domingo - 15/09/2024 - 09:26h

O que somos?

Por Odemirton Filho

Lembranças (Foto: Getty Images)

Lembranças (Foto: Getty Images)

Afinal, somos aquilo que pensamos, amamos, realizamos. E eu acrescentaria: somos aquilo que lembramos”.

A frase foi dita pelo filósofo Noberto Bobbio, no seu livro O Tempo da Memória. Somos, decerto, uma construção de tudo isso; uma construção inacabada, diga-se. Passamos tão rapidamente pela vida que não conseguimos concluir os nossos planos. Pensamos mais do que realizamos, pois ficamos presos as amarras dos nossos medos.

Sair da zona de conforto ficou para poucos, nem todos conseguem abrir as grades que aprisionam os sonhos; o novo sempre causa receio. Vislumbramos o horizonte, mas, muitas vezes, não conseguimos navegar até lá. Parece distante. E, por diversas vezes, o é.

Vez ou outra converso com alguém que vive a lamuriar, sempre colocando a culpa no destino. Todavia, não faz uma autorreflexão. Conquanto, saibamos que nem todos têm as mesmas oportunidades no decorrer da vida. Por que estou nessa situação? Às vezes, você tem a resposta. Continuar a fazer tudo do mesmo jeito não modificará coisa alguma. Pensar e sonhar, sim. Entretanto, é preciso “colocar a mão na massa”.

Até o amor precisa ser alimentado para não morrer de inanição. Os relacionamentos, de qualquer tipo, precisam de um sopro na brasa que ainda arde. Do contrário, o fogo se apaga lentamente. Doutro lado, como sabemos, o homem também nutre sentimentos deletérios, não somente semeia o amor. Cultiva o ódio, a inveja, a ganância, a arrogância. Infelizmente.

Sobre sonho e realidade, deixo consignado as palavras do bruxo do Cosme Velho:

– “a realidade não será sempre tal qual a sonhamos. Mas isto mesmo é uma harmonia na vida, é uma grande perfeição do homem. Se víssemos logo a realidade como ela há de ser, quem daria um passo para ser feliz?

E mais: aqui ou acolá eu encontro um dos muitos leitores deste Blog, e alguns me indagam por qual motivo escrevo sobre fatos pretéritos. Respondo-lhes que, ao escrever sobre tempos idos, procuro revisitar bons momentos. Os ruins? Tento esquecer, pois somos aquilo que lembramos, diz Bobbio.

O que somos? Quem dera saber.

“Somos quem podemos ser, sonhos que podemos ter”.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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Categoria(s): Crônica
domingo - 08/09/2024 - 06:22h

O Porto Franco

Por Odemirton Filho

Embarque de sal ensacado no Porto Franco, em 1940 (Reprodução do Baú de Macau)

Embarque de sal ensacado no Porto Franco, em 1940 (Reprodução do Baú de Macau)

Sempre tive a curiosidade de conhecer a história do Porto Franco. Encontrei algumas notas em relação à sua criação e localização, e de como foi vital para a economia da nossa região. Fiz a minha pesquisa lendo alguns historiadores locais, sobretudo Geraldo Maia e Francisco Fausto de Souza. Às vezes, em minhas diligências lá na cidade de Grossos, indago a algumas pessoas sobre o Porto Franco, contudo, não consigo informações detalhadas, a maioria até desconhece. Felizmente, nesses tempos de internet, temos o conhecimento ao alcance de nossas mãos.

Segundo consta, coube ao comerciante suíço Ulrich Graff à concessão por parte da então Província do Rio Grande do Norte, em 1875, para a construção de uma linha de ferro, ligando Mossoró a Petrolina. À época, o transporte de mercadorias era feito por meio de tropas de burros. Todavia, por falta de recursos financeiros, o comerciante não conseguiu concretizar o empreendimento.

Cabe uma nota sobre o comerciante suíço: foi por meio do vigário Antônio Joaquim, com sua influência, que se generalizou pela província, a vinda para Mossoró do capitalista João Ulrich Graff, chefe da firma J. U. Graff & Cia, com casas em outros lugares. Data daí, do estabelecimento dessa poderosa firma importadora e exportadora, a grande comercial de Mossoró, que dantes fazia suas provisões de Aracati. Visionário, o comerciante tentou dar impulso as suas atividades e ao comércio local, pois uma linha de ferro certamente daria celeridade ao fluxo de mercadorias importadas e exportadas.

Entretanto, somente em agosto de 1912, com a Companhia Estrada de Ferro de Mossoró S.A, pelo trabalho da firma Sabóia de Albuquerque & Cia, iniciou-se a construção da linha férrea. Em 19 de março de 1915 foi inaugurado o primeiro trecho, ligando o Porto Franco (atualmente a cidade de Grossos), em Areia Branca, e Mossoró.

De acordo com o historiador Geraldo Maia, “quando a locomotiva “Alberto Maranhão” chegou à Estação, foi recebida com aplauso.  Na plataforma do carro-chefe da composição, viajavam: João Tomé de Sabóia, Cel. Vicente Sabóia de Albuquerque, Farmacêutico Jerônimo Rosado, Camilo Filgueira, Rodolfo Fernandes, Cel. Bento Praxedes, Vicente Carlos de Sabóia Filho, além do mais velho habitante da cidade, o Sr. Quintiniano Fraga, que ostentava o pavilhão nacional. Aquele 19 de março foi realmente uma data muito importante para Mossoró”.

O periódico O Comércio de Mossoró registrou: “Toda a população correu à estação: eram homens, mulheres, meninos, de todas as classes e de todas as idades. O trem entrou grave e solene, devagar para não atropelar o povo que se apinhava ao longo da estação, saudando-o, vibrando”.

Não sei ao certo, mas lembro que ainda criança, talvez, lá pelo final dos anos setenta, início dos anos oitenta, eu fui no trem até a cidade de Sousa, na Paraíba. Há fatos de nossas vidas que marcam, ficam guardadas na memória, e eu tenho um fio de lembrança daquele dia.

No tocante ao comércio com a cidade de Areia Branca, o historiador Francisco Fausto de Souza, no seu livro sobre a história de Mossoró, descreveu: “as comunicações terrestres, ora são feitas por intermédio de Porto Franco, ponto inicial da estrada de ferro Mossoró, ou estradas carroçáveis entre os municípios de Açu e Mossoró”. Produtos como o sal, algodão, mandioca, cana-de-açúcar, entre outros, iam e vinham do Porto Franco.

Permita-me ressaltar um fato histórico:

“Durante a República Velha no estado do Rio Grande do Norte, as matérias-primas como o sal e o algodão foram os produtos de maior peso e valor monetário na pauta das exportações, acompanhado pelo açúcar e pela cera de carnaúba. Nesse período, as disputas econômicas entre o Rio Grande do Norte e o Ceará culminaram em disputas territoriais. Como no estado havia muitas terras com potencial salineiro, e mediante a proibição de Pernambuco na fabricação de carne seca em 1788, enfrentamos uma grande perda na economia norte rio-grandense. Entretanto, o Ceará que poderia continuar fabricando esse produto de “Aracati para o norte”, precisava da matéria-prima do sal e reivindicou as terras de Grossos (RN) ricas em salinas. Assim, iniciou-se à época a delimitação entre os estados do Rio Grande do Norte e o Ceará, desembocando numa refinada discussão jurídica acerca dos limites e fronteiras territoriais entre o RN e o CE. Em 1901 algo sobre a questão de limites foi publicado pelos jornais potiguares, quando A República fez pela primeira vez menção ao conflito”. (extraído do livro 130 anos do TJRN: do papel à Justiça 4.0).

Por fim, sobre o Porto Franco, eu li que a Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN) e a Prefeitura Municipal de Grossos firmaram uma parceria, num projeto que resgata a história do Porto; o objetivo seria a confecção de uma cartilha, a fim de ser trabalhada com os alunos da rede municipal de ensino. Espero que a parceria tenha rendido frutos, pois conhecer o passado é fundamental para se entender o presente.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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domingo - 01/09/2024 - 08:42h

Ao som dos Paralamas do Sucesso

Por Odemirton Filho

Reprodução (capa do livro de João Barone)

Reprodução (capa do livro de João Barone)

O domingo deve ser um dia leve. Os leitores, creio eu, gostam de uma leitura singela, que traga bons sentimentos e boas lembranças. Por isso, deixemos de lado, por ora, as regras eleitorais e o intolerante debate político-partidário. Falemos um pouco sobre o que vivi no junho de minha vida e que, talvez, você também tenha vivido. Enfim, “falemos ao coração dos homens”.

Estou lendo o livro do baterista João Barone, da banda Os Paralamas do Sucesso. O livro resgata o início dos Paralamas, na visão de Barone. São muitas histórias interessantes, principalmente para quem é fã. Pra quem não sabe, “Vital e sua moto” foi o primeiro grande sucesso; Vital era o baterista da futura banda.

O grupo foi contemporâneo, entre outros, de Kid Abelha, Titãs, Legião Urbana, Blitz. Isso lá pelo início dos anos oitenta. Lulu Santos já era um artista consagrado, e foi um dos “padrinhos” dos Paralamas. O cantor Lobão, com o seu temperamento forte, teve um entrevero com a banda. A década de oitenta, como se costuma afirmar, foi o auge do Pop Rock nacional.

De acordo com Barone, a música Lanterna dos Afogados foi inspirada no livro de Jorge Amado, Jubiabá. Lanterna dos Afogados é um bar fictício na região portuária de Salvador, onde as castas da sociedade se encontram e as esposas dos pescadores aguardam o regresso de seus amados.

