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domingo - 04/08/2019 - 07:20h
Conversando com... Ian Pearson

Habilidade emocional será diferencial no mercado de trabalho

Por Felipe Laurence e Iander Porcella (O Estado de São Paulo)

O britânico Ian Pearson não foge de uma polêmica. Em 2018, o futurologista ficou em evidência após declarar que em 2050 os humanos vão se tornar imortais, por conta dos avanços na medicina e na tecnologia de tratamento de doenças hoje incuráveis.

Sobre o futuro do trabalho, Pearson acredita que a automação e a inteligência artificial vão tornar as funções dos humanos mais focadas em situações que envolvam um alto grau de inteligência emocional. “Pode ser que nosso trabalho seja tomar uma cerveja com um amigo e saber como ele está. Talvez o Estado até nos pague para isso”, afirma.

Formado em física e matemática, Pearson trabalhou como futurólogo da empresa de telecomunicações britânica BT Group de 1991 a 2007, quando fundou sua empresa de consultoria, a Futurizon. Ele calcula que a taxa de acerto nas suas previsões seja de 85%. Veja se você concorda com ele, na entrevista exclusiva ao EstadãoQR:

Aprimoramento das relações pessoais é uma exigência, diz Pearson (Foto:Arquivo Pessoal, com tratamento no PhotoMosh)

Como você vê as relações de trabalho nas próximas décadas?

O que todo mundo prevê, e eu concordo, é que a automação vai resultar em funções com um foco maior em habilidades emocionais e sociais e ir acabando gradualmente com tarefas repetitivas. Um fenômeno que vai crescer é o chamado “cobots”, o trabalho colaborativo de humanos com robôs. Enquanto uma máquina inteligente ou uma inteligência artificial faz as partes chatas de um trabalho, o humano vai ter mais tempo para se aprimorar e concentrar esforços nas tarefas que realmente importam no seu emprego. A não ser que aconteça uma inovação sem precedentes, acho que pelos próximos 10 a 20 anos a inteligência artificial não vai conseguir realizar essas tarefas que exigem habilidades essencialmente humanas. No médio prazo, vejo os humanos saindo das funções que exigem um QI elevado para as que necessitam de QE, um quociente emocional, mais apurado.

Essas mudanças no trabalho, mesmo com foco em inteligência emocional, vão causar desemprego?

Eu comparo essa situação com caixas eletrônicos de bancos. Quando os primeiros surgiram, muitas pessoas ficaram receosas e continuaram usando os caixas com funcionários, mas hoje as pessoas pouco frequentam um banco. Vai chegar um ponto em que as pessoas vão preferir a rapidez de uma máquina a um humano e o mercado de trabalho vai se adaptar. Eu não sou um daqueles apocalípticos que acha que a inteligência artificial vai acabar com empregos, porque em um primeiro momento você vai precisar de pessoas supervisionando a máquina e o aumento de produtividade por conta dessa automação vai causar uma expansão e, com isso, mais postos de trabalho.

Como assim expansão de empregos?

No Reino Unido isso acontece, e tenho certeza que aí no Brasil também, de pessoas que trabalham com uma espécie de hobby como forma de ganhar um dinheiro a mais no fim do mês. Eu tenho uma amiga na área de software que nas horas vagas faz bolos de casamento, mas isso não chega a ser um negócio por conta de toda a burocracia que envolve abrir e gerenciar uma empresa. Com a inteligência artificial cuidando dessa parte operacional e um sistema automatizado de entregas, via drones, por exemplo, ela poderia profissionalizar esse hobby e ganhar mais dinheiro, talvez até contratar alguém para ajudá-la. Por isso que não vejo com pessimismo a automação: ela vai garantir mais autonomia para as pessoas realizarem tarefas que hoje elas não têm tempo por conta das funções repetitivas no dia a dia.

Quais habilidades serão essenciais para o trabalhador do futuro não perder seu emprego?

