• Cachaça San Valle - Topo - Nilton Baresi
segunda-feira - 06/12/2010 - 12:25h

À memória e à saudade do que não vivi


Quem o conhece sabe muito bem: o professor Anchieta Alves, um lorde no trato interpessoal, tem memória privilegiada. Quase nada escapa aos seus registros, catalogados ao longo de sua vida.

Inexiste qualquer anotação rabiscada em papel ou em pastas virtuais no computador, servindo ao seu norteamento. Está tudo mesmo na cachola.

Mossoró é seu universo prioritário.

Da genealogia à política,  há informação das mais notórias, como também o pueril, apenas para ilustrar o bate-papo. Ajuda-o a gargalhar, enquanto puxa a gola da camisa pra cima, com os dedos polegares e indicadores servindo de pinças.

Sobre o advogado Paulo Fernandes e o professor Walter Fonseca, eu tinha a ligeira impressão que esse dom marcante, ao perfil de Anchieta, era também comum a ambos. É.

Sobre os três, em verdade, meu testemunho encantado e abobalhado,  como mero expectador. O interlocutor quase mudo, mas de ouvido atento, que passeia o olhar vivo e os tímpanos afinados ao detalhismo de uma prosa em fim de tarde. De céu nublado.

Ao abrigo de uma pequena árvore, na célebre calçada de Anchieta e seu "Senado" democrático, hordeiro, há o temor da chuva. Confesso: é quase sacrilégio  para nós, exorcizá-la, como nordestinos e filhos do semi-árido. Mas o faço.

Nesse vaivém, no leva-e-traz de cadeiras, a conversa desfia histórias de personagens da vida cotidiana de Mossoró, vistas pelos infantes Anchieta, Walter e Paulo em época remota. 

Reconstroem o velho centro da cidade. Reconstituem-no diante de mim; vejo-o como um croqui à mão, agora uma urbe cenográfica, pois quase tudo já fora desfeito.

Seus comerciantes, endereços mercantís, casarões chiques, homens elegantes, as mulheres finas; loucos e putas. Trejeitos e  costumes (alguns nada republicanos) de personagens que circulam em minha mente, como se estivessem diante de mim.

Ah, um gravador! Descabido ao repórter confiar apenas em sua memória, reconhecidamente falha e tacanha.

Pura nostalgia? Não, não é bem assim.

Eles abrem mão da conversa sobre o contemporâneo, do ramerrame da politica e dos muitos saltimbancos de agora, para se encherem de saudade. Sinto-me, também, passeando por essa Mossoró bucólica, provinciana.

Sinto saudade do que não vivi.

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Categoria(s): Nair Mesquita

Comentários

  1. itamar de sousa diz:

    SABE NOBRE CRONISTA=JORNALISTA,VEZ E QUANDO,SINTO TAMBEM
    ESSAS “SAUDADES”MÀS,DO AMOR QUE NAO TIVE.

  2. WILLIAM PEREIRA diz:

    Foi a maior covardia que os poderes públicos OU EMPRESÁRIOS RICOS deixaram acontecer com o PAX, deviam tê-lo comprado e torná-lo NO museu do cinema e preservado um arquitetura valiosa, um patrimônimo historico da cidade. Lamento profundamente, ainda sinto as minhas emoções de criança e adolescente dentro do cinema, onde vivi felicidades sem igual. A troca de revistas, os picolés, confeitos, os flertes, namoros, uma verdadeira festa em dia de filme novo e famoso. Caso tivessem preservado tudo aquilo poderíamos ir com nossos netos mostrar uma verdadeira obra de arte. Entretanto o doentio sentimento capitalista selvagem não tem piedade de nada. Todas as vezes que passo lá em frente fico triste em terem acabado com um pouco da marca de uma história feliz. Ainda vejo Balão, e todos que faziam o cine PAX. Nasci em 1959 e vivi o auge do PAX, do Pavilhão da Vitória. Não é querer impedir o desenvolvimento economico social é respeitar o que é belo e valioso. Tanto predio feio no centro da cidade, abandonado, muito espaço sem nenhum valor histótico ms teimas em derubar nossa arquitetura fenomenal, o Castelinho derrubaram para nada e muitos outros patrimoníos ainda serão destruídos pelos que detem o poder BURRAMENTE sem ouvir o anseio de pessoas comuns ou intelectuais com um sentido antropologico, humanizado. ÓDIO AO CAPITALISMO SELVAGEM!!!!

  3. David de Medeiros Leite diz:

    Parabéns pelo texto…
    Abraços
    David

  4. Carlos Mendes diz:

    É interessante observar que assim como perdemos os bons mnomentos de uma cidade pacata e bucólica, perdemos também por interesses econômicos e falta de zelo público, um dos maiores acervos arquiteônicos da arquitetura eclética no nordeste. E estão derrubando o que restou….Quanta falta de cultura. Hoje poderíamos ser um destino turístico fantástico se tivéssemos preservado o nosso sítio arquitetônico.

  5. MARCOS PINTO - Da AAPOL, ICOP, IHGRN e do IANTT. diz:

    A história desse venerando cinema confunde-se com a própria história do seu proprietário – o saudoso e profícuo cidadão JORGE DE ALBUQUERQUE PINTO, um dos muitos que projetaram o nome da vetusta e oligárquica família PINTO, do Apodi, de onde veio muito moço o dinâmico empreendedor LUÍS COLOMBO FERREIRA PINTO, pai de “Sêo” Jorge Pinto, dono da “Despensa Mossoró”, que foi Prefeito de Mossoró, por falecimento do heróico Rodolfo Fernandes, em Outubro de 1927. Neste mesmo diapasão de cunho histórico/genealógico, merece destacar, também, o nome do laborioso comerciante RUBENS DA SILVEIRA PINTO, ou “Sêo” Rubens Pinto, também natural do Apodi, que, muito jovem, aportou em Mossoró sob os auspícios do tio materno “Sêo” Colombo. Seguindo a trajetória política do tio, “Sêo” Jorge Pinto foi, também Prefeito de Mossoró, com a eleição de Dix-Sept Rosado ao governo do Estado (Em 1950) de quem era Vice-Prefeito, eleitos que foram no ano de 1948. Frise-se que “Sêo” RUBENS PINTO é o genitor do não menos laborioso HUGO PINTO. Merece destacar, com a mesma honra, o nome do advogado LUÍS COLOMBO FERREIRA PINTO NETO, popularmente conhecido como LUÍS PINTO, que foi Vice-Prefeito de Rosalba Rosado. “Sêo” Colombo Pinto e “Sêo” Rubens Pinto projetaram o nome de APODI no frontispício da história política e econômica de Mossoró.

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