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domingo - 09/06/2019 - 09:42h

Elite do atraso

Por Odemirton Filho

A leitura do livro de Jessé Souza, que tem o título deste artigo, leva-nos a refletir sobre uma nova abordagem que autor faz sobre temas recorrentes no meio intelectual e acadêmico.

Temas como patrimonialismo, populismo, homem cordial e jeitinho brasileiro são abordados noutra perspectiva, fazendo-nos sair do quadrado que estamos acostumados a ficar.

Segundo o autor, o patrimonialismo tem em Marx Weber o seu expoente, tendo bebido na fonte Weberiana alguns de nossos intelectuais, a exemplo de Raymundo Faoro e Sérgio Buarque de Holanda.

Conforme discorre, Weber pensou a dinâmica interna às esferas sociais, ou seja, a esfera social responsável pela política que se articula e define enquanto tal a partir do peso relativo da relação triádica entre o líder, o quadro administrativo e os dominados.Por outro lado, para Faoro, o patrimonialismo é engendrado em um estamento incrustado no Estado – a tal elite, como se ela estivesse até hoje no Estado, e não no mercado, o qual se apropria do aparelho de Estado e usa o poder deste de modo a assegurar a perpetuação de seus privilégios.

O populismo, tema caro nos debates acadêmicos, segundo o autor, se disfarça de leitura crítica da manipulação das massas, aparentemente em favor de uma organização consciente delas, assumindo o controle do próprio destino.

Para Jessé Souza o termo populismo é usado de forma a obscurecer quem, efetivamente, luta pelas demandas legítimas da classe social menos favorecida, com o objetivo de diminuir a desigualdade social que há muito grassa em nossa sociedade.

Em relação ao homem cordial, abordado por alguns de nossos intelectuais, seria típico de nossa sociedade, porquanto forjada na herança cultural lusitana.

Em razão desse legado estaríamos fadados a ser um povo com base em relações de afetividade, paixão ou sentimento, nascendo daí o jeitinho brasileiro.

Há, entretanto, outros aspectos abordados na mencionada obra.

O autor considera a classe média como o capataz moderno da elite ou uma verdadeira tropa de choque, sendo usada pela elite para legitimar os interesses dessa.

Enquanto a elite detém o capital econômico, a classe média possui o capital cultural, destilando ódio e preconceito contra a “ralé de novos escravos”, ou seja, as classes menos abastadas.

Todavia, sem adentrar em algumas questões suscitadas, é inegável a segregação econômica e social vivenciada pela maioria da população brasileira ao longo do tempo.

O Brasil tem sua linha social delimitada pela Casa Grande e Senzala, sobrados e mucambos e, atualmente, pelos condomínios e favelas.

Não se nega que há corrupção nos diversos níveis de poder do Estado, vicejando privilégios para poucos.

Contudo, a corrupção não é praticada somente por alguns políticos, como ressalta o autor. Há uma corrupção que se encontra invisível, que coordena e manipula a opinião pública em seu favor: o mercado de capital.

Vale acrescentar, um verdadeiro “mecanismo” que age de forma articulada, conforme uma série apresentada por uma provedora global de filmes.

Essa elite, que talvez represente 1% por cento da sociedade brasileira, usufrui do capital, vivendo à custa de rentismo e juros extorsivos.

Se é certo que não se pode criminalizar a elite do capital econômico que produz riqueza, gerando empregos e renda, não se pode fechar os olhos, por exemplo, para os dividendos exorbitantes de acionistas de grandes empresas que, sequer, são taxados.

É de se indagar: somente existe corrupção na classe política? Quando o presidente da República compartilhou um texto nas redes sociais sobre ser o país ingovernável, em face dos interesses corporativistas e em razão dos conchavos, a quem estava se referindo? Somente aos políticos?

Portanto, para o citado autor, “o patrimonialismo aponta o dedo acusador apenas às elites aparentes, ligadas ao Estado, mas que no fundo só fazem o trabalho sujo da verdadeira elite do dinheiro, que manda no mercado e permanece invisível”.

Odemirton Filho é bacharel em Direito e oficial de Justiça

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Categoria(s): Artigo

Comentários

  1. FRANSUELDO VIEIRA DE ARAÚJO diz:

    Parabéns Meu Caro Odemirton, por mais um conciso e lúcido artigo fazendo menção à um Livro que realmente grande parte dos brasileiros, deveriam não apenas ler, como motivadamente refletir sobre o mesmo em sua real dimensão política agregadora e social.

    Tenho Jessé Sousa, atualmente, como um dos poucos cientistas sociais ainda não engolidos pela corrupção sistêmica que impõe à maioria sua doutrina e (ou) como queiram sua ditadura (IMPRENSA DE UMA NOTA SÓ, SOB O COMANDO DO SATÉLITE MADE USA, CHAMADO REDE GLOBO DE TELEVISÃO), que, por vezes pode ser casuisticamente denominada liberdade de imprensa e (ou) de expressão. Onde necessariamente, só é ouvido àqueles que literalmente de alguma forma se rendem ao Status Quo.

    QUEM QUEIRA E TENHA OPORTUNIDADE, RECOMENDO, TAMBÉM , A LEITURA DE: DA ESCRAVIDÃO A LAVA JATO, MAIS UM DENSO LIVRO DE JESSÉ DE SOUSA, QUE, ATRAVÉS DA SUA LEITURA, NOS LEVA COMPREENDER UM POUCO DO NOSSO PROCESSO HISTÓRICO DE DEPENDÊNCIA, POR CONSEGUINTE, AS VERDADEIRAS RAZÕES DAS NOSSAS INTRINCADAS CONTRADIÇÕES DE ORDEM ECONÔMICA/SOCIAL, SOBRETUDO DO PORQUÊ, SOMOS TÃO MULTIFACETADOS E POTENCIALMENTE RICOS, TODAVIA MANTENDO ATRAVÉS DA HISTÓRIA DE ESCRAVISMO AINDA LATENTE, UMA GRANDE MAIORIA SOB AS MARRAS E GRILHÕES DA MISÉRIA, DO ATRASO E DA POBREZA…!!!

    Um baraço

    FRANSUÊLDO VIEIRA DE ARAÚJO.
    OAB/RN. 7318.

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