A leitura do livro sobre os Paralamas despertou a minha memória afetiva, as lembranças da minha juventude. Eu e alguns amigos estávamos na primavera dos nossos dias, e saíamos pelas noites de Mossoró. Uma Mossoró ainda com ares de cidade do interior. Barzinhos? Contavam-se nos dedos. Festas? Vez ou outra.

Então, fazíamos as nossas programações. Andávamos no Chevette vermelho do nosso querido e saudoso amigo, Márcio Iuri. Aqui ou acolá, após muito “moído”, eu conseguia dar uma voltinha no carro do meu pai. Tempos depois, eu dirigia um Fiat 147, “me achando”.

Ouvíamos as músicas das bandas no som dos nossos “potentes” carros, com equalizadores e fitas cassetes. O som não era lá essas coisas, mas sobravam a alegria e os arroubos da juventude. Quem, na adolescência, não andou em carros lotados de amigos? Quem não fez uma cotinha pra comprar um litrão de bebida? Foi um tempo bom das nossas vidas, porque, alguém já disse, que de todos os animais selvagens o homem jovem é o mais difícil de domar.

Íamos ao Burburinho, um barzinho “descolado”, ao Meca shopping, ao Imperial, a uma boate que ficava em cima da padaria 2001; além das festas na AABB, ACDP e no Realce. Quem viveu essa época deve lembrar das vaquejadas no Puxa-boi. Eram comuns as festinhas nas casas de colegas do colégio, ou nas casas de colegas dos colegas.

Se o webleitor é de um tempo mais longínquo, lembrará dos carnavais do clube Ipiranga e da ACDP; da boate Snob, de Tony Drinks, do Ferrão. Mergulhe em sua memória, e brotará do coração boas lembranças, pois faz um bem medonho a alma.

Pois é, no último mês de janeiro fui ao show dos Paralamas, em Natal. A cada música que Herbert Vianna, Bi Ribeiro e João Barone tocavam, eu viajava nas lembranças da minha adolescência; e bebia mais uma dose, ao som de suas inesquecíveis canções. Tempo bom, onde a juventude vivia longe, muito longe das preocupações.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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domingo - 25/08/2024 - 11:46h

Judicialização das campanhas eleitorais

Por Odemirton Filho

Arte Ilustrativa da Web

Arte Ilustrativa da Web

Virou regra. Agora, as campanhas eleitorais são sempre judicializadas. Aliás, não é de hoje, já faz algum tempo que vem assim. A judicialização se inicia bem antes, quando da pré-campanha, com o ajuizamento de representações por propaganda fora da época permitida, objetivando sustar a propaganda e a aplicação de multa ao infrator.

As assessorias jurídicas se desdobram para cumprirem os prazos eleitorais, que são exíguos. Há várias Resoluções do Tribunal Superior Eleitoral que precisam ser estudadas pelos advogados, além da legislação vigente. As ações mais corriqueiras são a representação por captação ilícita de sufrágio, a velha compra de votos, a Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) por abuso de poder político, econômico e dos meios de comunicação e a Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME), por abuso de poder, corrupção ou fraude.

Ademais, logo após o pedido de registro de candidaturas, é comum o ajuizamento da Ação de Impugnação de Registro de Candidatura (AIRC), com base na ausência de uma condição de elegibilidade ou na ocorrência de uma causa de inelegibilidade. São partes legítimas para o ajuizamento das referidas ações os partidos políticos, os candidatos e o Ministério Público Eleitoral.

É claro que algumas dessas ações ajuizadas por partido político ou candidato são temerárias, infundadas. São protocoladas, muitas vezes, apenas para criar um fato político-eleitoral, na tentativa de desestabilizar a candidatura adversária. Caberá a Justiça Eleitoral processar e julgar essas ações, julgando-as procedentes ou improcedentes, aplicando, se for o caso, multa por litigância de má-fé.

A competência para processar e julgar as ações é do juiz Eleitoral em primeira instância; havendo recurso, o julgamento caberá ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE/RN), em segunda instância e, como última instância, o Tribunal Superior Eleitoral. Existem prazos que devem ser observados pelas partes, além de inúmeros processos para serem julgados, o que poderá demandar um bom tempo para o desfecho das ações. Até lá, o candidato poderá fazer a sua campanha, por sua conta e risco. Ou seja, o candidato pode ganhar a eleição, ser diplomado, empossado, e não concluir o seu mandato eletivo, ocasionando-lhe um sensível prejuízo político e financeiro.

Ressalte-se, que nessa época de redes sociais, na qual as fakes news inundam o mundo virtual, os candidatos devem saber usar as redes com cautela, pois a Justiça Eleitoral está atenta. É verdade que os discursos de ódio, as mentiras, a agressividade e a intolerância ganharam força nos últimos tempos. Contudo, o radicalismo sempre marcou nossas campanhas, sejam em nível nacional, estadual ou municipal. Vejam a agressividades dos debates na televisão entre os candidatos, é quase um ringue, em vários momentos, sequer, usam-se luvas.

Em arremate, cabe dizer: não é só alguns candidatos que viciam o processo eleitoral. Muitos eleitores estão acostumados a votarem somente quando recebem algum “presente” em troca do voto, sob a justificativa de que é o momento para conseguirem algo dos políticos. Estão mentindo? Pois é, essa sempre foi a realidade de nossas campanhas. Ponto. O debate propositivo, que realmente interessa, é de somenos importância. Infelizmente.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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domingo - 18/08/2024 - 07:28h

O último abraço

Por Odemirton FilhoAbraço

A queda de um avião em Vinhedo (SP), no último dia 9, ceifou a vida de sessenta e duas pessoas, interrompendo sonhos e cobrindo o Brasil de luto. Eram pessoas de todas as idades que não voltaram para as suas famílias, pois partiram para outro plano e deixaram saudades no coração dos seus. Um abraço apertado, um sorriso, um beijo carinhoso, uma lágrima, quantas lembranças devem estar no coração dos familiares e amigos.

Imaginemos os filhos a esperarem os seus pais; os pais a esperarem os seus filhos. Maridos e mulheres ansiosos pelo retorno do(a) companheiro(a). Quando ocorre uma tragédia dessa proporção há um enorme sentimento de pesar, diante do impacto por tantas vidas perdidas de uma só vez. Embora tenhamos a morte como certeza, pois a “única conclusão é morrer” – diria Álvaro de Campos, heterônimo do poeta Fernando Pessoa.

Claro que os órgãos competentes irão apurar os fatos e, se ao final da investigação, houver culpados, que sejam responsabilizados na forma da lei. Entretanto, nada aplacará a dor de quem ficou. Nenhuma indenização, por maior que seja, pagará o inestimável valor que aquelas pessoas tinham para os seus familiares. A saudade será uma companheira diária, uma vez que o tempo pode acalmar o coração, todavia, nunca conseguirá arrancar do peito o amor por aqueles que nos fazem falta.

Fico a pensar no filho que não aprenderá a andar de bicicleta com o seu pai; na mãe que não mais abraçará o filho. Os encontros em família não serão como outrora, sempre faltará alguém. E, aqui ou acolá, lágrimas descerão pelo rosto, porque o coração estará transbordando de lembranças e saudades.

O jovem casal não formará a sua família, não terão os filhos que tanto esperavam; a casa, comprada com tanto esforço, ficará vazia. Os sonhos sonhados foram desfeitos, pois só tinham razão de ser se fossem concretizados ao lado daquela pessoa.

Quantos abraços, beijos e sorrisos não foram trocados antes daquele fatídico voo? talvez, juras de amor. Mensagens por meio do aparelho celular foram enviadas, “eu chego já, te amo”.

Se eles soubessem que aquele momento seria o derradeiro, teriam dado um abraço mais apertado, um beijo mais demorado, teriam dito palavras nunca ditas. Eu sei que é um clichê, mas nunca é demais repetir que nenhuma demonstração de afeto deve ser deixada para depois, pois não sabemos quando será o último abraço.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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domingo - 11/08/2024 - 08:32h

Abuso de poder na campanha eleitoral

Por Odemirton Filho

Ilustração da Web

Ilustração da Web

A partir do dia 16 de agosto a propaganda eleitoral será permitida. Será o início da campanha eleitoral, podendo os candidatos “colocarem o bloco na rua” para tentar conseguir o voto do eleitor. A captação lícita do voto faz parte do processo eleitoral, pois é o momento de os candidatos mostrarem aos eleitores o que pretendem realizar, caso sejam eleitos para o mandato eletivo para o qual concorrem. O voto é a materialização da soberania popular, vez que todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representante eleitos ou diretamente, nos termos da Constituição Federal.

Porém, não é novidade que as campanhas eleitorais sempre foram pautadas pelo abuso de poder, seja econômico, político ou dos meios de comunicação, salvo, raras exceções. Os candidatos detentores de uma maior capilaridade financeira usam e abusam do poder para conseguirem os seus objetivos políticos-eleitorais, utilizando-se de toda sorte de meios para alçar o poder. Pois é, usufruir do poder deve ser bom demais.

Sobre o abuso de poder, enfatiza o jurista Adriano Soares da Costa: “não há negar que o poder econômico e o poder político influenciam as eleições (…) o ordenamento jurídico não pode amolgá-los (sujeitá-los), eis que são fatos sociologicamente apreendidos, frutos do convívio social e do regime capitalista por nós adotado. Nada obstante, embora não os possa proscrever (proibir) da vida, pode o direito positivo impor contornos ao seu exercício legítimo, tornando ilícito, e por isso mesmo abusivo, todo uso nocivo de poder econômico ou do poder político, que contamina a liberdade do voto e o resultado legítimo das eleições”.