Empregos que hoje envolvem um alto nível de inteligência emocional, como o de enfermeira, que exige um contato humano de zelo e acolhimento, não vão sumir. Isso é engraçado porque alguns médicos, principalmente os da área diagnóstica e alguns cirurgiões, vão acabar ficando sem função com a automação, mas enfermeiras, que recebem menos da metade do salário e não têm glamour como eles, vão continuar empregadas. Por mais avançada que uma máquina ou inteligência artificial seja, essas funções que exigem um contato humano são insubstituíveis. O que é importante salientar é que ninguém é contratado porque sabe apertar teclas de um computador muito bem e sim o que ele, como pessoa, traz para o ambiente de trabalho. Então, hoje se um gerente tem funções operacionais, ele será mantido em seu emprego como alguém que vai elevar a produtividade do setor e checar a parte humana, se os colegas de trabalho estão bem e se precisam de alguma coisa.

Quais empregos vão surgir?

Uma das funções que mais vemos crescer atualmente são relacionadas de alguma forma a coaching, ensinar outras pessoas habilidades que elas não sabem ou precisam de um aprimoramento. Com mais tempo livre por conta da automação, vamos ter de aprender novas coisas e há uma categoria profissional se especializando nisso. Não se trata apenas de ensinar novas habilidades, mas também aprimorar relações interpessoais e se tornar um líder melhor. O que nós entendemos como trabalho está mudando. Pode ser que lá em 2050, quando os computadores ocuparem a maioria das funções que desempenhamos hoje, nosso trabalho seja tomar uma cerveja com um amigo e ver como ele está emocionalmente. Talvez o Estado nos pague para isso.

E trabalhos relacionados a segurança da internet serão importantes?

Hoje, esses empregos têm uma importância enorme, mas conforme as inteligências artificiais forem se tornando mais complexas, elas vão realizar esse trabalho de segurança muito melhor do que qualquer humano. O que será importante é ter gente que fique de olho nas tendências de segurança na internet, porque o ser humano é engenhoso, ele sempre vai conseguir ultrapassar os limites se for para ganhar alguma vantagem.

Quais as profissões que com certeza vão sumir?

Costumo escrever sobre o futuro dos contadores, porque até eles já sabem que esse trabalho vai sumir e querem saber o que fazer para se reinventar. A tendência é que os contadores precisem se recolocar no mercado de trabalho. Outro emprego que está sumindo é o de agente de viagens. Hoje, você resolve tudo pela internet sem precisar lidar com ninguém. Você ocasionalmente vê alguém nas agências de viagem, mas por que eles estão lá? Esses trabalhos deveriam ter sido automatizados há 20 anos. Os que ainda restam estão sendo automatizados. Mudanças também na área do dinheiro. Na maioria dos países, as pessoas estão falando na extinção da moeda. Pessoas que lidam com notas bancárias são impactadas por essa mudança de tecnologia simplesmente porque não precisamos mais desse trabalho. Há outros empregos que estão surgindo em empresas como o Facebook, que está criando uma nova moeda. Outras empresas vão inventar seu dinheiro. Nós vamos ver muitas moedas virtuais começando a aparecer no uso diário também. E vai ser preciso muita gente para aconselhar as pessoas sobre como manter sua carteira digital, que é um novo conceito para a maioria. Eu olho para isso e penso que isso é um estímulo. Então, você deve pensar não apenas em termos de tecnologia disruptiva, mas em termos de tecnologia estimuladora. Você está ajudando as pessoas a se ajustarem a todas essas outras coisas e projetando isso, imaginando as oportunidades. Por isso, a tecnologia estimula mais do que perturba.

Na sua opinião, quais áreas vão oferecer novos empregos no futuro?

Eu vejo a impressão 3D, a inteligência artificial e a robótica como os três principais representantes disso. Mesmo coisas como novos tipos de dinheiro ou blockchain também estão nessa categoria. Todos vão criar mais que destruir. Então, na verdade, poderíamos dizer que as pessoas estão ficando bastante otimistas sobre isso. Como resultado final da inteligência artificial, da robótica e da automação, poderíamos ver 5 trilhões a mais na economia mundial. Há dois anos estávamos com medo da automação e, de repente, ela é a melhor coisa que já aconteceu. Estamos começando a ver ciclos muito positivos agora, quase diariamente.

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