domingo - 08/12/2019 - 08:30h

Nossas culpas

Por Inácio Augusto de Almeida

Vivemos assustados. Clamamos pela tolerância zero como forma de inibir a delinqüência. Gradeamos as nossas casas e mantemos nossos filhos presos nos jogos televisivos.

Perdemos o direito de ir e vir.

Pagamos o preço da substituição da fraternidade pelo egoísmo.

Trocamos o bom gosto pelo exibicionismo, a beleza pela utilidade, a cultura pela riqueza. Só nos interessa o triunfo do materialismo e da ciência. Importamo-nos muito pouco com a religião e a arte. Arte que desintegramos em manias e maneirismos.Buscamos a riqueza pela riqueza e nos esquecemos de que a riqueza vem e a paz se vai. O corpo prospera, mas a alma decai. Porque a riqueza pela riqueza equivale a perda da honra, do senso de beleza.

Transformamo-nos em amontoadores de coisas, nos ocupamos primordialmente em transferir dinheiro alheio para o nosso bolso.

Vivemos assustados. Clamamos pela tolerância zero.

Pregamos ética, mas só praticamos a ética que nos é conveniente.

Condenamos o egoísmo alheio e nos esquecemos de que a amizade suplanta a filosofia, e as crianças nos tocam a alma com a música mais profunda que todas as sinfonias.

Um dia descobriremos que os homens não são máquinas.

Neste dia, não mais viveremos assustados, não mais clamaremos por tolerância zero. E transformaremos as grades de nossas casas em balanços onde as crianças, risonhas, sentirão a brisa da tarde num parque de diversão, livres de qualquer medo. E prezaremos mais o aperfeiçoamento da vida do que a vitória na vida.

Se hoje as nossas cidades já não possuem alma, amanhã seremos nós que também não mais teremos alma.

Troquemos a nossa montanha de egoísmo, a nossa fraternidade de vitrine, por um grão de humildade, por um pingo de amor ao próximo.

Já é hora de começarmos a reconciliação maior, única maneira de acabarmos com a violência.

E esta reconciliação plena começa dentro de nós mesmos.

Inácio Augusto de Almeida é jornalista e escritor

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Categoria(s): Crônica
quarta-feira - 27/11/2019 - 09:04h
Meu mundo

Estou muito bem

Algumas pessoas me perguntam por que sou arredio a debates em redes sociais. Por uma questão de civilidade e saúde mental, respondo-lhes.

Não tenho linguagem para sustentar altercações baseadas em insultos, recalques e democracia da opinião única.O silêncio me dá paz.

Estou muito bem.

Redes sociais são um péssimo ambiente para discussões. Assemelham-se ao trânsito, em que qualquer um infla músculos e verbo, numa coragem que talvez não tivesse em outro espaço ou contexto.

A arte de ter razão, aqui lembro Schopenhauer, é arrimada na estupidez.

Sei bem que essa interação gera mais seguidores, projeção e acessos.

Esses ativos não me atraem tanto, que fique claro.

Sou iluminista por convicção e exercício diário, o que por si só contraria essa selvageria virtual entre seres que sabem ‘tudo’ sobre tudo.

Descobri com o tempo que minha Santa Mãezinha, Dona Maura, sempre foi aristotélica: “A virtude está no meio”. Segundo ela, na moderação, na tolerância. Na prática de contar até dez, até 1000, para não perder a cabeça.

Aqui, não. Nesse mundo, aluado tem fãs.

Mentiria se lhe falasse que não gostaria de ter 1 milhão de pessoas me acompanhando.

Quem tem seguidor é líder de seita.

Se milhares me ouvem e, às vezes me escutam, ótimo. Se esperam a ofensa pela ofensa: ‘peguem o beco’.

Sei ouvir.

Falem, por favor.

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domingo - 24/11/2019 - 08:24h

Bar raiz

Por Odemirton Filho

Amâncio estava encostado no balcão para tomar umas. O bar de seu Chico de Hemetério era fétido, ou mal frequentado, como diziam os metidos a rico da cidade.

O estabelecimento tinha paredes rachadas com, apenas, uma demão de cal. Não possuía mais do que quatro ou cinco mesas com tamboretes de madeiras.

Uma prateleira ocupava toda a extensão da parede, preenchida com uma grande quantidade de cachaças em garrafas empoeiradas. A ornamentação se resumia a um chifre de boi pendurado.

Amâncio era freguês assíduo, com mais três ou quatro “papudinhos” que frequentavam diariamente o local. Uns falavam em tom alto, outros choravam por motivos diversos, principalmente, ao som das músicas de “sofrência”.Mas para Amâncio não importava o ambiente, queria mesmo era bebericar, comer tripa de porco e esquecer o desemprego.

O país há tempos estava mergulhado em uma crise econômica e, segundo os “entendidos”, por culpa da corrupção e dos desmandos administrativos da classe política.

Não era novidade para ninguém que os políticos somente apareciam em ano de eleição, com aquele sorriso amarelo e abraçando quem encontrassem pela frente, inclusive crianças com catarro escorrendo pelo nariz.

Não podia reclamar. Quantas vezes recebera tijolos, cimento e telhas para reformar a casa em troca de seu voto? Era costume dele e dos vizinhos varar a madrugada, à véspera da eleição, para esperar um agrado que sempre vinha.

Os vizinhos diziam que era a única oportunidade para receber alguma coisa, já que os políticos, em sua maioria, somente olham o próprio umbigo.

Não demoraria e era certo que a sua mulher, D. Francisca, viria buscá-lo, pois, pelo avançado da hora, sabia onde encontrá-lo. Diziam os amigos que era manicaca. Talvez o fosse, era homem de poucas palavras, não gostava de confusão.

Para completar o dia, seu Zé Rosa encostara-se no balcão para puxar prosa e falar da vida alheia. Seu Zé tinha ficado viúvo há pouco tempo, mas se achava o “Don Juan” da redondeza. Arranjara uma mulher bem mais nova, que só queria usufruir do seu “aposento”.

Zé Rosa, querendo-se fazer íntimo, indagou:

– Amâncio, ainda desempregado?

– Sim. Respondeu em tom seco.

E continuou:

– Soube de Toinho? Caiu doente, quando perdeu o emprego na fábrica de móveis.

-Não. Retorquiu sem olhar no rosto do velho.

Continuou a bebericar a dose de cana sem prestar atenção na história de Zé Rosa, que deveria ser sobre uma nova conquista amorosa.

Estava pensando nas contas que tinha a pagar. O seguro-desemprego terminara, os R$500,00 (quinhentos reais) do FGTS que recebera deram somente para quitar umas dívidas em atraso.

A mulher fazia doces e bolos para vender, mas, diante da crise, muitos brasileiros começaram a vender comida e o faturamento mal dava para pagar o básico da casa.

Pensou em procurar o prefeito, uma vez que todos os seus conhecidos assim faziam quando estavam em dificuldade. Tinham em mente que a função do prefeito era pagar as contas dos correligionários e não trabalhar pela cidade.

Contudo, o Chefe do Executivo municipal, como sempre, estava fiscalizando a reforma das praças. Aquele homem só sabe construir e reformar praças? Pensou.

E o vereador da comunidade? Será que não poderia ajudá-lo? Talvez não, deve estar participando de alguma audiência pública, é só o que sabe fazer.