José Jairo Gomes, consagrado eleitoralista, diz que o abuso de poder contribui para a formação de representação política “inautêntica e mendaz (falsa)”.

Tanto é que a Constituição Federal diz que o mandato eletivo poderá ser impugnado ante a Justiça Eleitoral no prazo de quinze dias contados da diplomação, instruída a ação com provas de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude. No mesmo sentido, a Resolução n. 23.735/24 do Tribunal Superior Eleitoral prescreve que o abuso do poder político evidenciado em ato que tenha expressão econômica pode ser examinado também como abuso do poder econômico.

Além disso, sabemos que as campanhas eleitorais são diferentes de tempos atrás. Hoje, as redes sociais são o caminho utilizado pela maioria dos candidatos. As fakes News, as montagens, o compartilhamento de notícias inverídicas e depreciativas contra o adversário inundam o mundo virtual. Existe candidato que sabe “aparecer” nas redes sociais, utilizando-se da mídia para construir a sua imagem. Em razão disso, a Justiça Eleitoral, conforme a sobredita Resolução, reza que o uso de aplicações digitais de mensagens instantâneas visando promover disparos em massa, com desinformação, falsidade, inverdade ou montagem, em prejuízo de adversária(o) ou em benefício de candidata(o) configura abuso do poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação social.

E mais: a utilização da internet, inclusive serviços de mensageria, para difundir informações falsas ou descontextualizadas em prejuízo de adversária(o) ou em benefício de candidata(o), ou a respeito do sistema eletrônico de votação e da Justiça Eleitoral, pode configurar uso indevido dos meios de comunicação e, pelas circunstâncias do caso, também abuso dos poderes político e econômico.

Existe, ainda, um aspecto que deve ser observado com redobrada atenção. Muitos candidatos, cientes que não ganharão a eleição por meio do voto, levam a eleição para um “segundo turno”, ajuizando inúmeras ações eleitorais contra o eleito. No decorrer da campanha conseguem juntar um robusto material probatório, como vídeos, mensagens, testemunhas e documentos, para subsidiarem ações Judiciais Eleitorais (AIJE), ações de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME) e Representações por captação ilícita de sufrágio (compra de votos); sem esquecer do Ministério Público Eleitoral que está atento a qualquer ofensa à legislação, sendo também parte legítima para ajuizar tais ações.

Assim, a depender das provas acostadas no processo e do entendimento da Justiça, determina-se a realização de eleições suplementares, de acordo com o Código Eleitoral: “a decisão da Justiça Eleitoral que importe o indeferimento do registro, a cassação do diploma ou a perda do mandato de candidato eleito em pleito majoritário acarreta a realização de novas eleições, independentemente do número de votos anulados”.

Portanto, caros candidatos e candidatas, evitem praticar abuso de poder econômico, político e dos meios de comunicação nas campanhas eleitorais, respeitando à legislação e seguindo as orientações de suas assessorias jurídicas.

Ou vale a pena colocar sub judice um eventual mandato eletivo?

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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Categoria(s): Artigo
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sábado - 10/08/2024 - 07:24h
De volta

A hora azul de Marcos Ferreira

Foto de Marcos Ferreira aos quatro anos de idade (Reprodução de acervo pessoal do autor)

Foto de Marcos Ferreira aos quatro anos de idade (Reprodução de acervo pessoal do autor)

Amanhã, outro domingo, o domingo 12 de agosto de 2024, a gente de novo vai se encontrar com cronistas, articulistas, colaboradores do “Nosso Blog” – batismo dado pela querida Naide Rosado, lá daquela lonjura do Rio de Janeiro-RJ.

De novo com eles:

Honório de Medeiros;

Bruno Ernesto;

Odemirton Filho;

Marcelo Alves.

Teremos mais. Uma penca dessa igualha.

Dia para recebermos de volta Marcos Ferreira, o poeta, o cronista, o contista, o romancista, o escritor, nosso amigo.

Domingo desses, finzinho do mês que arribou há pouco, ele escreveu a última crônica.

Nem dei o cabimento de ligar, me lamuriar e pedir-lhe com mãos postas e joelhos no chão, que retornasse. “Volte, Arlindo Orlando…”

Esperei. Sou psicólogo formado nessa sinuosa estrada da vida e cuido de muitos, a ponto de incontáveis vezes esquecer de mim mesmo.

Hora de aguardar o tempo de Marcos Ferreira, deduzi. Elementar, meu caro Freud.

Em “A bagaceira”, José Américo de Almeida (1887-1980) definia: “Ninguém se perde no caminho da volta, porque voltar é uma forma de renascer.”

Até amanhã, meu caro.

Acompanhe o novo Instagram do Blog Carlos Santos clicando @blogcarlossantos1

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domingo - 04/08/2024 - 12:00h

Participação dos candidatos em inauguração de obra pública

Por Odemirton Filho

TSE tomou decisão em votação apertada nessa terça-feira (Foto: Sérgio Lima)

TSE (Foto: Sérgio Lima)

Conforme a Resolução n. 23.735/24 do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) é proibido a candidata ou candidato comparecer, nos 3 (três) meses que precedem a eleição, a inaugurações de obras públicas. A inobservância sujeitará a infratora ou o infrator à cassação do registro ou do diploma. Já a realização de evento assemelhado ou que simule inauguração de obra pública será apurada na forma do art. 6º da Resolução, que reza que a apuração de abuso de poder em ações eleitorais exige a indicação de modalidade prevista em lei, sendo vedada a definição jurisprudencial de outras categorias ilícitas autônomas.

Como é sabido não é raro que os candidatos se aproveitem da inauguração de obras públicas para tentar captar o voto do eleitor. Aliás, era comum tempos atrás. Imagine o prefeito ou prefeita, candidatos à reeleição, que compareça a inauguração de uma obra de sua gestão. Haverá uma nítida vantagem em relação aos demais concorrentes ao pleito, pois o administrador terá o que mostrar aos eleitores.

Como ressalta o professor José Jairo Gomes: “muitas vezes, promessas são feitas. Um cenário maravilho é desenhado. Um futuro feliz e promissor é colocado em perspectiva, ao alcance de todos. Isso, é claro, se o governante em questão ou o seu afilhado político sagrar-se vitorioso nas urnas e for mantido na cadeira que ocupa”. A reeleição, creio eu, fez muito mal ao país, porquanto, alguns gestores usam e abusam da máquina pública, fazendo toda sorte de artimanhas para conseguirem ser reeleitos.

Assim, para evitar desequilíbrio na disputa, a legislação eleitoral proíbe o comparecimento. Ocorre que pode acontecer que o candidato compareça ao evento e não se coloque em posição de destaque, como, por exemplo, ficando sobre o palanque ou realizando discurso; poderá acontecer dos candidatos comparecerem de forma discreta, evitando a exposição demasiada. Nesse caso, como aferir que o comparecimento do candidato a uma inauguração de obra pública teve potencialidade para desequilibrar a disputa eleitoral?

Segundo a sobredita Resolução, para a configuração do ato abusivo, não será considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado da eleição, mas apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam.

Nessa toada, a jurisprudência do TSE admite a aplicação do princípio da proporcionalidade na representação por conduta vedada descrita no art. 77 da Lei nº 9.504/97, para afastar a sanção de cassação do diploma, quando a presença do candidato em inauguração de obra pública ocorre de forma discreta e sem a sua participação ativa na solenidade, de modo a não acarretar a quebra de chances entre os players (AgR-REspe nº 1260-25/SE, Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 5.9.2016; RO nº 1984-03/ES, Rel. Min. Luciana Lóssio, DJe de 12.9.2016; AgR-REspe nº 473-71/PB, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe de 27.10.2014).2. In casu, no exame do caderno probatório, o TRE, embora reconhecendo o comparecimento do candidato, assentou que a sua presença no evento se deu sem qualquer destaque que pudesse comprometer minimamente o equilíbrio do pleito, motivo pelo qual deixou de aplicar a sanção de cassação.

Já em outra decisão, afirma: “no que se refere ao desvio de finalidade das inaugurações de obras públicas (…) pelo erário municipal em evento patrocinado pela prefeitura em data próxima às eleições, o acórdão regional registra circunstâncias que evidenciam a gravidade das condutas, uma vez que a estrutura administrativa municipal foi utilizada para promoção pessoal e eleitoral do então prefeito e candidato à reeleição”. (REsp n. 37354).

Isto é, para a configuração da potencialidade lesiva o caso concreto dirá. Todavia, é de se indagar: qual o sentido de os candidatos comparecerem a inauguração de obra pública, sabendo do risco que correm? A meu ver é totalmente desnecessário.

Com efeito, é preciso que os candidatos observem as orientações de sua assessoria jurídica. Lembro-me que, há muitos anos, quando advogava na seara eleitoral para um determinado candidato, reiteradas vezes orientava em determinado sentido, porém, muitas vezes, ele seguia por caminho contrário. Ou seja, colocava em risco o seu futuro mandato eletivo perante a Justiça Eleitoral, em decorrência de alguma ação ajuizada pela prática de abuso.

