejaria na vida? Tenho pensado muito em sua luta de sacrificado e não me lembro de tê-lo ouvido falar sobre qualquer aspiração. Não se acanhe, papai, mande dizer se o senhor quiser alguma coisa.”

Lá da cidadezinha das Minas Gerais veio uma carta. Daquele homem religioso, devoto de Nossa Senhora Aparecida, austero, confiando nos seus deveres e trabalhos: o homem que jamais manifestara ao filho o seu desejo de possuir, por exemplo, um carro, ou ter um negócio só seu, ou, no mínimo, de adquirir uma lavadeira automática para desafogar o trabalho da mulher:

— “Meu filho, com a graça de Deus, todos vão com saúde. Não me falta nada. Assim como vivo, vivo bem. Mas se você quiser saber de um desejo que sempre tive fique sabendo agora que toda a vida quis ver o mar. É só isso, meu filho, mais nada.”

Tão pouco lhe pedia o pai ! Mandou-lhe o filho a passagem, depois de ter escolhido um bom hotelzinho na Tijuca, freqüentado por gente de pequenas posses, mas pessoas escolhidas — só família, enfim.

E o velho chegou com a alegria de ver o filho que realizara o que inúmeras gerações de sua gente não haviam conseguido: ter dinheiro sobrando. Vieram as efusões, as lágrimas. O primeiro dia passou, e, logo no segundo, o filho veio buscar o pai:

“Papai, vista-se que eu vou levá-lo a Copacabana. Está na hora de realizar o desejo.”

O velho olhou-o piscando meio trêmulo:

— “Hoje, não. Quero visitar a prima Carlota, que mora aqui perto. Amanhã eu vou”. Chegou amanhã, e o pai, sempre tremendo e piscando, disse que não se sentia bem para ir a Copacabana. No terceiro e no quarto dias também, afirmou que não podia ir e que queria comprar uma lembrancinha para a mulher e para a filha.

Alguns dias decorreram e o grande encontro entre o mineiro e o mar foi sendo protelado. Já, então, o filho estava meio triste com aquela estranha atitude do pai e, afinal, desabafou:

— “Parece que o senhor não está querendo mesmo ir ver o mar! Desde que chegou aqui não encontra um dia para realizar aquilo que afirmou ser o único desejo de sua vida!”

O pai chegou a pegar o chapéu, passou a mão no ombro do filho mas estava tão perturbado, que desta vez, realmente, parecia doente.

— “Meu pai, o que é que o senhor tem? O que há?”

O velho mineiro, de olhos nublados, hesitou. Por fim, largou o peso da verdade de uma vez:

— “Acho uma coisa tão maravilhosa poder ir ver o mar que quero entregar a Nossa Senhora o meu sacrifício. Meu filho, não se zangue. Vou voltar hoje mesmo para casa sem ir a Copacabana”.

— “Mas por que, meu pai? Por quê? Nem Nossa Senhora vai aceitar esse seu sacrifício. Todo mundo vê o mar todo dia. Gente há que nem liga, passa pela praia e nem volta o rosto para ele…”

Mas, a essa altura, o velho já ia juntando os seus trens. Nesse mesmo dia voltou para sua cidade das Minas Gerais, levando em sua imaginação a idéia do abismo de assombro que ele jamais encontraria.

Dinah Silveira Queiroz – (1911-1982) Escritora e romancista nascida em São Paulo-SP

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica / Grandes Autores e Pensadores
domingo - 22/01/2012 - 08:58h

Uma oração

Por Jorge Luís Borges

Minha boca pronunciou e pronunciará, milhares de vezes e nos dois idiomas que me são íntimos, o pai-nosso, mas só em parte o entendo. Hoje de manhã, dia primeiro de julho de 1969, quero tentar uma oração que seja pessoal, não herdada. Sei que se trata de uma tarefa que exige uma sinceridade mais que humana.

É evidente, em primeiro lugar, que me está vedado pedir. Pedir que não anoiteçam meus olhos seria loucura; sei de milhares de pessoas que vêem e que não são particularmente felizes, justas ou sábias.

O processo do tempo é uma trama de efeitos e causas, de sorte que pedir qualquer mercê, por ínfima que seja, é pedir que se rompa um elo dessa trama de ferro, é pedir que já se tenha rompido. Ninguém merece tal milagre. Não posso suplicar que meus erros me sejam perdoados; o perdão é um ato alheio e só eu posso salvar-me.

O perdão purifica o ofendido, não o ofensor, a quem quase não afeta.

A liberdade de meu arbítrio é talvez ilusória, mas posso dar ou sonhar que dou. Posso dar a coragem, que não tenho; posso dar a esperança, que não está em mim; posso ensinar a vontade de aprender o que pouco sei ou entrevejo.

