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domingo - 25/01/2015 - 13:43h

O Poder de Mando e o Mando do Poder

Por Marcos Pinto

“Entre fortes e fracos, os fortes fazem o que podem e os fracos sofrem o que devem”.

A história, em suas infinitas controvérsias, tem estimulado os perscrutadores dos fatos pretéritos, comumente denominados de pesquisadores/ historiadores a buscarem em documentos oficiais irrefutáveis as facetas escondidas sob particularidades várias. A pesquisa feita com olhar cirúrgico tem proporcionado elucidar fatos e tirá-los do obscurantismo proposital.

Nos meandros do poder há uma proverbial discrição e reserva, com objetivo único de ocultar o libelo, a prova recriminatória de fatos escusos e ilícitos, praticados nos subterrâneos do poder. O celebrado historiador carioca Otávio Tarquínio de Souza fez interessante resgate histórico sobre o Imperador Pedro I, em memorável trabalho intitulado “A vida de D. Pedro I “.

Dentre as descobertas, revela-se um fato emblemático que ele disseca de forma admirável, nos seguintes termos: “Quando Rio Pardo, o antigo Ministro da Guerra, que se mantivera fiel até o último momento, e teve de fugir porque a sua vida corria perigo, chegou a bordo, D. Pedro soltou grandes gargalhadas e caçoou do fugitivo. Paranaguá, antigo ministro da Marinha, tendo que se esconder pelo mesmo motivo, apresentou-se a bordo”.

D. Pedro disse-lhe que dele não se podia encarregar. Respondeu-lhe o outro que, neste caso, só lhe restava tornar a Portugal, onde tinha direito a uma pequena aposentadoria.

Disse-lhe o ex-Imperador: “Espero que não irás a Portugal antes da minha filha estar estabelecida no trono.

“Mas, Senhor, que quer que eu faça? Não tenho fortuna, só tinha meu subsídio”.

– Faça o que quiser, não é da minha conta; porque não roubou como Barbacena? Estaria bem, agora”.

(Episódio ocorrido à bordo do Warspite, navio em que D. Pedro I zarparia para a Europa depois da abdicação, em 1931).

Em nossa amada Província encontramos diversos registros esparsos na tradição oral. Reúnem alguns elementos inéditos que podem ser avocados para ajudar a reconstruir a nossa densa história.

Nesse contexto, sobressaem-se fatos protagonizados pelos ex-governadores Ferreira Chaves (01.01.1914/ 01.01.1920 – segunda gestão), Dinarte Mariz e Aluísio Alves. O primeiro era autoritário, detestava as críticas ao seu governo e perseguia os adversários.

Na segunda gestão, sob pretexto de reformar a magistratura do estado aposentou cinco Juízes de Direito e cinco Desembargadores para nomear seus parentes e amigos, dentre os quais Horácio Barreto e Felipe Guerra, como Desembargadores.

Aluízio e a massa (Foto: Reprodução)

Conta-se que Dinarte Mariz, ao assumir o governo do estado em 1956, fora procurado no Palácio por tradicional e prestigioso líder político da região do Seridó que, sem subterfúgios, solicitou-lhe uma ”acomodação” / emprego de professora para sua filha. Passados seis meses sem que sua reivindicação tivesse sido atendida, eis que o velho líder sertanejo retornou ao palácio do governo, para cobrar o atendimento ao seu pleito.

Estupefato diante esse imbróglio, Dinarte convocou o Secretário de Educação a se fazer presente ao seu gabinete, ocasião em que indagou-lhe sobre o porquê de sua indicada ainda não ter sido convocada para lecionar, tendo recebido a resposta de que a mesma era analfabeta.

Dinarte prontamente determinou:

– Então nomeie ela e em seguida aposente-a!

Três dias após o Diário Oficial do estado trazia a nomeação e a aposentadoria da mesma.

Ainda buscando estabelecer os nexos e as inter-relações dentro do poder, exercido de forma coronelista pela velha raposa política Dinarte Mariz, destaca-se a indicação de um seu apadrinhado político, que submetera-se a concurso para provimento do cargo de Juiz de Direito e não lograra êxito. Ao saber do inusitado, Dinarte convocou o seu Chefe de Gabinete, determinando-lhe que empreendesse diligências em seu nome, para que o seu ”protegido” tivesse o nome publicado no Diário Oficial do Estado como aprovado em primeiro lugar. Dito e feito.

Configurara-se, assim, o poder do mando e mando do poder.

A ostentação e a hipocrisia sempre predominaram nas hostes do poder.

Aluísio Alves, oriundo das alas conservadoras de José Augusto e Juvenal Lamartine, sempre evidenciou em si rasgos de arraigado coronelismo em suas atitudes. Ufanista pela força eleitoral que emprestava-lhe prestígio e poder de mando, sempre predominou com ou sem caráter oficial. A vasta ascendência social massageava-lhe o ego.