Portanto, acautelar-se é a melhor atitude a ser adotada pelas candidatas e candidatos que disputarão o pleito municipal deste ano; em tempos de judicialização das campanhas           eleitorais é a melhor estratégia.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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Categoria(s): Artigo / Justiça/Direito/Ministério Público
  • Art&C - PMM - PAE - Outubro de 2025
domingo - 28/07/2024 - 07:40h

Mais um domingo sem futebol no Nogueirão

Por Odemirton Filho

Arte ilustrativa

Arte ilustrativa

Conforme Lupércio Luiz de Azevedo, no livro de sua autoria, Futebol de Mossoró, Pequenas Grandes Histórias, foi na administração do prefeito Antônio Rodrigues de Carvalho que houve a doação do terreno onde hoje se acha localizado o estádio Manoel Leonardo Nogueira, o nosso querido Nogueirão.

De acordo com Lupércio, “dois importantes acontecimentos se registraram a esta altura e que motivaram a certeza de que teríamos dentro em breve tornada realidade a aspiração maior dos mossoroenses: o primeiro foi a verba incluída no Senado e na Câmara Federal pelos nossos representantes Dix-Huit Rosado e Vingt Rosado (…), o segundo foi a doação, por parte do senador José Ermírio de Moraes, de quinhentos sacos de cimento, quando de sua estada entre nós, no dia 30 de setembro de 1963, atendendo apelo formulado pelos irmãos Dix-Huit e Vingt Rosado, ensejo que, entrando em contato com aquela autoridade, fizemos-lhe dramático apelo em favor das obras de nosso estádio, cujo atendimento foi de pronto e cuja entrega foi feita pelo Sr. Lauro do Monte Rocha”.

Outras pessoas também contribuíram para a concretização do sonho, como o capitão Jorge Duó, à frente da 3ª Companhia de Construção do Exército, bem como, Ernani Monteiro Ciarlini, responsável pela edificação e serviços de fundações.

Assim, consoante Lupércio, “estava pronto e o caminho livre para que, em 4 de junho de 1967, pudéssemos entregar ao povo de Mossoró o seu novo estádio de futebol, graças ao trabalho de muitos e esforço extremado de toda a Comissão Pró-Construção do Estádio”.

Pois bem, fiz esse resgate histórico para chegar aos dias atuais. Hoje, quando eu passo em frente ao velho Nogueirão bate um desalento. Não há mais jogos ou outro evento. O gramado, segundo fotos postadas nas redes sociais, encontra-se tomado pelo matagal. Aí, vem à mente os inúmeros jogos que fui com o meu filho para assistir ao clássico “Potiba”. Era uma festa. Os torcedores de Potiguar e Baraúnas faziam zoada, “tirando onda” com a torcida adversária.

Atualmente, além de não termos o estádio em boas condições para receber os jogos, há a violência de algumas torcidas organizadas, perturbando a paz e o brilho do espetáculo. Ficamos receosos em ir ao estádio, principalmente com nossas mulheres, filhos e netos.

Lembro-me que, no intervalo dos jogos, era uma luta medonha pra comprar um cachorro-quente e um refrigerante. Mas, por outro lado, tínhamos a resenha, o churrasquinho de “gato”, uma cervejinha para molhar a garganta, os ambulantes vendendo canudinhos nas arquibancadas e o grito da galera incentivando o seu time. Sem esquecer, é claro, dos xingamentos proferidos contra o árbitro e a sua pobre genitora. Uma partida de futebol, caros leitores, é uma gama de emoções.

Enfim, mais um domingo sem futebol no Nogueirão. Porém, salvo engano, li que a Prefeitura Municipal de Mossoró elaborou um projeto relacionado à permuta do imóvel, apesar de alguns torcedores terem realizado, na semana passada, um protesto contra tal pretensão. Todavia, espero que tudo seja levado a bom termo o mais breve possível, pois, como diria Nelson Rodrigues, nosso maior cronista esportivo, “para nós, o futebol não se traduz em termos técnicos e táticos, mas puramente emocionais”.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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Categoria(s): Crônica / Esporte
domingo - 21/07/2024 - 11:20h

Memória viva de campanhas eleitorais inesquecíveis

Por Odemirton Filho

Arte de Cássio Costa da Agência Senado

Arte de Cássio Costa da Agência Senado

A convite de Carlos Santos, criador e editor do Blog Carlos Santos, topei escrever para este domingo (21) na condição de eleitor e testemunha viva de algumas campanhas eleitorais em Mossoró. “Quero uma visão que não seja do especialista, mas de alguém que vivenciou época de campanha diferente da conhecida atualmente,” justificou ele. Portanto, o que vem aí mais abaixo, não é o olhar do especialista, do profissional do jornalismo político, da pessoa do marketing, do homem da ciência política, do expert em pesquisa eleitoral, mas de alguém que viveu período memorável lá embaixo, nas carreatas, nos comícios, passeatas, showmícios. Desses tempos cativantes, eis um pouco do que ficou em minha memória:

Os artigos dos articulistas que escrevem nesta página na série “Eleições Municipais 2024” fizeram-me relembrar das campanhas eleitorais de tempos idos. Algumas foram singulares, seja porque eu ainda estava no junho de minha vida, e tudo era motivo pra festa, seja pelo acirramento dos embates eleitorais, tão comuns nas cidades do interior. Não é meu objetivo discorrer amiúde sobre tais campanhas, mas, tão-somente, apresentar um recorte do que vivenciei.

Refiro às campanhas eleitorais de 1986, 1988 e 1992, a primeira para o Governo do Estado do Rio Grande do Norte, a segunda e a terceira para a Prefeitura Municipal de Mossoró.

1986

Em 1986, os nomes fortes que concorriam ao Governo do RN eram João Faustino e Geraldo Melo. Em outra oportunidade, escrevi que até hoje não existiu campanha eleitoral mais emocionante. Os jingles do “Tamborete”, apelido de Geraldo Melo, eram de arrepiar; “sopra o vento, deixe esse vento soprar, esse vento traz Geraldo, a nossa sorte vai mudar…”

Os eleitores ficavam fascinados com a oratória de Melo, acostumado a falar para multidões; muitos deles levavam tamboretes nas mãos ou colocava-os nas janelas e calçadas das casas. De fato, foi uma campanha eleitoral belíssima, envolvente e, ao final, o “Tamborete” venceu João do Coração. Resultado das eleições de 1986:

– Geraldo Melo (PMDB) – 50, 11%
– João Faustino (PFL) – 48,60%
– Aldo Tinoco (PDT) – 0,72%
– Sebastião Carneiro (PT) – 0,57%

1988

Rosalba foi eleita três vezes, a começar de 1988 (Foto: reprodução)

Rosalba e Luiz Pinto erguem braços à aclamação em 1988 (Foto: Reprodução/Arquivo BCS)

Em 1988, Laíre Rosado e Rosalba Ciarlini protagonizaram a disputa para prefeito. “Sou rosa vermelha, ai! Meu bem querer, beija-flor sou tua rosa, e hei de amar-te até morrer…” O Jingle de Rosalba embalou a campanha. A música Ilariê tocava nos comícios de Laíre; o candidato do PT também tinha seu jingle, “Chagas Silva, Zé Estrela, tome nota pra votar…”

Como disse em outra crônica sobre o tema, lembro-me de dona Edith Souto – baluarte do aluizismo em Mossoró – acompanhando as passeatas sentada no capô de um veículo Opala; dos ônibus levando os eleitores pra lá e pra cá; da Força Jovem, uma turma de rapazes e moças que apoiava a candidata Rosalba, realizava comícios que reuniam milhares de pessoas.

Foi uma campanha bastante disputada, inicialmente tendo Laíre como favorito, mas pouco a pouco, com o apoio de Dix-huit Rosado e outros fatores, a “Rosa” angariou a simpatia dos eleitores, conseguindo ganhar o pleito, iniciando, a partir de então, uma carreira política vitoriosa. Resultado das eleições de 1988:

– Rosalba Ciarlini (PDT) – 37.307 – (49,7%)
– Laíre Rosado (PMDB) – 30.226 – (40,2%)
– Chagas Silva (PT) – 2.507 – (3,3%)

1992

Já na campanha eleitoral de 1992, disputaram pra valer Luiz Pinto e Dix-huit Rosado. Luiz Pinto era o candidato apoiado por Rosalba, que estava surfando nas ondas da popularidade, e eram favas contadas a vitória do Pinto. Elek  seu vice-prefeito, oriundo de família tradicional da cidade.

Laíre Rosado, Frederico Rosado, Sanda Rosado, Dix-huit e Vingt em 1992 (Foto: arquivo)

Laíre Rosado, Frederico Rosado, Sanda Rosado, Dix-huit e Vingt em 1992 (Foto: arquivo)

Porém, não foi bem assim. Apesar da idade avançada, com as limitações naturais para enfrentar uma campanha, o “Velho” mostrou todo o seu vigor eleitoral.

Certa vez, presenciei um discurso do velho alcaide, um orador de primeira linha. Na ocasião, disse que, se pudesse, cobriria o chão de Mossoró com algodão para ao pisar não machucar a terra que tanto amava.

No final do embate, o “Velho” venceu o “Pinto”.

No comício da vitória, a canção do poeta Zé Lima animava a multidão, eufórica: “Não sei o que será do amanhã, a vida da morte é irmã, eu quero esse cheiro de terra, sabor de hortelã…” Resultado das eleições de 1992:

– Dix-huit Rosado (PDT) 37.188 – (47,79%)
– Luiz Pinto (PFL) 32.795 – (42,15%)
– Luiz Carlos Martins (PT) 6.557 – (8,43%)
– Paulo Linhares (PSB) 1.273 – (1,64%)

Em Mossoró, à época, os grandes comícios eram realizados no largo do Jumbo, da Cobal, no Ferro de Engomar, logo após a descida do Alto de São Manoel. Os showmícios eram permitidos. Cantores e bandas de fama nacional animavam o povão, numa verdadeira festa; nas passeatas, um mar de pessoas; nas carreatas, uma ruma de carros e motocicletas, além de carroças e bicicletas.