Tomou mais uma. Seu Chico de Hemetério o olhava com cara de poucos amigos, pois sabia que a farra iria ser, de novo, pendurada no “prego”.

Apesar da idade ainda faltava um bom tempo para se aposentar. E pelo que viu na televisão a reforma da Previdência, depois de muito “moído”, foi aprovada. Disseram-lhe que iria “pegar” a transição, seja lá o que diabo isso significasse.

Não demorou muito e ouviu a voz da “patroa”, que veio buscá-lo. Pediu a seu Chico de Hemetério que anotasse na caderneta, que, logo, logo, viria quitar a dívida.

Para agradar o dono do bar, disse-lhe que, ali sim, era um bar de verdade, raiz, como se diz atualmente. O proprietário, entretanto, fez-se de rogado.

Saiu trôpego, sendo conduzido por D. Francisca, ouvindo impropérios.

Ainda ouviu as gargalhadas e o falatório de seu Zé Rosa e dos outros “papudinhos”:

– Ah cabra manicaca!

Odemirton Filho é bacharel em Direito e oficial de Justiça

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Categoria(s): Crônica
domingo - 24/11/2019 - 05:40h

Homem

Por Inácio Augusto de Almeida

Mar, terra, céu, homem

Amor, ódio, fidelidade

Traição

Paixão, indiferença, bondade

Homem

 

Correção, cafajestismo

Caridade, maldade

Mar, terra, céu

Homem

Homem, Homem, Homem

 

Insensibilidade, compaixão

Genialidade, loucura

Imbecilidade, Inteligência

Patifaria, honestidade

Homem

 

Mar, terra, céu

Equilíbrio de forças

Homem, Homem, Homem

Simbiose de sentimentos

Antagônicos

Inácio Augusto de Almeida é jornalista e escritor

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domingo - 03/11/2019 - 07:46h

O caso

Por Inácio Augusto de Almeida

São sonhos de criança. Sonhos de uma época em que tudo era possível.

A brisa que entra pela janela chega a incomodar. Reluto em levantar-me, mas é preciso fazer a caminhada matinal, afinal, prescrição médica não pode ser postergada assim sem mais nem menos. Mas que dá uma vontade danada de continuar curtindo esta preguiça…Em vão procuro os chinelos, os óculos eu sei que estão na mesinha de cabeceira que alguém inventou chamar de criado mudo.

Chego até a porta e vislumbro a vista maravilhosa. Lá embaixo, as ondas se quebram e com suas espumas brancas colorem as areias finas e claras da praia. Respiro fundo, respiro o ar que posso respirar. Afinal, foram mais de 40 anos de cigarro.

Andei por este mundo de meu Deus, cruzei muitas fronteiras, ia e vinha, sempre sem pressa de ir, sempre desesperado por voltar. E sempre com a esperança de um dia voltar para não mais ir.

Grande foi a alegria ao conseguir o cantinho onde ficar definitivamente. E no local mais do que sonhado.

Mossoró.

Não, não dá para esquecer o primeiro dia em que ao despertar fiquei com medo de chegar até a janela e descobrir que tudo podia apenas ser um sonho. Hoje rio destes pensamentos. Quando se deseja ardentemente uma coisa, quando se ama desesperadamente algo, somente lentamente é que nos convencemos de que a realidade é a que está à nossa frente. Até parece que nascemos para sofrer, já que assimilamos rapidamente como real o que nos magoa e levamos algum tempo para incorporar o que nos dá prazer.

É período de férias e estou em Tibau.

As areias finas no contato com os meus pés causam algum barulho, uma espécie de chiado. É gostoso caminhar descalço. É como se uma massagem estivesse sendo feita nos pés. Acho que é uma massagem, sim. E a melhor de todas, pois a massagista é a senhora natureza.

De volta da caminhada, a grande rede na varanda, o bom livro de algum poeta que sabe, de verdade, fazer poesias. Da cozinha vem o bom cheiro do camarão aferventando. Na geladeira o vinho de uma boa safra. Depois a rede na varanda.

E com o embalo que o vento dá na rede, difícil manter os olhos abertos. O barulho das ondas no seu vai-e-vem soa aos meus ouvidos como uma canção de ninar.

E assim a tarde se vai lentamente, cheia de preguiça, indo com vontade de ficar.

Na linha do horizonte o sol, entre nuvens vermelhas, inicia o seu desmaio diário e começa a mergulhar nas águas transparentes da linda praia.

A luz da lua toca os meus olhos. Um convite a olhar o enorme espelho que forma ao se refletir no mar.

Na praia casais namoram. Estão preocupados com a preservação da espécie. Traçam planos…

Existe lugar melhor para o amor? A lua, a praia, o barulho do mar, a beleza das alvas areias da mais bela praia do mundo…

Obrigado, meu Deus. Eu não merecia tanto.

Inácio Augusto de Almeida é escritor e jornalista

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Categoria(s): Crônica
domingo - 27/10/2019 - 09:22h

Solidão e liberdade

Por Honório de Medeiros

Encontrei Antônio Gomes em Pau dos Ferros, no rumo de suas terras na Serra das Almas, fugindo do frio na Europa.Tomamos um café coado no “Maria”.

Me disse que gostara muito de uma frase minha postada no blog.

– Qual?

“Somente é livre quem pode dizer não”. Mas observo que primeiro é preciso dizer sim ao projeto de dizer não para ser livre.

– Você sempre um sofista!

Ele riu e observou, quase que como para si mesmo, que “isso tudo o levara a compreender a solidão, no final da vida, de tantos artistas e pensadores…”

Honório de Medeiros é professor, escritor e ex-secretário da Prefeitura do Natal e do Estado do RN

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domingo - 27/10/2019 - 07:36h

Omissão

Por Inácio Augusto de Almeida

Mataram um traficante.
Você disse: EU NÃO SOU TRAFICANTE.

Mataram um jornalista.
Você disse: EU NÃO JORNALISTA.

Mataram um policial.
Você disse: EU NÃO SOU POLICIAL.

Mataram um promotor.
Você disse: EU NÃO SOU PROMOTOR.

Mataram um deputado.
Você disse: EU NÃO SOU DEPUTADO.

Mataram um governador
Você disse: EU NÃO SOU GOVERNADOR.

Mataram VOCÊ.
O ENTERRO FOI LINDO!

Inácio Augusto de Almeida é jornalista e escritor

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Categoria(s): Crônica
domingo - 22/09/2019 - 10:00h

Falta de tempo

Por Inácio Augusto Almeida

Coelho tinha acabado de pedir outra cerveja. Ageu abriu tendo antes o cuidado de enxugar a garrafa tal a quantidade de gelo que se formara.

– Cerveja só presta assim, bem gelada.

-É isso aí, Ageu. É por isso que eu só tomo cerveja no seu bar.

Luís, sentado num banco alto, debruçava-se sobre o balcão e observava a cena.

No fundo do bar, entre um copo de cerveja e outro de pinga, Valdemar buscava se embriagar.

Na televisão notícias sobre empreguismo de parentes e protegidos de políticos com salários absurdos. Todos não concursados.  Notícias de sempre que não mais atraíam a atenção de ninguém.

Na calçada, pessoas iam e vinham, em passos lentos, desapressados, como se tudo estivesse a esperar por elas.