Em seu governo (1961-1965), usando de prerrogativas estabelecidas na Constituição estadual, pôs Juízes de Direito em disponibilidade por pura perseguição política. O asqueroso e truculento Golpe Militar de 31 de Março de 1964 encontrou-no no comando do governo do estado. Em poucos dias aderiu ao odiento regime militar.

Mandou buscar em Recife dois renomados torturadores, com cursos em espionagem e contra-espionagem feitos no FBI e CIA, f eitos nos Estados Unidos, o que rendeu-lhes fama e prestígio junto aos militares.

As minudências dessa ignominiosa compostura Aluísio Alves encontram-se muito bem descritas e elencadas no livro intitulado ”1964 – Aconteceu em Abril”, de autoria da professora Mailde Pinto Galvão.

Existe uma farsa sempre hipócrita que nenhuma autocracia resiste: A do ensaio de mascarar a repressão inclemente do inimigo político vencido, sob a aparência da neutralidade do aparelho e das formas jurídicas, previamente submetidos aos desvarios da intolerância”.

Marcos Pinto é advogado e escritor

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Categoria(s): Artigo

Comentários

  1. Marcos Pinto. diz:

    Esqueci-me de frisar que o Aluísio Alves provou do próprio veneno com que ajudou os milicos a destilarem, perseguindo líderes políticos, sindicais e estudantis, quando teve os seus direitos políticos cassado em Fevereiro de 1969. Os interrogatórios feitos pelos militares em solo potiguar, revelam que os áulicos comandados por Aluísio traçaram, de antemão, e por informações sigilosas, rotularam esses líderes como perigosos subversivos, junto aos que compunham a execrável Ditadura Militar. Isto é fato histórico oficial incontestável.

  2. Inácio Augusto de Almeida diz:

    “Dinarte convocou o Secretário de Educação a se fazer presente ao seu gabinete, ocasião em que indagou-lhe sobre o porquê de sua indicada ainda não ter sido convocada para lecionar, tendo recebido a resposta de que a mesma era analfabeta.
    Dinarte prontamente determinou:
    – Então nomeie ela e em seguida aposente-a!
    Três dias após o Diário Oficial do estado trazia a nomeação e a aposentadoria da mesma.”
    Hoje acontece a mesma coisa. Nada mudou.
    Em Martinópole-CE, o ex-prefeito Josè Nilson, o que diz que dinheiro público existe para ser roubado e chama os contribuintes de otários, nomeou uma das suas amantes professora apesar dela ser ANALFABETA. Quando a servil secretária de educação perguntou onde ia colocar a ANALFABETA, ele rindo disse que deixasse a “menina” brincando com as crianças numa das turmas de alfabetização. E rindo disse que assim ela poderia aprender a ler.
    Vamos agora, Marcos Pinto, a um outro fato que você relata neste artigo.
    “destaca-se a indicação de um seu apadrinhado político, que submetera-se a concurso para provimento do cargo de Juiz de Direito e não lograra êxito. Ao saber do inusitado, Dinarte convocou o seu Chefe de Gabinete, determinando-lhe que empreendesse diligências em seu nome, para que o seu ”protegido” tivesse o nome publicado no Diário Oficial do Estado como aprovado em primeiro lugar. Dito e feito.”
    Isto no Maranhão ninguém nem estranha mais.
    Na época em que juiz recebia salário de fome e que os bons advogados corriam da magistratura como o diabo da cruz, as nomeações de juízes eram feitas nas mesas do bar do Hotel Central em São Luís. Lá entre rodadas de cervejas os desembargadores decidiam, a troco sei lá do quê, quem iria ser nomeado juiz.
    Depois veio a ditadura e a coisa continuou, só que de forma menos escandalosa.
    Generais nomeavam parentes reprovados em concurso para cargo nos tribunais. Mandavam ampliar o número de vagas até que o seu protegido classificado quase sempre em último lugar fosse alcançado. Daí muitos terem conseguido bons empregos na base desta carona.
    Hoje a coisa continua, mas de maneira bem mais discreta.
    Membros dos tribunais conseguem a aprovação de filhos totalmente despreparados em concurso para promotor. Depois do filhote nomeado, ainda não contentes, conseguem que pouco tempo depois sejam promovidos por merecimento, preterindo promotores competentes, e assim possam exercer suas funções em São Luís, onde passam a viver na barra da saia da querida mãezinha.
    A verdade é que tudo continua do mesmo jeito.
    Basta dizer que um despreparado, que tentou por duas vezes aprovação em concurso para juiz sem lograr êxito, foi nomeado recentemente para MINISTRO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
    Parabéns pelo artigo.
    Um abraço.
    //////
    QUANDO SERÃO JULGADOS OS RECURSOS SAL GROSSO?
    SAL GROSSO PRESCREVE EM 2019?
    VÃO DEIXAR SAL GROSSO PRESCREVER?

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