Foram essas, para mim, as campanhas eleitorais inesquecíveis. Quem viveu esses momentos sabe muito bem o que acabei de descrever. Esse tempo não voltará jamais.

Série Eleições Municipais 2024

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Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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domingo - 14/07/2024 - 07:32h

Meus dias de domingo

Por Odemirton Filho

Dorian morreu aos 71 anos de idade (Foto: Arquivo do extinto Gazeta do Oeste)

Dorian Jorge Freire – jornalista e cronista (Foto: Arquivo do extinto Gazeta do Oeste)

Há tempos eu procurava entre os poucos livros da minha “biblioteca”, o livro Os Dias de Domingo, de autoria do Jornalista Dorian Jorge Freire. Em vão. Entretanto, um dos meus cunhados, Raphael Valério, fez-me a gentileza de adquirir um exemplar, num desses sebos virtuais. Para um apaixonado por crônicas, não ter no acervo o mestre Dorian é erro crasso, imperdoável.

Aliás, abro um parêntese em relação às crônicas. Alguns dizem que existem três ciclos históricos. O primeiro, de 1852 a 1897, tendo como fundadores: Francisco Otaviano, José de Alencar e Machado de Assis. O segundo, de 1897 a 1922, com: Olavo Bilac, João do Rio, Lima Barreto e Orestes Barbosa. O terceiro, de 1922 a 1945: Mario de Andrade, Oswald de Andrade, Antônio de Alcântara Machado, Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade e Cecília Meireles. E o último ciclo, de 1945 até a década de 1970, com Rubem Braga, Vinicius de Moraes, Paulo Mendes Campos, Fernando Sabino, Sérgio Porto, Antônio Maria e José Carlos Oliveira.

Pois bem, voltemos a Dorian, que, para mim, está entre os cronistas do último ciclo. Sim, eu li o livro há muitos anos, agora, reli. Conforme já disseram, “temos que abrir o livro, aí eles despertam. Ler e reler. Reler melhor do que ler”. E Dorian continua insuperável na arte de escrever torneando frases, resgatando lembranças de tempos idos.

Numa de suas crônicas sobre Mossoró, revolvendo fatos pretéritos, ele escreveu:

“Mas a cidade mudou. Que mudou. Mudou. Por mais que eu procure nos becos e vielas, nas ruas da merda, no beco do pau não cessa, extensão do beco de Jeremias cego, não encontro sinhá Maria o boi bebeu. E nas caladas da noite de minha praça da Redenção, nunca mais voltei a ouvir o cantochão de Zé Alinhado”.

E continua a navegar no mar de lembranças:

“E o Bar Brahma? E Casablanca? Cadê todo o meretrício que ganhou de Américo de Oliveira Costa o nome de Art Nouveau, embora os seus exercícios fossem velhos como o mundo? Art Nouveau, Alto Nu Vou, Alto Louvor, rasga, lá em cima. Tudo desaparecera. Sumira. Mergulhara terra adentro, na sepultura aberta pela modernidade”.

O Alto do Louvor não foi do meu tempo de rapaz. Na minha época de estripulias estava decaído. Todavia, alguns leitores mais experientes do que eu, devem lembrar.

Já os meus dias de domingo, à época da minha infância e juventude, foram vividos na rua Tiradentes, no centro de Mossoró. De lá, sobejam lembranças. Quais? A vitrola do meu vizinho, Cesário, de dona Odete, a tocar músicas de Nelson Gonçalves e Lupicínio Rodrigues; o almoço em família (carne de sol com arroz de leite ou galinha); os primos que se esbaldavam na pequena piscina; depois do banho, saboreávamos o bolo de leite preparado por minha estimada Socorro.

Ah, e o pé de seriguelas do quintal da minha casa. Talvez, ele tenha sido o mais querido, o mais alegre, o mais terno amigo de minha infância, diria Rubem Braga.

À tarde, eram os vesperais no Cine Pax. Boquinha da noite, juntamente com meus pais, íamos à sorveteria do Juarez; à pizzaria de Patrício, o português; sem esquecer das Missas na Catedral de Santa Luzia. Ao término da Celebração Eucarística, a turma jovem ficava na praça, flertando, para usar uma expressão de antigamente. Nas cidades interioranas, sobretudo nas menores, a praça da Igreja Matriz sempre foi um local de encontro. E todos eram conhecidos, sabíamos quem era filho de fulano ou beltrano.

Por derradeiro, permita-me transcrever um fragmento do prefácio do livro de Dorian, escrito por Nilo Pereira:

“Lendo (ou melhor relendo) as crônicas de Dorian Jorge Freire, sinto que estou diante de um fenômeno diversificado: há o cronista propriamente dito, o homem de luta e de convicção, o observador inteligente da vida, o filósofo, o cristão, o escritor, sempre voltado para as agonias do nosso tempo”.

Eu assino embaixo. E dou fé.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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Categoria(s): Crônica
domingo - 07/07/2024 - 08:22h

Breve comentário sobre a Súmula n. 73 do Tribunal Superior Eleitoral

Por Odemirton Filho

Arte ilustrativa

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Nos últimos tempos, a Justiça Eleitoral tem prolatado decisões com fundamento no art. 10, § 3º da Lei das Eleições. (n. 9.504/97). Referido artigo trata da cota de gênero, o qual reza o seguinte:

“Cada partido poderá registrar candidatos para a Câmara dos Deputados, a Câmara Legislativa, as Assembleias Legislativas e as Câmaras Municipais no total de até 100% (cem por cento) do número de lugares a preencher mais 1 (um).

§ 3º – Do número de vagas resultante das regras previstas neste artigo, cada partido ou coligação preencherá o mínimo de 30% (trinta por cento) e o máximo de 70% (setenta por cento) para candidaturas de cada sexo”.

Entretanto, inúmeras foram as decisões Brasil afora no tocante à fraude à cota de gênero, inclusive, no nosso Estado. Conforme o Supremo Tribunal Federal, fraudar a cota de gênero – consubstanciada no lançamento fictício de candidaturas femininas – materializa conduta transgressora da cidadania (art. 1º, II, da CF/88), do pluralismo político (art. 1º, V, da CF/88), da isonomia (art. 5º, I, da CF/88).

Assim, disciplinando o tema, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) editou a Súmula n. 73 com o seguinte teor:

“A fraude à cota de gênero, consistente no desrespeito ao percentual mínimo de 30% (trinta por cento) de candidaturas femininas, nos termos do art. 10, § 3º, da Lei n. 9.504/97, configura-se com a presença de um ou alguns dos seguintes elementos, quando os fatos e as circunstâncias do caso concreto assim permitirem concluir:

(1) votação zerada ou inexpressiva;
(2) prestação de contas zerada, padronizada ou ausência de movimentação financeira relevante;
(3) ausência de atos efetivos de campanhas, divulgação ou promoção da candidatura de terceiros.

O reconhecimento do ilícito acarretará:

(a) a cassação do Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (Drap) da legenda e dos diplomas dos candidatos a ele vinculados, independentemente de prova de participação, ciência ou anuência deles;

(b) a inelegibilidade daqueles que praticaram ou anuíram com a conduta, nas hipóteses de Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE);

(c) a nulidade dos votos obtidos pelo partido, com a recontagem dos quocientes eleitoral e partidário (art. 222 do Código Eleitoral), inclusive para fins de aplicação do art. 224 do Código Eleitoral”.

Façamos breve comentário sobre cada um dos elementos.

As candidatas devem entrar na disputa para valer, e não como coadjuvantes. Desse modo, se determinada candidata tem uma votação inexpressiva, dois ou três votos, por exemplo, ou não vota em si mesma, não obtendo nenhum voto, é possível que tenha existido fraude.

No mesmo sentido, a prestação de contas zerada, sem movimentação relevante, não denotando que a candidata gastou um percentual razoável em sua campanha eleitoral, afigura-se como suspeita. Como fazer campanha com custo praticamente zero?

Além disso, é preciso “colocar o bloco na rua”. Não parece verossímil uma candidatura que não participa de programa de rádio e televisão, nem de comícios, carreatas, passeatas, debates ou encontros. É natural do jogo político a captação lícita de votos, isto é, apresentar a candidatura e propostas, com atos efetivos de campanha. Ademais, a divulgação de candidaturas de terceiros, mais do que a própria, não é conduta de quem realmente entrou na disputa para buscar o voto do eleitor.

Por consequência, se a Justiça Eleitoral comprovar a ilicitude das candidaturas do sexo feminino nos moldes acima expostos, cassará o diploma de todos os eleitos pela legenda partidária, independentemente de sua contribuição para a ocorrência do ilícito.

Acrescente-se que ficarão inelegíveis os que praticaram a conduta ilícita ou contribuíram para a sua realização; e nulos serão os votos conferidos ao partido, refazendo-se um novo cálculo do quociente eleitoral e partidário.

Registre-se que, segundo entendimento do TSE, no tocante ao art. 224 do Código Eleitoral, há aplicabilidade aos pleitos proporcionais (deputados e vereadores), em razão da nulidade de mais de 50% dos votos válidos por prática de fraude à cota de gênero, com a renovação integral das cadeiras.