“Há quanto tempo estou para terminar a leitura daquele livro? Quando, pela última vez, fiz uma visita a um hospital ou a um abrigo de crianças?”

-É água que não acaba mais!

– O Nordeste é assim mesmo, Valdemar. Ou seco de estorricar ou com água capaz de afundar o barco de Noé.

– O barco de Noé, Coelho?

– Perto destas enchentes, aquilo que o Noé viu é chuvisco.

A risada foi geral. Até o Ageu, sempre preocupado em saber a despesa de cada um, riu.

Falavam das chuvas que caíam no Recife e estavam provocando enchentes e causando mortes.

Na televisão as imagens de casas desabando e carros sendo arrastados mostravam um quadro desolador que pouco tocou a sensibilidade daqueles que bebericavam numa manhã tão vazia quanto eles.

Coelho ajeitou-se melhor na cadeira e bebeu um pouco mais de cerveja. Sentiu que ela já não estava tão gelada.

“Há quanto tempo não escrevo para os amigos que estão no Maranhão e em Goiás? E a visita que eu tenho que fazer ao Padre Sátiro?

É… Por quê? Por quê?…”

– O que diabos o Coelho tem hoje que está tão calado?

– Vai ver, Ageu, ele “furou-se” no jogo de pôquer, disse Luís.

– Ah, isso eu duvido. Coelho perder no pôquer… Só se for muita zebra.

– Mas não esqueça, Ageu, que prego também tem seu dia de martelo..Por falar em Roberto, onde anda ele?

Foi a Brasília. Ele só vive lá e cá.

Coelho tudo ouviu e nada disse. Apenas mandou Ageu anotar na caderneta as cervejas que tomara e, despedindo-se de todos, seguiu pela Alberto Maranhão no rumo do centro da cidade.

“Tempo, tempo, tempo… Não tenho tempo para as coisas que preciso fazer.Tempo é o que me falta.”

Ouviu como que um grito:

Tempo é uma questão de preferência. Nós sempre temos tempo para coisas que gostamos de ler.

Riu. E balançando a cabeça decidiu terminar a leitura do livro, visitar o Padre Sátiro e escrever as cartas que tinha que escrever.

Faria tudo isto amanhã mesmo.

No outro dia, na hora de sempre, entrou no Bar do Ageu  e pediu uma cerveja.

Em uma outra mesa, Coelho e Valdemar falavam de corrupção e impunidade.

Inácio Augusto de Almeida é jornalista e escritor

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Categoria(s): Crônica
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domingo - 08/09/2019 - 08:18h

A moça da praça

Por Odemirton Filho

Passos apressados. Precisava chegar ao trabalho no horário do expediente, pois tinha se atrasado algumas vezes e o patrão já reclamara.

O caminho que percorria sempre passava pelo mesmo lugar: a praça Vigário Antônio Joaquim, defronte à Catedral de Santa Luzia, em Mossoró.

Uma cena, todavia, chamava a sua atenção: havia sempre uma moça sentada no banco da praça, folheando um livro.

Como tinha pressa, não a observava de forma mais acurada, apenas de soslaio. Porém, como a cena era recorrente, começou a se interessar pela presença da jovem. Ela vestia roupas simples, mas possuía um belo semblante.

Algumas vezes, apesar do pouco dinheiro, comprava um jornal na banca do saudoso “Zé Maria”, a fim de ter um motivo para vislumbrar aquela moça.

Nos dias seguintes começou a acordar mais cedo, sempre com o intuito de chegar a praça e ver a desconhecida que tanto o encantava e o intrigava.

Certo dia, arriscou cumprimenta-la e, de forma educada, a jovem respondeu com um sorriso.

Em uma ocasião, tomou coragem, parou e puxou um dedo de prosa. Disse-lhe que estava curioso, pois sempre a via sentada no banco, quase no mesmo horário.

Ela, de forma gentil e com a voz suave, respondeu-lhe que sempre assistia à missa das 06h na Catedral e depois gostava de ficar sentada no banco, lendo e, de quando em vez, acompanhando o voo dos pombos que faziam morada nos arredores da praça.

Como dizia ela: apreciando o simples da vida.

Com o passar dos dias, ele sempre chegava cedo para que pudesse conversar com sua nova amiga, que tinha um “papo” agradável.

A jovem, pedindo reservas, disse-lhe que estava doente e o médico tinha lhe dado pouco tempo de vida.

Quem passasse pela praça acharia que se tratava de um casal enamorados, mas, na verdade, ali estava uma bela amizade. Com o tempo, ambos confidenciavam seus segredos e medos.

Ela o encorajava a buscar um novo emprego e continuar os estudos. Ele, por outro lado, dizia-lhe que tivesse fé, pois ainda viveria muitos anos.

Completavam-se.

Um dia, como de costume, saiu cedo de casa para conversar com sua jovem amiga, contudo, não a encontrou.

Outros dias sucederam e não a encontrava. Começou a ficar aflito.  Entretanto, depois de muito procurar, soube que sua amiga tinha falecido há alguns dias.

A vida continuou, decerto. Porém, ao fazer seu caminho diário e atravessar a praça os olhos marejavam e vinham à mente as mais doces lembranças.

Alegre somente o sobrevoo dos pombos na praça Vigário Antônio Joaquim, no Teatro Lauro Monte Filho e na Catedral de Santa Luzia.

O simples da vida.

Odemirton Filho é bacharel em Direito e oficial de Justiça

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domingo - 08/09/2019 - 07:24h

Esse é Zé Brasil

Por Inácio Augusto de Almeida

Membro da milícia papal, cavaleiro d ordem de São João da Barra, centrista convicto. Um homem simples, negro velho, amante da boêmia e inimigo número um do capital e do trabalho, principalmente do trabalho.

Conheci Zé Brasil no Espetinho Mossoró, ali, bem pertinho do Mercadinho do Alto da Conceição.

Já octogenário, Zé viveu a Mossoró de Dix-Huit Rosado . Admirador do Monsenhor Walfredo Gurgel, valentemente combateu as arbitrariedades do regime militar, isto entre um conhaque e outro.

Zé é um tipo que se não existisse , seria preciso inventar…

Pertence atualmente à esquerda da Igreja Católica. Não, não se surpreendam. É verdade. Zé Brasil está na esquerda católica. Se ela existe ou não isto é de somenos importância.

No Espetinho Mossoró, tomando mais um conhaque, Zé degusta as frases de efeito do Papa Francisco.

E vibra quando o Papa Francisco diz que a corrupção fede e que o dinheiro da corrupção é sujo com o sangue e as lágrimas de inocentes.

Repete a todo instante, depois de alguns conhaques, claro, que o Papa Francisco afirma que a igreja cansou de dizer amém. E conclui que não mais escutam o Papa.

Espera que um dia o Papa inicie a construção da igreja dos pobres, pois para Zé Brasil a igreja dos ricos já está construída.

Outro dia perguntei ao Zé Brasil quando Cristo voltaria.

Ele, naquela sua simplicidade, me respondeu:

Não volta mais. Ele agora está acordado. E por estar acordado é que sempre está no meio de nós, mas nunca mais voltará a nós. Basta a crucificação daquela época. Hoje seria muito pior.