Quero ser lembrado menos como poeta que como amigo; que alguém repita uma cadência de Dunbar ou de Frost ou do homem que viu à meia-noite a árvore que sangra, a Cruz, e pense que pela primeira vez a ouviu de meus lábios.

O restante não me importa; espero que o esquecimento não demore. Desconhecemos os desígnios do universo, mas sabemos que raciocinar com lucidez e agir com justiça é ajudar esses desígnios, que não nos serão revelados. Quero morrer completamente; quero morrer com este companheiro, meu corpo.

Jorge Luís Borges – (1899-1986) – Era escritor argentino

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
  • San Valle Rodape GIF
sábado - 31/12/2011 - 20:15h
Ano Novo

Simpatia para ser feliz em 2012

Daqui a poucas horas, 2012.

O calendário é uma invenção humana. Ajuda-nos a realimentar esperança, reordenar projetos, fazer novos planos, nos situarmos no tempo. Misturamos espiritualidade com crendice e certos jogos lúdicos, que psicologicamente nos levam a acreditar que a felicidade pode estar em comer lentilhas ou pular sete ondas (com sete pedidos) à beira-mar, nesta noite.

Em se tratando de “simpatia”, prefiro o substantivo feminino. Nele, resumidamente, tem-se a ideia de afinidade e bem-estar transmitidos por outra pessoa.

A simpatia no sentido da supertição, não me atrai. Diverte-me. Mas evito o desdém diante de quem confia em mogangas, com suposta conexão celestial, para guiar o próprio destino.

Até me pergunto, como escapar a esse turbilhão de expectativa que se cria, ao final de cada ano, em forma de cores, gestos e rituais. Não custa nada festejar nossa cultura. Pelo menos, para não começar o novo período – do calendário – alimentando contrariedades bobas.

Para dar tudo certo, vá de branco, tá bom?

Chupe sete sementes na noite de Réveillon, embrulhe todas num papel e guarde o pacotinho na carteira para ter dinheiro o ano inteiro.

À meia-noite, para ter sorte no amor, cumprimente em primeiro lugar uma pessoa do sexo oposto.

Na primeira noite do ano, use lençóis limpos. Assim tudo começa desembaciado no ano novo.

Dê três pulinhos com uma taça de champanhe na mão, sem derramar nenhuma gota, e jogue todo o líquido para trás. Assim, tudo o que for ruim ficará no passado.

Ah, ia esquecendo: pule num pé só (o direito), à meia-noite, para atrair coisas boas.

Reforce-se para afastar maus fluidos, diante do mar. Pegue cinco ou oito rosas brancas (números de Iemanjá e Oxum), perfume de alfazema, fitas com as cores da harmonia (azul, amarelo, rosa, branco e verde), espelho, talco, sabonete e bijuterias. Forre uma cesta com celofane, amarre uma fita no cabo de uma flor e jogue um pouco de talco e de perfume por cima. Depois, coloque o espelho, o sabonete e as bijuterias na cesta e leve para o mar. Conte três ondas e, na quarta, ofereça a cesta à Iemanjá e a Oxum.

Assim, dizem, tudo vai dar certo no ano novo.

Huum!! Mas cá pra nós: simpatia mesmo é o gesto que cativa. A palavra amiga, o ombro solidário, o peito fraterno, o choro comum, o riso à vontade, o trabalho apaixonado e a suprema elegância do respeito às diferenças.

Que venha 2012. E não custa nada botar um galhinho de arruda preso à orelha para ajudar.

Amém!

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
domingo - 20/11/2011 - 12:07h
À luta, mesmo assim

Não se preocupe com a vida… você não vai escapar vivo

New Orleans (EUA) dos negros, da pobreza, mas também do jazz, do rio Mississipi, piratas e corsários, poliglota; da indústria do petróleo, do arrasador furacão Katrina (2005) e multicultural, inspirou o jornalista-escritor Truman Capote. Em muitas de suas crônicas ela era o ambiente. A atmosfera.

Num café, “o menos frequentado de New Orleans”, ele descreve em 1946, o jeitão da proprietária, senhora Morris Otto Kunze: “não parecia se importar; passava o dia sentada atrás do balcão (…), e só se movia para espantar as moscas”.

Mas foi lá, que ele captou num mural rococó, em espelho quebrado e sujo,  uma frase que imprimia justificativa à vida do lugar: “Não se preocupe com a vida… você não vai escapar dela vivo mesmo!”

Esse olhar largado, quase entregue ao determinismo, é uma versão mais antiga do “deixa a vida me levar… vida leva eu”, do sambista carioca Zeca Pagodinho. Tem funcionado para ele.

Comigo tem sido diferente, mesmo sabendo que não vou escapar vivo dessa vida. Eu cuido do meu destino e da minha própria felicidade.

Não os passei a terceiros. Não os entrego a outrem.