Destaque-se, por fim, que para a configuração dos elementos acima delineados, é imprescindível a análise do caso concreto pela Justiça Eleitoral, com o processamento e julgamento das ações cabíveis, assegurando-se o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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domingo - 30/06/2024 - 08:34h

Distribuição de combustível nas campanhas eleitorais

Queda do dólar e barril do petróleo incidem sobre preços internos (Foto: Sérgio Lima/Poder360 18.jun.2022)

Foto ilustrativa (Foto: Sérgio Lima/Poder360 18.jun.2022)

Por Odemirton Filho

Um dos principais eventos das campanhas eleitorais é a realização de carreatas promovidas pelos candidatos. É comum, no decorrer das pleito, a promoção de carreatas com veículos e motocicletas. Quanto maior a quantidade de veículos envolvidos no evento, maior a impressão que causará ao potencial eleitor.

Disciplinando o assunto, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), por meio da Resolução n. 23.607/19, diz que os gastos com combustível são considerados gastos eleitorais apenas na hipótese de apresentação de documento fiscal da despesa do qual conste o CNPJ da campanha, para abastecimento de veículos em eventos de carreata, até o limite de 10 (dez) litros por veículo, desde que feita, na prestação de contas, a indicação da quantidade de carros e de combustíveis utilizados por evento. (Grifei).

Do mesmo modo, os veículos utilizados a serviço da campanha, decorrentes da locação ou cessão temporária, que sejam declarados originariamente na prestação de contas, bem como, seja apresentado relatório do qual conste o volume e o valor dos combustíveis adquiridos semanalmente para este fim.

Ressalte-se que não são consideradas gastos eleitorais, não se sujeitam à prestação de contas e não podem ser pagas com recursos da campanha as despesas de natureza pessoal da candidata ou do candidato, como o combustível e manutenção de veículo automotor usado pela candidata ou pelo candidato na campanha.

Por outro lado, se a distribuição de combustível não estiver dentro das balizas da sobredita Resolução, o candidato poderá incorrer em abuso de poder econômico e captação ilícita de sufrágio.

Nesse sentido, é o entendimento do TSE:

“Eleições 2020. […] Ação de investigação judicial eleitoral. Prefeito e vice-prefeito eleitos. Abuso de poder econômico. Captação ilícita de sufrágio. Doação massiva de combustíveis a eleitores. Configuração dos ilícitos. […] 5. A distribuição massiva de combustíveis, sem controle ou vinculação dos beneficiados com a participação em atos políticos, visando à obtenção de voto dos eleitores, que se revele apta a comprometer a normalidade das eleições e a causar desequilíbrio entre os candidatos, configura captação ilícita de sufrágio e abuso de poder econômico […]”. (Ac. de 3/5/2024 no AgR-TutCautAnt n. 060019961, rel. Min. Cármen Lúcia.)

Gize-se que “o abuso de poder econômico se refere à utilização excessiva, antes ou durante a campanha eleitoral, de recursos materiais ou humanos que representem valor econômico, buscando beneficiar candidato, partido ou coligação, afetando assim a normalidade e a legitimidade das eleições”.

Segundo jurisprudência do TSE, para a configuração da captação ilícita de sufrágio, com base no art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, devem estar presentes a realização de quaisquer das condutas enumeradas pelo dispositivo, quais sejam, doar, oferecer, prometer ou entregar bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza ao eleitor, inclusive emprego ou função pública, o dolo específico de obter o voto e a participação ou anuência do candidato beneficiado, ocorrendo os fatos desde o registro da candidatura até o dia da eleição.

Saliente-se que, qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, conforme o Art. 22 da Lei Complementar 64/90.

Qual a consequência se a Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) for julgada procedente?

O Tribunal declarará a inelegibilidade do representado e de quantos hajam contribuído para a prática do ato, cominando-lhes sanção de inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos 8 (oito) anos subsequentes à eleição em que se verificou, além da cassação do registro ou diploma do candidato diretamente beneficiado pela interferência do poder econômico ou pelo desvio ou abuso do poder de autoridade ou dos meios de comunicação, determinando a remessa dos autos ao Ministério Público Eleitoral, para instauração de processo disciplinar, se for o caso, e de ação penal, ordenando quaisquer outras providências que a espécie comportar. (inciso XIV, da LC 64/90).

Diante do exposto, é prudente que candidatas e candidatos respeitem à legislação eleitoral. Não adianta ser eleito e, posteriormente, perder o mandato; e ainda ficar inelegível.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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Categoria(s): Crônica
domingo - 23/06/2024 - 10:52h

Lutas e vitórias

Foto ilustrativa

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Por Odemirton Filho

No Pingo da Mei Dia uma multidão dançava, bebia e ia “atrás do trio elétrico”; eram pessoas de todas as idades e classes sociais. Os camarotes estavam lotados, com atrações dos mais variados gêneros musicais. Pelo menos, por algumas horas, as pessoas estavam felizes, esquecendo os seus trabalhos e as dificuldades cotidianas.

Enquanto isso, numa rua lateral, ao lado da empresa Socel, um senhor montou a sua barraca e comercializava chapéus dos mais variados tipos, cores e tamanhos. Esperando uma neblina parar de cair, eu fiquei sob a barraca, e puxei dois dedos de prosa. Ele não estava muito animado com as vendas e perguntou:

– O povo daqui não gosta muito de chapéu, né?

– Só quem gosta mais é o prefeito – respondi, em tom de brincadeira.

Ele sorriu. Falou-me que era da região do Seridó, das bandas de Caicó, e há anos viajava por esse mundão de meu Deus, vendendo chapéus. Durante toda a sua vida tirou o seu sustento por intermédio desse ofício. Era acostumado a viajar por várias cidades do Nordeste, participando de festas de padroeiro, de emancipação política, de vaquejadas, de São João.

– Consegui formar dois filhos: um engenheiro, o outro, nutricionista, disse-me, com uma ponta de orgulho.

E aí fiquei a imaginar a luta diária do nosso povo pela sobrevivência. Quantos pequenos comerciantes, ou empreendedores, para usar o termo da moda, não labutam dia a dia pelo sustento? Quantas pessoas não estão melhorando a renda vendendo seus produtos nesta época de festas juninas? São muitas, milhares, milhões.

Eu, particularmente, sinto um nó na garganta ao ver idosos e crianças, à noite, tentando ganhar um dinheirinho, quando poderiam estar em casa. Enquanto isso, os artistas recebem cachês de alto valor; não tenho nada contra os artistas (contrata quem quer), apenas quero ressaltar a histórica desigualdade social existente em nossa sociedade, mas isso é outro assunto.

O fato é que, quando a garoa parou de molhar a terra de Santa Luzia, o vendedor desmontou a sua barraca e arrumou os chapéus. Eu e a minha mulher acompanhamos o trio elétrico, ele tomou o rumo de outras cidades, carregando na mala as suas mercadorias e, na alma, as suas lutas e vitórias.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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Categoria(s): Crônica
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domingo - 16/06/2024 - 05:20h

No tempo de Deus

Por Odemirton Filhocorreria, trânsito, pessoas, faixa de pedestre,

“Para tudo há uma ocasião certa; há um tempo certo para cada propósito debaixo do céu: tempo de nascer e tempo de morrer, tempo de plantar e tempo de colher o que se plantou”. (Eclesiastes 3:1-8).

Assim é a vida. Tenho esse versículo bíblico como um dos meus princípios. No tempo certo tudo ocorrerá. Ou não. Para quem espera no Senhor, no tempo de Deus, o que tiver de ser, será. A vida açodada na qual vivemos nos leva para o imediatismo. Queremos para ontem aquilo que somente virá amanhã.

No mundo no qual estamos inseridos, a correria é uma constante. São múltiplas as obrigações para dar conta; o trabalho, o estudo, a família, “o social”, levam-nos a uma vida agitada, repleta de compromissos. Queremos atender a tudo e a todos.

Quando chegarmos ao entardecer da vida as consequências virão. Tomaremos remédios para recuperar uma saúde debilitada pelo estresse e pela correria do dia a dia. Vale a pena? Faça o leitor a sua reflexão.

É claro que devemos lutar pelos nossos objetivos, pela concretização dos nossos sonhos, não devemos ficar acomodados, “com a boca escancarada, cheia de dentes, esperando a morte chegar”, porquanto a vida exige atitudes e batalhas diárias.

Aliás, há uma história interessante, escrita por Liev Tolstói, que passo a narrar para o leitor:  Havia um homem que, no desejo de amealhar uma grande quantidade de terras, caminhou por um longo período, sem parar, pois, a terra que ele percorresse antes do pôr do sol, seria de sua propriedade.

“Ele corria, a camisa e a calça ensopadas de suor grudavam em sua pele, a boca estava seca. Os músculos trabalhavam como o fole de um ferreiro, o coração martelava dentro do peito, e as pernas pareciam se mover como se não lhe pertencessem. O homem foi dominado pelo terror de morrer de tanta tensão”.

O homem, sentindo que não chegaria antes do sol chegar na borda do horizonte, gritou: “há muita terra, mas Deus permitirá que eu viva nela? Eu perdi minha vida, perdi minha vida!  Nunca chegarei…”

E morreu.

Algumas pessoas que ali estavam, pegaram uma pá e cavaram uma sepultura de tamanho suficiente para que o homem coubesse deitado lá dentro, e o enterraram. Um metro e oitenta, da cabeça aos pés, era o que bastava.