E entre um conhaque e outro condena abertamente a destinação de recursos públicos para campanhas políticas em uma época que faltam recursos para Educação, Saúde e Segurança. Melhor, na sua opinião, que este dinheiro fosse utilizado na compra de medicamentos e de livros.

Assim é o Zé Brasil, sempre preocupado com os grandes problemas nacionais.

Sonhador, como todos os boêmios, Zé devaneia.

E nos seus devaneios, isto após 15 conhaques, vê um lugar onde os corruptos são punidos com rigor e a forma maior é a inteligência.

E bebe mais um conhaque, convicto de que um dia tudo será como ele sonha…

Inácio Augusto de Almeida é jornalista e escritor

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domingo - 25/08/2019 - 05:22h

Manhã de domingo

Por Inácio Augusto de Almeida

Maurílio passara em frente ao Grêmio Mossoró, mas não entrara. Sabia que lá dentro só estavam os carteadores. A turma do bilhar nunca comparecia pela manhã. E como o Grêmio aos domingos só funcionava até o meio-dia, o médico resolveu ir papear no barzinho  do Carlos, como sempre fazia quando não ia a Tibau, a exemplo da metade da população de Mossoró.

Nas manchetes dos jornais espalhados pela calçada de forma ordenada, leu que Jânio Quadros prometia varrer a corrupção do país. Riu, discretamente, intimamente, riu. A dúvida era se ria do Jânio ou de si mesmo. Mas tinha certeza de que alguém estava pensando que alguém era ingênuo.Enquanto atravessava a rua observou que, no átrio da igreja, algumas pessoas papeavam.

– Maurílio, Maurílio!

Era Conversinha com aquele seu jeitinho insinuante e agradável. Sentiu que não escaparia de algumas cervejas.

– Viu as manchetes, Conversinha?

– A do O INDEPENDENTE eu li.

– E você acredita que ele consiga?

– Há, há, há.

– Tá rindo de quê?

– Da sua pergunta, há,há,há.

– Você é mesmo um gozador.

– Eu? Ou você que tá querendo zombetear…

– Vai uma cerveja?

– Claro, claro.

A garapeira do velho Guará estava fechada. Ele nunca a abria aos domingos. Quem gostava disto era o Pelado, pois assim podia ir dar o seu mergulho nas águas quentes de Tibau. Durante toda a semana, Pelado era o incansável servidor de caldo de cana e pão semolina. Mas aos domingos, ninguém o afastava da praia.

-Veio tomar cerveja, Maurílio, ou tá querendo caldo de cana? Você não pára de olhar para a garapeira.

-Sabe, Conversinha, eu às vezes ainda me surpreendo com a solidariedade que existe entre os pobres. Você sabe que o Pelado, o Pelado do Guará.

Fez uma pausa. Engoliu um pouco de cerveja, como se quisesse recompor-se.

-Vai, continua. Eu sei quem é o Pelado. Todos em Mossoró conhecem-no.

Com este conhecem-no do Conversinha, numa conversa de beira de balcão regada a cerveja numa manhã de domingo, Maurílio trocou o ar sério, quase sorumbático, por um meio riso.

– Pois bem. O Pelado, um homem pobre, inculto, é capaz de atos fraternos, de atos fraternos, de atos solidários, coisa que muita gente que vive papando hóstias, pessoas ditas cultas, não são capazes de fazer.

– Maurílio, limpar hostiários não significa estar com Deus. E este tipos a que você se referiu como ditos cultos, na realidade são cultos. Muito cultos. Só que sensibilidade, amor ao próximo, bondade, não são coisas que se aprende lendo. Franz Kafka, Niccoló Machiavel, Michel de Montaigne ou Bernardo de Almeida, todos eles colocaram em suas obras a importância da solidariedade, da fraternidade, do amor. Mas isto não depende de quem escreve. Estes sentimentos são inerentes aos puros, aos de bom coração. Não, não se adquire estes valores através da cultura. Eles brotam de dentro, do fundo do coração.

Maurílio olhava para Conversinha de maneira respeitosa. Sabia das traquinagens que o jornalista fazia, dos “traços” que dava em alguns poderosos e vaidosos. Mas sabia também da bondade existente na alma daquele homem de menos de metro e meio de altura.

– Você tem razão, Conversinha. Enquanto o Pelado arrisca o emprego, a sobrevivência, para dar dois pães a quem só tem ficha pra um, por saber que ali está a primeira e talvez a única refeição de pobres meninos de rua, tipos ricos e cultos negam uma moeda a pedintes famintos.

– Maurílio, o domingo tá bonito, a cerveja tá bem gelada e já vai para quase dois mil anos que Cristo foi pregado numa cruz. A injustiça social vem desde que começou o mundo. Eu já estou é para fundar o PIS.

– PIS, Conversinha?

– Sim, Maurílio. O Partido da Injustiça Social. Uma coisa que já existe há tanto tempo, que todo mundo diz combater e que continua existindo, só pode ser uma coisa muito forte. Forte e boa para quem a quem pratica. E já tenho as palavras  de ordem. Veja: pela exploração do homem pelo homem. Pela desigualdade social. Por aumento nas taxas de juros. Pela criança fora da escola. Por uma anistia ampla e irrestrita a todos os deslizes do colarinho branco.

– Deslizes, Conversinha?

– Deslizes, sim, Maurílio. Pobre é que comete crime. A turma do colarinho branco fica só no deslize. Deixe-me continuar, ou você não quer saber o restante do programa do nosso partido?

Esforçando-se para controlar o riso, Maurílio conseguiu dizer:

– Nosso, não. O seu partido.

– Meu ou nosso, vamos em frente. Por igrejas alternativas mais fortes e em maior quantidade. Pela manutenção dos privilégios e criação de novas castas. Pela acentuação da divisão de classes. E como ponto inegociável do nosso programa: a defesa do direito adquirido! Neste não admitimos que ninguém toque. Ninguém!

Maurílio ria a não mais poder. Chegava mesmo a curvar o corpo. Os seus olhos ficaram cheios de lágrimas, talvez de tanto rir ou, quem sabe, de constatar que tudo aquilo que o Conversinha falava acontecia realmente todos os dias e ninguém se tocava.

Olhou para Conversinha com uma enorme simpatia. Taí a razão de gostar daquele jornalista falante. E quando pensava em dizer alguma coisa, sentiu uma mão pousar no seu ombro.

– Na cervejinha, hein, Doutor.  Vai ver o Conversinha já lhe fez dar umas boas risadas.

– Ainda não, Lopes. Hoje ele está mais para o trágico do que para o cômico.

Inácio Augusto de Almeida é jornalista

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Categoria(s): Crônica
domingo - 23/06/2019 - 06:28h

Dez razões para ter um celular

Por Carlos Santos

Carlos Júnior deveria ter uns dez anos e insistia em ganhar um celular.

“Não”, eu descartava.

“Você é uma criança ainda. Não há necessidade!” – dizia o porquê.

Sitiado por tanta insistência, fiz-lhe um desafio: teria que me convencer com uma ‘Exposição de Motivos’ em dez pontos, que seria justificável à aquisição desse aparelho, um Nokya lanterninha, algo bem aquém da modernidade de hoje que os smartphones estampam.

