Temos consciência de que o nosso país não é a oitava maravilha do mundo. Longe disso. Bem longe mesmo. A distribuição de renda, por exemplo, é uma lástima de proporção continental. A desonestidade política (salvo exceções) é outro problema crônico e nem sempre vale uma crônica. Há poucos dias, infelizmente, a imprensa em peso noticiou que um vereador potiguar, presidente da Câmara de Ceará-Mirim, foi preso em Natal por haver subtraído uma escova de dentes em um supermercado. Isso é nonada! Foi somente uma fraqueza, uma tentação, coisa do coisa-ruim.
O homem pagou uma fiança equivalente a dez vezes o valor do produto afanado e se encontra em liberdade, gozando da indulgência e do conforto de familiares e amigos. Nessas horas esse tipo de apoio é muito importante. Decerto o edil, contra o qual não pesa (até onde se sabe) nenhuma outra falta, está deveras arrependido de sua atitude cleptomaníaca. Que ninguém, portanto, atire pedras contra o senhor Kaio César Carneiro. Só o Todo-Poderoso é quem pode absolver ou condenar.
Apesar dos pesares, o Brasil é uma nação promissora e, no geral, topograficamente tranquila. Aqui, à exceção da fúria das enchentes em algumas regiões e do flagelo da seca noutras, não padecemos com terremotos nem amargamos as desgraças de uma guerra. É verdade que a bandidagem está em toda parte e o punguismo político costumam roubar a cena, porém não temos chuva de foguetes e mísseis desabando sobre as nossas cabeças. Não ouvimos a todo momento sirenes nos afugentando para abrigos subterrâneos. Embora ainda sejamos uma espécie de pigmeu diante das superpotências bélicas, a nossa diplomacia e soberania são reconhecidas e respeitadas.
O atentado a Israel, com a matança e sequestro de civis, é indiscutivelmente abominável e os israelenses têm o legítimo direito de se defenderem e contra-atacar. Pena que a contraofensiva de Israel já tenha provocado a morte de milhares de palestinos inocentes. Ao contrário de várias nações, não temos conflitos com ninguém. Estamos de boa com os Estados Unidos há muito tempo, embora nossa pusilanimidade diante da barbárie que a Rússia impõe à Ucrânia decepcione os ianques.
A China também joga no nosso time. Xi Jinping ama os brasileiros e o nosso futebol masculino de pernas de pau. Só a Rússia e a Coreia do Norte é que vêm tumultuando o meio de campo. Na cara dura, Vladimir Putin defende um cessar-fogo entre Israel e o Hamas enquanto ele próprio sustenta uma guerra covarde contra a Ucrânia. Por sua vez, com seu corte de cabelo que lembra a crista de uma galinha-d’angola, Kim Jong-un intimida os norte-americanos com armas nucleares.
Cada vez mais a condição habitável da Terra depende da psique beligerante de políticos e militares. O planeta possui oito bilhões de pessoas à mercê, principalmente, de quatro cachorros grandes: Rússia, Estados Unidos, Coreia do Norte e China. A guerra fria nunca esteve tão aquecida. A impressão é de que a qualquer instante um desses brigões pode disparar uma de suas ogivas e instaurar o Armagedom. Será um deus nos acuda. É quase certo que o Brasil, assim como na Segunda Guerra, seja obrigado a sair de cima do muro e tomar uma posição no embate ecumênico.
Mas o Altíssimo, que tudo vê, tudo pode e tudo sabe, há de impedir que o mundo se converta em fogo e cinzas. Pacificará o coração dos homens belicosos.
A seguir, abolindo a lei de Moisés, que pregava o apedrejamento de adúlteras, determinará que mais nenhuma mulher seja morta a pedradas nem de modo algum. O Papa Francisco também chegará junto com as suas poderosas orações. Os cachorros grandes enfiarão o rabo entre as pernas e ficarão mansinhos como cordeiros.
Marcos Ferreira é escritor