Pois é, não adianta correr. Tudo acontecerá no tempo de Deus.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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Categoria(s): Crônica
domingo - 09/06/2024 - 10:20h

Entre o som e o silêncio

Por Odemirton Filho

Ilustração Web

Ilustração Web

Há dias eu pensava em escrever uma crônica sobre o silêncio. Faltava-me, porém, inspiração ou talento para tal mister. Entretanto, após ler um artigo sobre o maestro João Carlos Martins, o caminho desanuviou. O artigo em tela falava sobre resiliência, de como o maestro conseguiu superar os limites impostos por uma doença e, com uma mão biônica, continuou a tocar piano. “Entre o som e o silêncio o necessário é a coragem”, disse.

A história do pianista me lembrou, ainda, de um livro que estou lendo, do escritor Rafael Gallo. O livro trata de um pianista virtuoso, o qual sofre um acidente quando estava na iminência de ser reconhecido como um dos maiores intérpretes do compositor húngaro Franz Liszt.

Pois bem. A palavra é prata e o silêncio é ouro, não é isso, meu caro editor? É no silêncio que encontramos o caminho a ser trilhado. Depois de estarmos em íntima reflexão com o nosso eu, talvez encontremos as respostas. Muitos falam demais, e escutam de menos, perdendo-se no vazio de suas palavras. Falar menos, escutar mais, é princípio de sabedoria.

“Existe no silêncio uma tão profunda sabedoria que às vezes ele se transforma na mais perfeita resposta”, disse o poeta Fernando Pessoa. Em certos momentos, ensarilhar armas, não é ato de covardia, ao contrário, é preparar-se para enfrentar batalhas que realmente valem a pena; observem como nas redes sociais existem discussões e comentários agressivos e desnecessários.

No decorrer da vida, o som dos nossos problemas nos impede de seguir adiante. Caímos aqui; tropeçamos acolá. O barulho do mundo nos afasta dos nossos propósitos, e deixamos de compor a letra da música da nossa vida. Nessas horas de balbúrdia, precisamos ficar em silêncio e ouvir a sinfonia da alma, sentindo o coração bater num lento compasso, à espera de respostas.

Não por acaso, diz a sabedoria popular: “a melhor resposta é o silêncio”. Discussões acaloradas nos levam a agir de forma impensada sem o necessário discernimento. Conduzir-se com prudência, medindo palavras e atitudes, sempre é de bom tom, apesar de nem sempre conseguirmos, pois, felizmente, ainda somos humanos. Todavia, é na toada do silêncio que temos as respostas aos nossos questionamentos e, sobretudo, paz de espírito, algo imensurável.

Lembrem-se das Sagradas Escrituras: “Até o insensato passará por sábio se ficar quieto e, se contiver a língua, parecerá que tem discernimento”. (Provérbios 17:28).

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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Categoria(s): Crônica
  • Art&C - PMM - PAE - Outubro de 2025
domingo - 02/06/2024 - 07:24h

Sempre é tempo

Por Odemirton FilhoDois caminhos, já teve, passado e presente, escolha, passado e presente, terra arrasada

Li um texto que dizia assim: “é na velhice que os fantasmas do arrependimento e da culpa costumam aparecer com mais frequência. Quando se chega a um tempo no qual o que ainda falta viver é muito menos do que o que já se viveu, o passado, as memórias e as escolhas que não foram feitas invadem o presente e exigem uma injusta prestação de contas para a qual dificilmente nos preparamos”.

Realmente, o passar do tempo nos faz refletir sobre o que vivemos. E fizemos. Não, não se trata de remoer o passado, pois este deve ficar devidamente guardado lá atras; é preciso virar a página do livro da vida, como se diz. No entanto, tenho certeza que a maioria de nós faz essa reflexão. Às vezes, nos perguntamos: e se tivesse enveredado por outros caminhos, a vida teria sido diferente? Fiz a escolha certa naquela ocasião? Enfim, são inúmeros os questionamentos, poucas as respostas.

Decerto, muitos devem carregar no peito uma ou outra culpa pelo que fez. Por vezes, uma atitude irrefletida nos leva para o abismo do arrependimento. Fazemos mea-culpa. Se dá para remendar o malfeito, ótimo, senão, resta-nos carregar pelo resto da vida o peso da culpabilidade. Para o Direito Penal, a culpabilidade é o juízo que se faz sobre a reprovabilidade da conduta do agente. Somos ao mesmo tempo, no tribunal de nossa consciência, o juiz, o promotor, o advogado e o réu.

Entretanto, não podemos conduzir a nossa vida carregando o peso de arrependimentos. A vida impõe escolhas, temos que decidir. Talvez, acertemos, talvez, erremos. Não importa. Faz parte da jornada. Porém, não dá para conviver com essa angústia. É preciso viver, pois o passado está morto, e o futuro é incerto. O que temos é o presente, porquanto a vida é um instante, dizem por aí.

Muitos acreditam na “lei do retorno”, uma vez que pagaremos os erros cometidos por aqui, não na outra vida, para quem acredita, claro. Colhemos hoje o que plantamos ontem. Semeamos amor ou ódio? Fomos bons filhos? Fomos bons pais? Cultivamos amizades? Fizemos o bem?

Quem sabe, não devemos esperar chegar ao crepúsculo de nossa existência para fazermos uma reflexão sobre o que estamos a fazer, mesmo porque não sabemos quando será o ocaso da vida. Creio que sempre é tempo para revermos valores, principalmente, atitudes.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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domingo - 26/05/2024 - 06:50h

Ao mestre José Nicodemos

Por Odemirton Filho

José Nicodemos faleceu à semana passada (Foto: Arquivo)

José Nicodemos faleceu à semana passada (Foto: Arquivo)

Na travessia da balsa, vindo das bandas da cidade de Grossos, vislumbram-se montanhas de sal.  Nas margens do rio que desagua na imensidão do mar, aves e alguns barcos pesqueiros ornam a paisagem. Ao aportar no cais, deparamo-nos com a Igreja matriz de Nossa Senhora da Conceição, em Areia Branca.

Eis alguns versos do Hino da cidade salineira:

“Areia Branca, terra amada,

Terra do sol, terra do sal,

És a sereia majestosa,

Rindo esmeralda ao litoral.”

O Hino foi composto por José Nicodemos de Souza, falecido no último dia dezoito, demonstrando todo o amor e carinho por sua cidade. Conheci Nicodemos, escritor, cronista e revisor dos jornais de Mossoró, por meio de suas crônicas diárias. Na época dos jornais impressos, era a minha primeira leitura. Deleitava-me com sua inteligência privilegiada, com os seus textos escorreitos.

Tempos depois, salvo engano ali pela lanchonete Oitão, em frente à banca de Jornal de Zé Maria, tive a satisfação de conhecê-lo. Sempre o encontrava pelo centro da cidade e, por várias vezes, trocamos um dedo de prosa. Falava-me sobre Areia Branca, sobre alguns causos que aconteceram há muitos anos na cidade; causos impublicáveis, diga-se, que jurei segredo. Era um homem de vasta cultura, dominava a língua portuguesa como poucos.

Houve um tempo em que eu recortava as suas crônicas dos jornais, guardava para ficar lendo, relendo, apreciando, aprendendo, pois ele redigia com a alma. Vez em quando, escrevia sobre sua terra querida, denotando sentimentos de alegria, tristeza, decepções. Outras vezes, entretanto, era um crítico da classe política, sobretudo, da corrupção que grassa no meio.

José Nicodemos de Souza foi umas das pessoas mais cultas que conheci, agradeço por ter tido a oportunidade de privar um pouco de sua amizade e consideração. Para um admirador do gênero literário crônica, como eu, ele sempre será uma referência. Os meios literários de Areia Branca e Mossoró, quiçá do Estado do RN, devem a Nicodemos uma justa e merecida homenagem.

Na semana passada, reli o livro A Velhinha de preto, uma coletânea de crônicas de sua autoria; livro que adquiri há vinte anos. Para o nosso regozijo, transcrevo um fragmento da crônica, De repente, Agosto, na qual ele derrama-se em lirismo e saudades:

“E porque é agosto, há festa de luz e cores no ar. Na minha terra das areias brancas. O mar copia a leveza diáfana do azul dos horizontes acesos por um sol de ouro novo, no verde profundo das suas águas em festa a Nossa Senhora dos Navegantes. Os coqueiros de suas praias, como transformados em visões lendárias, tocam na brisa do mar uma canção diferente. E eu cá, a distância, sinto-me convidado a lembranças e recordações. Das festas de agosto de antigamente”.

Ficarão eternizadas em minhas lembranças as suas belas crônicas e as nossas agradáveis conversas.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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  • Repet
domingo - 19/05/2024 - 10:30h

Confraria do café

Por Odemirton Filho

Foto ilustrativa

Foto ilustrativa

O poeta Mario Quintana disse certa vez que “o café é a bebida da amizade, o companheiro das reflexões solitárias, o refúgio dos pensamentos inquietos.” Sim, é bom saborear um café para começar o dia; um gole de café nos faz despertar para a labuta diária. E, como bem disse o poeta, é o companheiro das reflexões solitárias. Às vezes, ao tomar um café, refletimos sobre o nosso eu, muitas vezes tão repleto de dúvidas e angústias.

Entretanto, degustar um café ao lado de boas companhias faz toda diferença. Assim é com a confraria do café, lá na casa do nosso dileto escritor, Marcos Ferreira. Ele nos recebe de braços abertos, com um sorrisão estampado no rosto. Já tive o prazer de fazer parte dessa reunião de pessoas do bem, juntamente com Rocha Neto, do excelente restaurante Prato de Ouro. É um momento para dar boas risadas, sem o formalismo de alguns ambientes cheios de frescuras.