Em poucas horas, atendo ligação com um interlocutor-mirim ansioso do outro lado: “Painho, está pronta a Exposição de Motivos. Venha logo ver”.

Vixe! Já?”

No trabalho, em meio às tarefas diárias e inadiáveis, pondero que depois passaria para receber oficialmente o documento, submetendo-o à minuciosa análise. A decisão sairia posteriormente, estabeleço sem cientificá-lo àquele momento.

“Tenha calma. Amanhã eu vejo” – tento adiar, sob pressão psicológica.

“Quando eu sair do trabalho à noite a gente conversa” – acerto, mas sem me livrar do cerco…

“Vai demorar?” – sou acossado por mais uma ligação.

Sem ter como postergar mais, vou ao seu encontro. Em mãos, sob um olhar atento que esperava endosso imediato, leio (e disfarço minhas lágrimas). “Amanhã eu dou uma resposta”, estabeleço com ar durão. Apesar de decepcionado e enfezado, aquiesce (forçosamente).

No dia seguinte, mostro o conteúdo à equipe na redação do Jornal de Fato, do qual era um dos sócios-fundadores. Leio em voz alta para uma plateia atenta que me ajudaria a decidir. Quando começo a comentar e questionar alguns pontos do texto, recebo logo instantânea pressão para adquirir o equipamento.

Colunista e professora de português, Marilene Paiva é quem mais advoga a tese na redação. “Ele merece”, brada. “Você tem que dar esse celular”, fuzilou.

Acabei cedendo.

Passados tantos anos, com o ‘documento’ original em mãos, lembro do episódio e o porquê da provocação: queria instigar o raciocínio lógico, o poder de argumentação daquela criança.

Também era mais uma oportunidade de fazê-lo entender que qualquer conquista deve ser resultado de esforço e mérito.

Acho que acertei.

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  • Repet
terça-feira - 14/05/2019 - 07:40h
Hoje

O céu de Natal

Mossoró é minha pátria amada.

Mas Natal é uma segunda casa, às vezes até a primeira no carinho dos amigos e no reconhecimento profissional.

‘Santos’ de casa não faz milagre, sei bem.

Porém do meu sertão à capital, o que cabe em mim é um sentimento maior, feito de bem-querer, carinho gratuito e espontâneo, com direito à contemplação devocional.

O céu de Natal também é meu.

Em Mossoró, um pouco eu.

Bom dia, Natal!

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domingo - 21/04/2019 - 10:24h

Um beijo para dizer que “te amo”

Por Carlos Santos

Levei uma “cinturãozada” histórica do meu velho quando devia ter uns oito a nove anos, talvez um pouco menos. Não recordo bem; da peia, sim. Doeu bastante.

Renitente, estoico, resiliente, não queria ceder aos argumentos ásperos que queimavam meu corpo raquítico, mas principalmente a alma.

Fiquei dias amuados. Monossilábico.

Muitos, muitos anos se passaram em nossa convivência. Próximo ao seu fim, algumas vezes me deparei com ele numa cadeira, semi-inválido, com dificuldades à fala. Era um homem preso em novos limites, angustiado pela imobilidade que nunca se permitira.

Seus olhos quase sem brilho perscrutavam meu rosto. Ou mapeavam meu coração. Eram vivos, vivos apesar de… Pareciam querer falar o que ele nunca conseguira, por encabulação de quem não tinha jeito para afagos, chamegos e dengos paternais. Era fechado em si.

Compreendia-o. Compreendo-o até hoje, pois fui um pouco assim em boa parte da vida, herança da convivência.

Ficar ali quase estático era sobrecarga incomum para um homem que sempre fora ativo e multifário, inimigo da indolência. Viver ou sobreviver àquele modo era dolorido. Doía também em nós.

Irrequieto por natureza, pai de família, amante da leitura e incapaz de maltratar um animal, difícil saber muito mais sobre o que se passava em sua cabeça.

Bem diferente do que fora sempre, não tinha muito a oferecer. Antes, para tudo tinha solução própria. Era nosso “MacGyver, aquele personagem de uma série de TV (Profissão: Perigo) dos anos 80, que com astúcia e engenhosidade era capaz de resolver qualquer problema utilizando a inteligência, mãos e alguma ferramenta tosca, de um canivete a pedaço de arame.

Guardo até hoje um par de chinelões em couro que, imprestável aos meus olhos, ele refez. Aquela cadeira à mesa de refeições que seria trocada, ganhou reparo com o talento de um artesão. A cisterna com rachadura, o telhado em goteiras, o fogão sem chamas em uma das bocas, a TV que teimava em subtrair a imagem de nós – tudo era solucionado por sua ação e espírito inventivo.

MacGyver. Nosso Chico.

Cheirava e beijava sua cabeça, agradecido por tudo. Cada peia, inclusive. Foram raríssimas. Acho que só essa mesma da cinturãozada. Se houve mais, por favor, não precisa ninguém lembrar. Eu esqueci.

Até seu orgulho de mim, era comedido. Mas eu sabia que o tinha. Aprendi a dizer-lhe “te amo!” antes da partida. Fiquei leve. Ficamos. Sorríamos do nosso jeito.

Mesmo com aquele ar ensimesmado, sem natureza ou tato para agrados físicos, tinha um zelo incomum por nós e retidão de caráter. Até o bichano “Pimpolho”, membro do clã, sabia disso. A propósito, recebia dele cuidado especial e tinha o poder de lhe provocar raros sorrisos.

Explorava-o, que se diga. Tirava-o do sério, mas não da serenidade. Chegava a forçá-lo a abrir a porta ao quintal pela madrugada – após espetá-lo com as garras -, a fim de sair à esbórnia ou às necessidades mais primitivas.

Do meu quarto, quantas vezes não acompanhei os “diálogos” entre ambos? Daria um quadro de “Sitcom” (comédia de situação) de “A grande família”.

Faleceu no Hospital Wilson Rosado (HWR) em Mossoró, após dias de agonia.

Um pouco antes, meu irmão antecipou que nosso Chico estaria nas últimas. “Não vai durar muito mais”, alertou-me.

– Você quer vê-lo?

“Não. Vou guardar uma imagem dele sorrindo para mim, feliz com um beijo.”

(‘Que descanse em paz até nosso reencontro”) – complementei em pensamento.

Carlos Santos é editor do Blog Carlos Santos

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domingo - 14/04/2019 - 04:44h

Independência ou morte

Por João Pedro Cardoso Prudêncio

Era um dia normal. Ou melhor, uma madrugada normal. Nesse período do ano até o sol era preguiçoso, e nem os galos esperavam ele raiar para começarem sua cantoria. Mas eles não eram os únicos que acordavam para a música.

Dona Cândida também já cantarolava, baixinho, enquanto trespassava a cozinha a passos largos, mas graciosos evitando fazer barulho e acordar as crianças tão cedo da manhã. Ela precisava, no entanto, ser objetiva: o café da manhã não iria se preparar sozinho. Seu Joaquim já havia vestido seu calção e amarrava em torno de seu corpo aqueles restos de tecido que muitos anos antes talvez pudessem ter sido chamados de camisa.

A peça mais valiosa de seu vestuário, entretanto, era seu chapéu. Não que fosse pomposo ou mesmo funcional – era apenas um chapéu de palha curta, que, no entanto, o fazia lembrar de seu pai, quem muitas vezes ele viu sair de casa para trabalhar naquele mesmo horário.