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
  • Repet
domingo - 13/11/2011 - 16:23h

Cravo e canela e o fruto da maturidade

Por Carlos Santos

Tropical como somos, temos uma infinidade de frutas a mexer com o paladar nacional. Muitas, agora, na versão mulher. Há algum tempo, quase não existem mais daquelas de carne e osso. “Tá em falta”, diria o feirante da Ceasa.

Sobram principalmente as de bundas enormes e peitos siliconados, vendidas como “piriguetes” ou “modelos”. No fundo, é bom que esclareçamos: seu “consumo” é subjetivo e virtual, ou cabe apenas na conta de uma minoria endinheirada para rápida “digestão”.

Pelo visto, começa a escassear a mulher-mulher, daquelas que são apenas loura ou morena, branquinha ou negra, que gostam de ser amadas e não apenas “comidas”.

Como toda mulher normal, ela tem dúvidas quanto aos seus próprios encantos.

Raramente são autosuficientes como as “frutas” e ainda se enternecem com as flores e a música que fala de amor, símbolos atemporais do bem-querer.

Costumam repetir que “todo homem é igual”, numa generalização tão errônea quanto à adotada pelo sexo oposto, de que “toda mulher é a mesma coisa”.

Que bom, você existe! Sinuosa no olhar, cintilante. Com uma beleza brejeira, quase infantil. Cândida. Que irrompe a vida de cara limpa, sorriso maroto, como se fosse nascida de um romance de Machado de Assis, Guimarães Rosa ou Jorge Amado.

Menina? Mulher? Menina-mulher.

É cravo e canela.

Para aqueles que se movem por apetite lascivo, em sua direção, só aparecem seus contornos de mulher. Sem aguçada serenidade e percepção, jamais vão descobrir os traços de ninfa, nem seu vigor como gente que não aceita dizer “sim”,  cavilosamente, porque  aprendeu cedo a dizer “não” por livre-arbítrio.

Essa mulher é recheada de dúvidas, oscila entre amar e se esconder, mas não se entende como objeto. Chora, angustia-se. Fecha-se ensimesmada. Sorrir para dizer que as lágrimas não lhe fazem mal, porque fertilizam seu peito e serão o sopro de renovação da vida em seu útero.

Ela sabe que partilhar rima sempre com amar. Que distância fere e limita movimentos, mas é uma ponte, se os extremos querem chegar a outra margem.

Com essa mulher é diferente. Ainda bem. Não deixa de ser menina, roendo unhas, rindo de tudo, dando rabiçaca com a cabeça, lambuzando-se de sorvete e saindo por essa vida aventureira repleta de sonhos.

Amuando-se para ser, de novo, afagada. Mimada para se descobrir menina; carregada no colo para ser mulher.

Olhos de Capitu, desconfiados; olhos de Diadorim, vítreos, reluzentes; olhos de Gabriela, de um negro intenso… não importa. Seu olhar é sempre ponto de partida ou porto seguro. Um paradoxo em si. Arquipélago que nos puxa do alto mar à terra firme, como vigorosos fios de cabelo.

Cabelos que encobrem um rosto ruborizado, em que lábios proeminentes se contraem, a prender o fôlego e sufocar palavras. Assim, ajudam a traçar uma moldura entre o inocente e o travesso. Cativante imagem que é um convite ao vinho, com pés desnudos, prontos ao carinho.

Muitos perdem o apetite pela descoberta, depois de certas experiências e tempo. Até confundem mulher com fruta, volume com conteúdo. O escritor Truman Capote descreveu bem o que é maturidade para separar delírio de brilho:

Depois de certa idade ou certas noções, torna-se muito difícil o deslumbramento; ele funciona melhor na infância; depois, se a pessoa der sorte, encontra uma ponte até a infância e a atravessa.

Carlos Santos é criador e editor desta página

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
domingo - 13/11/2011 - 08:28h

O cronista é um escritor crônico

Por Affonso Romano de Sant´Anna

O primeiro texto que publiquei em jornal foi uma crônica. Devia ter eu lá uns 16 ou 17 anos. E aí fui tomando gosto. Dos jornais de Juiz de Fora, passei para os jornais e revistas de Belo Horizonte e depois para a imprensa do Rio e São Paulo.

Fiz de tudo (ou quase tudo) em jornal: de repórter policial a crítico literário. Mas foi somente quando me chamaram para substituir Drummond no Jornal do Brasil, em 1984, que passei a fazer crônica sistematicamente.

Virei um escritor crônico.

O que é um cronista? Luís Fernando Veríssimo diz que o cronista é como uma galinha, bota seu ovo regularmente. Carlos Eduardo Novaes diz que crônicas são como laranjas, podem ser doces ou azedas e ser consumidas em gomos ou pedaços, na poltrona de casa ou espremidas na sala de aula.