Por lá, aparecem pessoas dos mais variados estratos sociais, e o melhor é que não há hierarquia entre os convivas, todos ficam à vontade. É um espaço plural, no qual as conversas são leves, sem o radicalismo que tem dividido o país nos últimos tempos.

O fato é que sempre gostei de visitar Cafés. Há mais de dez anos, semanalmente, vou tomar um cafezinho em Duarte´s Café, de propriedade de Dona Toinha e Rafael Arcanjo, professor aposentado da Uern. Já conversei com muita gente boa no local. Aliás, foi onde conheci o advogado e escritor Bruno Ernesto, colaborador deste Blog.

Vez ou outra, acompanhado da minha mulher, visitamos alguns Cafés da cidade, já conhecemos quase todos. Alguns ambientes são mais requintados, outros, simples. Não importa, o que vale é o calor da companhia, além do café, claro.

Durante os quinze anos que lecionei na Universidade Potiguar, no intervalo das aulas, convivia com professores de vários cursos e, ao tomarmos um café, trocávamos experiências, era um momento aprazível. No Fórum da Comarca de Areia Branca, onde trabalho há quase dezenove anos, sempre tem a pausa para o cafezinho, ocasião para ficar atualizado das fofocas.

Pois é, da próxima vez que for à casa de Marcos Ferreira, na confraria do café, levarei umas saborosas bolachas da padaria de Sinval e, entre um gole e outro, vamos colocar a prosa em dia. Mesmo porque, segundo Quintana, “o café é a poesia dos encontros, o elo que une pessoas e histórias.”

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

 

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Categoria(s): Crônica
domingo - 12/05/2024 - 07:22h

A vida é pra quem sabe viver

Ilustração Web

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Por Odemirton Filho

Todos os dias, religiosamente, recebo por meio do Aplicativo WhatsApp mensagem do amigo Rocha Neto. São mensagens carregadas de esperança na vida e fé em Deus, inspiradas pelos melhores dos sentimentos, vindas do coração. Sem dúvida, quem as recebe, fica com a alma aquecida e renovada.

Diariamente, também, num grupo criado exclusivamente para oração, uma colega do trabalho envia áudios adorando e agradecendo a Deus pelo dom da vida, além de hinos de louvor. Um grupo de “zap” no qual somente ela, administradora, pode enviar mensagens.

Eis uma das vantagens do mundo tecnológico no qual vivemos: interagir com diversas pessoas, de forma rápida, ao mesmo tempo. Mas como encaramos a vida? Se, por um lado, há pessoas positivas, por outro, sempre existem pessoas negativas, com uma energia ruim.

Nem tudo na vida são flores, é certo. Porém, é preciso oxigenar o espírito com pensamentos positivos, dando-nos força para vencer os inúmeros obstáculos. Sempre reclamar de tudo, e de todos, não faz bem. Aliás, ao escrever, procuro transmitir aos leitores uma mensagem positiva, que resgatem do fundo do peito as lembranças, as saudades e os bons sentimentos.

Sua vida tá difícil? Agora, pense na tragédia do Rio Grande do Sul. Pensou? Pois é, percebeu como existem pessoas em situação pior? Por isso, devemos agradecer, sempre.

Guardar algum bem material para ser usado num momento singular pode não ser a melhor escolha. Não sabemos se chegará esse momento. Hoje ou amanhã tudo pode acabar. Uma canção interpretada pelo sambista Diogo Nogueira diz assim:

’A vida é pra quem sabe viver, procure aprender a arte pra quando apanhar não se abater; ganhar e perder faz parte…”

Se hoje perdemos, amanhã, ganharemos. Se hoje choramos, amanhã, sorriremos. Aqui ou acolá levamos umas rasteiras da vida, é verdade. Contudo, não podemos desistir.

Tristezas e preocupações? Sim, é claro que tenho. Entretanto, “Deus é maior! Maior é Deus, e quem tá com Ele nunca está só”.

Ah, e tenho alegrias. Muitas.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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  • Art&C - PMM - PAE - Outubro de 2025
domingo - 05/05/2024 - 11:02h

Antes das redes sociais

Por Odemirton Filho

Ilustração Web

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Lá pelo ano de 2005, portanto há quase vinte anos, a forma pela qual tínhamos notícias dos fatos era diferente. Já existia a internet, é certo. As notícias circulavam instantaneamente em sites e blogs de conteúdos diversos. Este Blog, por exemplo, deu as caras em 03 de maio de 2007; porém, à época, ainda não vivíamos com os olhos grudados nas telas dos computadores e smartphones.

Entretanto, a partir de 2007 com o Facebook no Brasil, e o Instagram e WhatsApp entre 2009/2010, a forma como nos relacionarmos com outras pessoas passou a ser diferente. Amigos que há tempos não víamos, ficaram próximos. Se antes eram com as fofocas nas calçadas e nas reuniões de famílias que sabíamos sobre a vida alheia, agora, não.

QUASE TODO MUNDO EXPÕE SUA VIDA nas redes sociais; tão nem aí. Agora, sabemos onde as pessoas estão. Se estão num barzinho tomando umas; se estão numa festa, viajando pelo Brasil ou pela Europa. Sabemos até o que estão comendo. Servidos?

É claro que não direi que o mundo era melhor antes das redes sociais e da internet, pois a violência, as mazelas sociais e as dificuldades já existiam. A vida sempre foi difícil, e sempre será. Falo é sobre as relações interpessoais. Mas, cá pra nós e a torcida do Mengão, mentiras, fofocas, inveja, ostentação, sempre fizeram parte de nossas vidas. As redes sociais apenas deram visibilidade, com rapidez.

Ah, agora as notícias falsas levam o epíteto de fakes news. Todavia, as notícias falsas e o jornalismo parcial sempre existiram. A diferença é que antes da internet e das redes sociais os fatos e fakes demoravam um pouco mais para se tornarem conhecidos. Político acusando o adversário de meter a mão nos cofres públicos? Não é novidade.

E político que gosta de aparecer na mídia? Ora, ora, sempre existiu. Há exemplos aqui e alhures, de ontem e de hoje. Contudo, não podemos dizer que a internet e as redes sociais não legaram coisas boas. Temos o conhecimento à disposição, basta pesquisar no Google. Por outro lado, infelizmente, há o submundo da Deep web.

Pois é, existia vida antes das redes sociais. Mas, agora, cabe-nos utilizá-las da melhor forma, filtrando o que há de bom. Principalmente, sem esquecer que o mundo real é melhor do que o virtual.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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domingo - 28/04/2024 - 07:16h

Os doces anos da infância

Por Odemirton FilhoDia Nacional do Abraço

O tempo não apaga as lembranças; no máximo, o entardecer da vida faz arrefecer o calor de um coração inundado de saudades. Mas apagar? Apaga não. Assim foi com Arlindo, quando retornou à casa de seus avós depois de muitos, muitos anos. A velha casa estava fechada há tempos. A briga pela herança de pouca monta impedia que o processo de inventário terminasse. Recursos, embargos, impugnações e chicanas de toda sorte faziam a marcha processual emperrar. Os autos do processo sempre estavam conclusos para o juiz prolatar alguma decisão.

Ele fora criado pelos avós maternos desde a mais tenra idade. Toda vez que ouvia a música Avôhai, de Zé Ramalho, sentia um nó na garganta. Vinha à memória a figura de seu avô-pai. “Um velho cruza a soleira de botas longas, de barbas longas”. De sua avó lembrava-se do carinho. De vê-la ao seu lado quando ele estava doente; dos intermináveis “sermões”. Sentia o gosto do arroz de leite e da carne de sol preparados por ela.

Quando completou dezoito anos de idade, mudou-se para a casa de um tio, numa cidade grande, em busca de um futuro promissor. Lembrava-se do dia de sua partida. O seu avô já tinha falecido à época. Contudo, a sua avó, já avançada em anos, despediu-se com lágrimas nos olhos. Deram-se um abraço apertado, daqueles que aquecem a alma.

Infelizmente, tempos depois, quando sua vó faleceu, ele não pode comparecer ao velório, pois morava longe e o dinheiro era contado. Penitenciava-se por essa imperdoável falta. Entretanto, na primeira oportunidade, voltou à sua cidade; foi rever o local onde viveu os doces anos da infância.

Parafraseando a bela canção de Roberto Carlos, ele foi abrindo a porta devagar, mas deixou a luz entrar primeiro, todo o seu passado iluminou-se, e entrou. Em cada canto da casa, lembranças. Os móveis, deteriorados pelo tempo, estavam cobertos por lençóis empoeirados. Foi até a cozinha, os utensílios ainda estavam lá, do jeitinho que sua avó gostava de arrumar. No seu antigo quarto, os brinquedos permaneciam na estante.

Ao olhar a máquina de costura que sua avó trabalhava, incansavelmente, emocionou-se. Lembrou-se que, quando era criança, gostava de ficar ao pé da máquina, brincando, enquanto sua avó preparava o almoço, contando histórias e estórias. E riam, riam, riam.

Arlindo se sentou no chão, próximo à máquina, tecendo na mente um passado de inúmeras memórias afetivas.

Por um instante, o seu corpo arrepiou-se. E sentiu, mais uma vez, o abraço carinhoso da sua vó.

Odemirton Filho é colaborador do Blog Carlos Santos

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