O cardápio do café da manhã não era muito diversificado – a família vivia do que a terra e os bichos lhes davam. Era, ainda assim, muito caprichado. Não era sempre que Joaquim conseguia chegar em casa a tempo de almoçar com a família, então Dona Cândida se certificava que o marido saísse de casa com sustância.

O homem se sentava à mesa ao passo que a mulher colocava em seu prato o queijo e os ovos. Ainda não haviam trocado uma palavra sequer naquele dia, mas anos de convívio os havia levado a uma sincronia quase perfeita. Joaquim termina, beija a testa de sua esposa. Vai até o quarto das crianças e faz o mesmo com elas. Não havia tempo para esperar a comida descer, o sol já surgia no horizonte.

Seus bois já estavam a postos. As chuvas nessa época do ano eram frequentes, de forma que o mato era verde e as colheitas eram fartas. O gado estava gordo e forte, ideal para o trajeto longo e o carregamento pesado. Cada um dos bois tinha um nome. Eram quatro, mas o mais velho, Brutus, era seu animal de maior confiança.

O tempo e o trabalho não tinham sido piedosos com o animal, cujo pelo um dia já refletiu a luz do sol, mas hoje já era fosco e quebradiço. A carga que levavam variava muito, pois dependia da demanda da cidade e da colheita realizada. Hoje ele levava toras de madeira; o frio pedia por lareiras, o que tornava a lenha mais rentável. Joaquim terminou de equipar os animais e seguiu em direção à mata.

A vegetação alcançava seu joelho. O verde trazia alimento aos bois, mas também dava abrigo aos mosquitos. Joaquim já estava acostumado, sua pele espessa já não sentia mais as picadas. Descalço, também pouco se importava com as pedras íngremes ou os perigos da terra fofa. Até tinha calçado em casa, mas deixava para as crianças. Já conhecera o estrago que uma enxada imprecisa pode fazer, e prezava pela segurança dos menores.

Não era incomum para Joaquim encontrar outros como ele, afinal ele passava por uma importante rota comercial da região, mas os grupos maiores consistiam de dois ou três tropeiros. Hoje, no entanto, ele encontrou uma comitiva incomum: eram 6 homens, que ao invés dos convencionais cavalos utilizados pelos tropeiros para guiar os bois, montavam mulas carregadas. Pareciam vir de uma longa viagem. Vestiam todos roupas leves, mas um em especial que andava ao centro do grupo estava quase em trajes de dormir. Este se contorcia em cima da mula, parecendo sofrer de um desconforto intestinal.

Joaquim os observava passar na direção contrária, a distância. Em determinado momento a comitiva parou e um dos homens parecia ler um papel. O homem das vestes simples aparentava se esforçar para se concentrar na voz do mensageiro, mas sua cólica carecia, pelo visto, mais de sua atenção. A essa altura Joaquim já passava mais próximo do grupo, e neste momento o homem da carta a recolheu e o do centro de algum jeito conseguiu se endireitar sobre sua mula. Levantou o braço em que carregava sua garrafa dágua, pigarreou e falou em voz fraca:

– Independência ou morte!

Joaquim acelerou o passo. Não sabia do que se tratava essa tal independência, mas da morte ele queria passar longe.

João Pedro Cardoso Prudêncio é acadêmico de medicina

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domingo - 13/01/2019 - 08:52h

A noção de “estranhamento”

Por Honório de Medeiros

Camus, em seu “Diário de Viagem” (Record), lá para as tantas escreve o seguinte acerca de uma cena por ele presenciada no navio em que viajava para o Rio de Janeiro:

“Mais uma vez observo entre eles uma mulher já grisalha, mas de uma classe soberba, um belo rosto altivo e suave, (…) e uma postura sem par. Sempre seguida pelo marido, homem alto e louro, taciturno. Colho algumas informações, ela está fugindo da Polônia e dos russos para exilar-se na América do Sul. É pobre. Mas, ao vê-la, penso nas matronas bem vestidas que ocupam alguns camarotes de primeira classe.”

Fico fascinado com esse olhar que distingue, o olhar de Camus, mas não me deixo seduzir pelo fascínio da primeira sensação, a da percepção de um estranhamento que separa, de um lado, a soberba elegância de uma imigrante e, do outro, o trivial, o comum, o banal: as matronas da primeira classe.

Deixo-me seduzir, isso sim, ao constatar que o olhar é o instrumento que permite as ideias apreenderem essa distinção. A ideia é anterior ao olhar. Se assim não fosse o olhar nada constataria dessa distinção que Camus percebeu.

Em outro lugar, escrevi: “Na Retórica dos Objetos é fundamental a noção de “estranhamento”. É por intermédio do “estranhamento”, um primeiro passo, que passamos a compreender os objetos, as coisas, as ideias, o Ser, enfim.”

E o que seria o “estranhamento”?

Eis algo difícil de conceituar, tal como a liberdade.

Sabemos o que esta é, mas não sabemos dizer com propriedade o que ela é. Em certo sentido “estranhamento” é uma desarmonia em relação ao padrão comum. Tal qual em uma arte marcial refinada, na literatura ou pintura, por exemplo, tornar-se hábil em captar essa desarmonia que extrapola o lugar-comum demanda contínuo exercitar-se até o limite do impossível.

Recordemos o exemplo acima. Para alguém acostumado a perceber o que lhe cerca, a organização limpa, meticulosa  e peculiar da biblioteca de alguém chama a atenção por fugir do padrão comum.

Ao conectar essa constatação com a que resulta do “perceber” os restantes dos objetos espalhados pelo ambiente, torna-se possível fazer algumas inferências, ou elaborar algumas hipóteses, para sermos mais precisos, acerca da personalidade do seu proprietário.

Em episódio bastante interessante da série norte americana “The Mentalist”, agentes do FBI buscam, em uma sala, uma câmera de vídeo escondida. As outras já foram encontradas e estavam postadas em lugares óbvios.

O personagem principal, Patrick Jane, ao ser introduzido na sala, observa que um determinado espelho estava colocado em uma altura um pouco acima do normal. Levanta-se o espelho e lá está a câmera procurada. A sensação de “estranhamento” permitiu a localização imediata da câmera procurada.

Em outro episódio, esse bastante conhecido na literatura policial, Sherlock Holmes chama a atenção de Dr. Watson para o cão da propriedade onde acontece a investigação. Dr. Watson retruca informando que o cão não latiu. Sherlock pondera, então: “por isso mesmo”.

Ou seja, Sherlock vivenciou, também, essa sensação de “estranhamento”.

Essa capacidade de sentir a sensação de “estranhamento”, e, em seguida, abstraí-la, racionaliza-la, é, penso eu, a base do trabalho, dentre outros dos artistas, filósofos e cientistas.