Já andei dizendo que o cronista é um estilita. Não confundam, por enquanto, com estilista. Estilita era o santo que ficava anos e anos em cima de uma coluna, no deserto, meditando e pregando.

São Simeão passou trinta anos assim, exposto ao sol e à chuva.

Claro que de tanto purificar seu estilo diariamente o cronista estilita acaba virando um estilista. O cronista é isso: fica pregando lá em cima de sua coluna no jornal. Por isto, há uma certa confusão entre colunista e cronista, assim como há outra confusão entre articulista e cronista.

O articulista escreve textos expositivos e defende temas e idéias. O cronista é o mais livre dos redatores de um jornal. Ele pode ser subjetivo. Pode (e deve) falar na primeira pessoa sem envergonhar-se. Seu “eu”, como o do poeta, é um eu de utilidade pública.

Que tipo de crônica escrevo? De vários tipos. Conto casos, faço descrições, anoto momentos líricos, faço críticas sociais.

Uma das funções da crônica é interferir no cotidiano. Claro que essas que interferem mais cruamente em assuntos momentosos tendem a perder sua atualidade quando publicadas em livro. Não tem importância.

O cronista é crônico, ligado ao tempo, deve estar encharcado, doente de seu tempo e ao mesmo tempo pairar acima dele.

Affonso Romano de Sant´Anna é escritor

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
  • Repet
segunda-feira - 31/10/2011 - 10:57h
Para Drummond

A ‘dádiva’ de não ser poeta

“Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.” (Carlos Drummond de Andrade)

O gosto pelas letras chegou cedo. Em casa, entre os mantimentos diários acomodados num balde de alumínio, um jornal. Era assim, diariamente.

Tínhamos as revistas Seleções, O Cruzeiro. Depois apareceram outras notivades da escrita, num tempo em que a televisão não era tão soberana e onipotente.

Revistas em quadrinhos foram centenas, sob o combate da mãe zelosa, que não via nelas qualquer atrativo à minha formação. Enganara-se. Pelo menos dessa feita, enganara-se.

Drummond, mais do que um “José”

E o que dizer da coleção Tesouros da Juventude? Todos os clássicos infanto-juvenís estavam lá. Alexandre Dumas em seus enredo de capa-e-espada, Júlio Verne futurista.

Nesse tempo eu queria escrever. Seria escritor. Jornalista, não. Poeta, quem sabe, heim?

Nem escritor nem poeta. Um repórter provinciano, é o que sou. É o que posso ser, sem perder a admiração por quem o é.

Drummond, Quintana (meu preferido), Manuel Bandeira, Thiago de Mello, Leminski, Castro Alves, Fernando Pessoa, Florbela Espanca, Patativa, Olavo Bilac…

Os nossos, próximos, Marcos Ferreira, Antônio Francisco, Cid Augusto, Cefas Carvalho, Paulo de Tarso Correia de Melo, Luiz Campos…

Aceito, passivamente, a “dádiva” de não ser poeta. Se o fosse, o que seria de mim? Um bardo sem prumo. Coube-me o gosto pelo verbo lapidado por esses e tantos outros escultores. Eu, como um Michelangelo tosco, apenas imploro diante de Moisés: “Parla!”

Enquanto isso, vou-me nessa vida aventureira, um “gauche” sem a poética que anseio. Em busca do paroxismo da frase perfeita.

* Minha homenagem a Carlos Drummond de Andrade, que hoje estaria completando 109 anos: 1902-1987.

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
sábado - 29/10/2011 - 04:36h

Reflexão para ser feliz III

O medo é parte essencial entre os que têm coragem.

Sem ele, até atravessar uma rua movimentada, sem olhar pros lado, é um ato de loucura.

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
  • Art&C - PMM - Sal & Luz - Julho de 2025
quarta-feira - 26/10/2011 - 09:17h

Reflexão para ser feliz

Se toda vez que a gente for se relacionar com alguém, começando pela exumação do seu passado, é melhor ficar em casa com uma boneca inflável.

Mas até ela enche.

Também!

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
domingo - 23/10/2011 - 13:32h

A imortalidade

Por Carlos Santos

Não sei o tempo que me resta aqui na terra.

Mais um dia? Alguns meses? Podem ser vários anos.

O certo é que não farei, do tempo, um resto de vida.

Tem que valer a pena. Tem valido.

Cada segundo é precioso. Respirar apenas, não me basta.

Preciso existir nos outros, pelos meus atos e não apenas com a palavra que lapido no meu trabalho.

A imortalidade é o que deixamos no coração dos que ficam. Enquanto ele bater, pulsará também pelo o que fizemos de bom e útil.

Imortal!

Compartilhe:
Categoria(s): Crônica
Home | Quem Somos | Regras | Opinião | Especial | Favoritos | Histórico | Fale Conosco
© Copyright 2011 - 2025. Todos os Direitos Reservados.