Outro exemplo, pinçado da literatura, explica melhor a teoria acima:

“Enquanto se movimentavam pela pista, ele estudou o marido com olhos profissionais, de caçador tranquilo. Estava acostumado a fazê-lo: esposos, pais, irmãos, filhos, amantes das mulheres com quem dançava. Homens, enfim, acostumados a acompanhá-las com orgulho, arrogância, tédio, resignação e outros sentimentos igualmente masculinos. Havia muitas informações úteis nos alfinetes de gravata, nas correntes de relógio, nas cigarreiras e nos anéis, no volume das carteiras entreabertas diante dos garçons, na qualidade e no corte do paletó, nas listras de uma calça ou no brilhos dos sapatos. Até mesmo na forma de dar o nó na gravata. Tudo dera material que permitia a Max Costa estabelecer métodos e objetivos ao compasso da música; ou, dizendo de modo mais prosaico, passar de danças de salão a alternativas mais lucrativas.” (O Tango da Velha Guarda; Arturo Pérez-Reverte).

Honório de Medeiros é professor, escritor e ex-secretário da Prefeitura do Natal e do Governo do RN

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domingo - 06/01/2019 - 07:14h

Nunca vamos ficar ricos

Por Marcos Piangers

Uma amiga minha, a Bia, decidiu trabalhar só meio período depois que o filho nasceu. Quer participar de cada momento. “Mas, Bia, assim você não vai ficar rica nunca!”, alertou um amigo. É verdade.

A Bia ganha menos dinheiro. Mas eu conversei com ela esses dias e ela estava mais feliz que o Bill Gates.

No almoço um colega do trabalho disse que não vai aceitar uma promoção. Quer continuar com as manhãs livres, curtindo a filha. “Não vale a pena”, ele disse. Está certíssimo: entre abraçar todos os dias de manhã uma menina linda de pijama ou mais quinhentos reais na conta, com qual você ficaria?

Tem vezes que a promoção não paga nem a creche que você vai ter que contratar. Tem vezes que não paga nem a gasolina.

Participar do crescimento dos filhos tem uma série de vantagens, para crianças e adultos.

Eles aprendem mais rápido, se desenvolvem com mais confiança. A gente libera um monte de hormônios de prazer, por estar por perto de coisas fofas que dão risadas deliciosas. Vivemos mais felizes, menos estressados, o coração batendo que é uma beleza.

“Mas você precisa investir na sua carreira”, dizem alguns, e eu concordo com isso. Todos os dias, depois de fazer minhas filhas dormirem, volto pro computador pra trabalhar. Estou escrevendo este texto às 04:29 da madrugada de um feriado.

O que eu fiz foi uma lista de prioridades, família no topo, e tudo aquilo que dava pra dizer não eu fui dizendo. Não me arrependo.

Um dia eles vão crescer. Vão querer saber só de amigos, de amores.

Teremos tempo pra ler, fazer  um curso, abrir um negócio. Pode ser que a gente nunca fique rico, é verdade. Mas tanta gente trabalha como condenado e também não fica.

O nosso tesouro a gente sabe onde está.

Marcos Piangers é jornalista, radialista, palestrante e autor do livro “O Papai é pop”

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domingo - 06/01/2019 - 06:24h

Obrigado, pai!

Por Sérgio Chaves

Esse da foto é o meu pai! Não o meu pai biológico, esse eu perdi há 42 anos, mas o que terminou de me criar.

Ele é de Currais Novos, morava em São Paulo e veio para Natal ser padrinho de casamento do pai, viúvo, que ia se casar de novo.

Minha mãe foi madrinha da noiva, divorciada, amiga da antiga Escola Técnica Federal do RN (ETFRN).

E foi assim, em um casamento, que eles se encontraram. Ele solteiro. Ela viúva com quatro filhos.

Namoraram e se conheceram em 30 dias, tempo das férias dele.

Ele tendo que voltar para São Paulo, pediu à ela três meses, tempo suficiente para encerrar a vida dele por lá e voltar. Três meses depois ele voltou e não saiu mais de nossas vidas.

Depois que casaram, minha mãe perguntou se ele queria ter filhos e ele respondeu: “Denise, para que mais filhos? Eu acabo de ganhar quatro”.

Chagas era na dele, não se metia em nossos espaços, mas sempre estava ali, prestando atenção, opinando se necessário, servindo a todos que necessitavam de sua ajuda, rindo de nossas alegrias, sofrendo com nossas derrotas e vibrando e comemorando nossas vitórias.

Nos últimos 37 anos fomos seus filhos, sim! E ele foi o nosso pai!

Meus sobrinhos o chamavam de vovô!

Ele teve netos! E bisneta!

Chagas nos devolveu algo que pode não parecer importante para muitos, mas essencial para nós: a unidade familiar.

E nós demos a ele uma família inteira! Hoje, ele nos deixou após mais de um ano lutando contra um CA, mas nos deixa um legado imenso e, principalmente, a certeza de que não entramos na vida de ninguém por acaso.

Obrigado Chagas, por tudo!

Obrigado, pai!

Vá em paz e siga seu caminho com a certeza de que aqui, todos somos e seremos gratos sempre por sua existência!

Sérgio Chaves é jornalista

*Foto: Cláudio Roberto.

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segunda-feira - 31/12/2018 - 10:51h
Crônica

Monólogo da gratidão

Aviso-lhe de antemão: essa não é uma mensagem de Feliz Ano Novo!

É o monólogo de alguém grato.

Agradecido pelas ingratidões;

Agradecido pelos fracassos;

Agradecido pela minha incompetência;

Agradecido pelas injustiças;

Agradecido por não ser o ingrato;

Agradecido por não transferir a ninguém a culpa por minhas derrotas;

Agradecido por não alimentar recalque ou inveja por minha inapetência para o ter;

Agradecido por não ser algoz nem querer me vestir de herói, vítima ou mártir.

Feliz por começar um Ano Novo sendo aquele sujeito de sempre: fechado nas selfies, aberto para o mundo;

Feliz por ter um pedaço de mim em alguns poucos e guardar comigo o muito de todos eles;

Feliz por uma história que não me cansou ainda;

Feliz por sorrir (às vezes) e chorar (baixinho, sempre).

Venturoso.

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domingo - 02/12/2018 - 07:08h

Prontuário de meu pai

Por Fabrício Carpinejar

Meu pai, 79 anos, estava com pressão alta e o levei para a emergência do hospital. Ele foi conduzido para enfermaria e fiquei com o seu celular e a sua carteira. Na doença, não existe posses. Era o seu responsável pela primeira vez na vida.

Precisava preencher o prontuário médico. A atendente me alcançou a folha alertando que se tratava de perguntas simples. Peguei a caneta e mordi a tampa, em vez de deslizar a tinta na página.

– Biotipo sanguíneo?

Eu não sabia.

– Alergia a medicação?

Eu não sabia.

– Já teve sarampo, caxumba, catapora?

Eu não sabia.

– Realizou alguma cirurgia?

Eu não sabia.

– Vem usando medicação?

Eu não sabia.

Vi que eu não conhecia o meu pai. Ele que me conhecia de cor e teria facilidade em preencher qualquer ficha a meu respeito.

Mesmo possuindo quatro décadas e meia de oportunidades, o pai surgia como um desconhecido íntimo. Um anônimo. Eu não me esforcei em descobrir quem me cuidava durante todo esse tempo. Nossa relação foi uma via de mão única.

Terminei reprovado no teste de filho. Deixei o teste em branco, para o meu constrangimento. A atendente tentou disfarçar o desconforto: “Depois perguntamos para ele”.

O prontuário médico tornou-se o meu obituário filial. Eu me dei conta de que nunca me preocupei em desvendar quem habitava a função “pai”, em determinar as suas escolhas, em revelar a pessoa atrás da roupagem familiar.

Meu pai veio com uma encomenda pronta quando nasci, e jamais desfiz o embrulho para buscar o que havia dentro. Não desfrutava de condições de responder nada por ele, pois o reconhecia como eterno provedor, uma fortaleza inexpugnável, onde me socorria em caso de necessidade. Só eu pedia ajuda, não ajudava. Só eu cobrava afeto, não devolvia. Só eu esperava recompensas, não observava também a sua carência e sua fragilidade.

Não questionei o que ele viveu antes de mim. Não sabia se ele teve cachorro, qual o nome, se ele sofreu com a perda do mascote, se sofria castigo na infância, qual o seu melhor amigo, se dançava nas festas da escola ou permanecia encostado na parede, se nadava, se andava de bicicleta, qual a carreira que sonhou, qual o seu pior trauma, qual a sua maior felicidade, se içou pandorga, se pescou, se participou de acampamento, com o que brincava, se jogava futebol, qual a sua posição, se terminava como goleiro por não fazer gol, se dividia o quarto com os irmãos, com qual idade começou a ler e a escrever.

Eu simplesmente me conformei em ser o seu filho, jamais fui seu amigo.

Fabrício Carpinejar é jornalista, poeta e cronista

* Texto originalmente publicado na revista Donna.

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domingo - 02/12/2018 - 05:46h

A Festa de Santa Luzia em outros tempos

Por Odemirton Filho

As festividades religiosas em louvor aos santos padroeiros há muito é uma tradição nas cidades brasileiras, sobretudo, interioranas.

Aqueles que professam a religião católica veneram os santos de sua devoção, em uma mistura de fé e tradição histórico-cultural.

Em Mossoró não é diferente. Todo dia 03 de dezembro a cidade começa a celebrar as festividades de sua padroeira, Santa Luzia, estendendo-se até o dia 13, com a procissão que reúne milhares de fiéis.

Porém, o que me vem à memória, é a Festa de Santa Luzia de outros tempos.

O período da festa, por coincidir com o período do Natal, sempre envolveu uma certa magia.

Era o momento de vestir a melhor roupa, assistir às novenas e caminhar na rua defronte à Catedral.

Era, e ainda é, naquela rua e nas cercanias, que se desenvolve a maioria das atividades da festa, como barraca de comidas típicas, barracas de jogos recreativos e vendedores de outras cidades.

Quando criança o que me interessava era atirar com espingarda para acertar e ganhar algum brinde, jogar argolas entre objetos, ou ficar entre as barracas que dispunham das mais variadas brincadeiras.  Era o lúdico que me fazia atraído pela festa.

No aspecto religioso, admirava-me as senhoras que, com o rosto coberto e com o terço entre as mãos, devotam sua fé na Santa protetora dos olhos. Uma religiosidade simples, sem adorno.

Sobre o altar, as novenas celebradas ou concelebradas, pelo Bispo Dom José Freire de Oliveira Neto, com seu semblante sisudo, que impunha respeito.

Gostava de saborear as comidas típicas que minha tia, Socorro de “Puca”, levava para vender.

Os leilões, de igual modo, faziam-me ficar vidrado naquela disputa de lances para arrematar os brindes.

O concurso, “A mais bela voz”, era o momento de escutar talentos da terra e da região. À época não se encenava o Oratório de Santa Luzia.

Na adolescência, o bom era passear pela rua da Catedral, “de ponta a ponta”, com familiares e amigos e à procura de alguma paquera da juventude. Cansávamos de percorrer várias vezes o percurso.

Eram dias intensos. Praticamente todas às noites íamos participar de algum movimento ou, simplesmente, andar sem compromisso. O importante era estar na festa.

No dia da procissão, ficar nas esquinas ou, às vezes, acompanhar todo o trajeto, observando os milhares de fiéis. Alguns andavam com os pés descalços. Senhoras e crianças vestidas com os trajes de Santa Luzia. Outros caminhavam com pedras sobre as cabeças. Ainda hoje é assim. Tudo em nome da fé.

Certa feita, o grupo de escoteiros do qual fazia parte, ficou incumbido de fazer a proteção do andor de Santa Luzia. Ao final da procissão, chegando à Catedral, a multidão queria tocar à imagem e, ainda adolescentes, quase fomos “esmagados” pelos fiéis.

Já adulto, acompanhando meus filhos, refiz, ano a ano, toda essa tradição religiosa-cultural que pertence à nossa terra.

Hoje, devido ao crescimento da cidade e à violência desenfreada, a festa já não é mais a mesma. Para mim, falta algo. O quê? Talvez a ingenuidade da infância ou os arroubos da adolescência.

Por fim, de todas as lembranças, a que mais ecoa em minha memória é a voz inconfundível do saudoso Monsenhor Américo Vespúcio Simonetti:

“Mossoró com alegria!”

“Saúda Santa Luzia”!

Odemirton Filho é professor e oficial de Justiça

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sexta-feira - 09/11/2018 - 11:18h
Perda

Grande Chico!

Perdi uma pessoa querida. Morreu “Chico”; simplesmente Chico para mim. “Grande Chico”, era minha saudação sempre que o via com aquele ar amistoso e braços abertos a me acolher.

Era o “Chico vigia”. Mas não era apenas isso, sejamos sincero. Era amigo para me receber à porta do Cândidu’s Restaurante em Mossoró, com uma alegria contagiante: sorriso largo e um bem-querer sem tamanho.

Ostentava aquela pose litúrgica de chefe do “Departamento de Segurança” do estabelecimento, cargo vitalício outorgado por mim.

– Grande Carlos Santos – exclamava à minha chegada.

– Perigoooso! – emendava com uma gargalhada que nos remetia a um embaraço em que ele me metera há incontáveis anos. Virou motivo de graça e código quase secreto entre nós.

“Queremos muito bem a Chico. É da nossa família”, diziam-me Oscar, Samuel e Elano – filhos de Francisco Cândido e Rosália, comandantes supremos e plenipotenciários desse restaurante tradicionalíssimo de Mossoró e do RN.

– Os ‘minino’ de Chico ‘Câindo’ são danado (sic) – trovejava aqui e acolá para meu deleite, como se as travessuras fossem rituais meritórios. Tinha razão. Oscar, Samuel e Elano aprontaram demais com ele. Não faltam histórias hilariantes. Minto, meninos?

Com 72 anos completados no último dia 23 de agosto, Chico (Francisco Soares de Amorim) pedalava sua bicicleta na direção de casa pela Avenida José Damião no bairro Santo Antônio, no último dia 26, quando foi atropelado por um veículo. Era algo em torno de 14h.

O responsável (?) saiu em fuga, sem lhe prestar socorro. Teve fratura de fêmur e passou por cirurgia.

Nessa quinta-feira (8), Chico faleceu no Hospital Regional Tarcísio Maia (HRTM). Sofreu parada cardíaca irreversível.

Seu velório é no Centro de Velório Sempre, à rua Melo Franco 197, Doze Anos, próximo ao Tiro de Guerra. Sepultamento acontecerá às 16h no Cemitério Velho.

Valeu, Chico!

* O print constante desta postagem é reprodução do meu Instagram pessoal, datado de 22 de julho deste ano.

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