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domingo - 10/05/2020 - 08:26h

Emery Costa em 1972 – “Lá se vão…”

Por David de Medeiros Leite

Nas eleições de 1972, a disputa em Mossoró foi protagonizada pelas chapas (candidatos a prefeito e vice-prefeito, respectivamente): Dix-huit Rosado e Canindé Queiroz, pela ARENA; Lauro da Escóssia Filho e Emery Costa, pelo MDB.

No pleito municipal anterior, em 1968, o MDB não apresentou candidato em Mossoró. E a ausência do partido na referida eleição derivava do quadro político no Rio Grande do Norte: após a institucionalização do bipartidarismo no país, em 1966, os dois grupos de maior projeção no Estado, liderados por Dinarte Mariz e Aluízio Alves, se filiaram ao partido que dava sustentação ao Regime Militar, apesar de continuarem adversários no âmbito local.

Chegaram a apelidar tal anomalia de “Arena verde” e “Arena vermelha”, considerando as cores que demarcavam a rivalidade na província.

Em 1969, o deputado Aluízio Alves, que compunha a bancada de apoio ao Regime Militar, teve seu mandato casado e os direitos políticos suspensos por dez anos. Somente a partir desse episódio o grupo político de Aluízio se filiou ao MDB.

Com Emery Costa, Ulysses Guimarães e Lauro Filho em 1972, o MDB ia à disputa contra chapa da Arena (Foto: cedida)

Mas voltemos a Mossoró, relembrando quem era quem na disputa de 1972.

Dix-huit Rosado, desde 1945, atuava na seara política: havia exercido mandatos de deputado estadual, deputado federal e senador da República, além de ter ocupado a presidência do Instituto Nacional de Desenvolvimento Agrário (INDA), durante a gestão do general Costa e Silva. Seu vice, Canindé Queiroz, era estreante na política partidária, porém conhecido na cidade por administrar empresas do tio, deputado federal Antônio Florêncio.

No MDB, Aluízio Alves, atuando nos bastidores, tentou “costurar” chapa encabeçada pelo padre Américo Simonetti, tendo como companheiro Lauro Filho, que já havia sido candidato a deputado estadual, obtendo considerável número de votos, o que lhe garantira uma suplência. Padre Américo não aceitou tal candidatura.

Ainda houve sondagens em torno de outros dois nomes do clero mossoroense: Sátiro Dantas e Alcir Leopoldo, que igualmente declinaram.

O nome de Lauro Filho foi alçado à condição de candidato a prefeito. A solução de Emery Costa, como seu companheiro de chapa, deu-se em consequência de sua atuação jornalística na Rádio Rural, cuja direção era exercida pelo padre Américo.  Solução engendrada com o intuito de manter os simpatizantes da frustrada candidatura do clérigo, colocando-se um nome que compunha a equipe de profissionais por ele liderada na emissora da Diocese.

A eleição de Mossoró concentrava atenção, pois o prefeito de Natal (como nas demais capitais) era nomeado pelo governador durante o período ditatorial, não havendo, por conseguinte, eleições naquela urbe. Para se ter uma ideia, Ulysses Guimarães, presidente nacional do MDB, veio a Mossoró. Então, se a cidade oestana constou no roteiro do dirigente, naturalmente a eleição interessava ao comando emedebista.

Empresário salineiro Francisco Ferreira Souto Filho (“Soutinho”) e sua esposa e Edith foram anfitriões da comitiva. Diga-se de passagem, o casal além de receber essas proeminentes figuras, fazia da residência um verdadeiro “birô político”, para usarmos uma expressão da época.

Por que me veio todo este caudal de lembranças? Porque a recente partida (veja AQUI e AQUI) de Emery me fez rememorar tanto os aspetos históricos imbricados, como alguns trechos dos “jingles”que eram cantados a plenos pulmões pelos partidários de cada corrente. E aí tínhamos tanto um “jingle” composto originalmente para a ocasião, como o de Dix-huit: “Que coisa linda, olha lá, olha lá, olha lá, tá na hora, vamos agora em Dix-huit Rosado votar” (autoria de Nepó, compositor areia-branquense); ou uma paródia adversária que conclamava: “Bandeira branca amor, é isso aí, com a vitória de Lauro e Emery…”

Carlito Costa do Nascimento, saudoso amigo, cujo hobby era escrutinar jingles políticos, falava de uma das paródias da memorável campanha que, com licença poética, repetia: “Lauro e Emery já tá eleito, Lauro e Emery já tá eleito, Lauro e Emery já tá eleito, prefeito de Mossoró”. Não consigo lembrar especificamente desse detalhe.

Uma campanha e só (Foto: família)

Até sou “consultado” sobre questões políticas mossoroenses anteriores (e não me faço de rogado para conversar sobre), mas essa paródia, especificamente, não vem à mente. Apesar de lembrar vivamente da referida contenda.

Pois bem, do pleito mossoroense de 1972, temos esparsas reminiscências compondo uma crônica aqui ou acolá, evidenciando certa fragilidade de registros da historiografia recente.

Dix-huit e Canindé venceram o pleito e seguiram militando na vida pública da cidade, inclusive ambos disputaram outras eleições. Lauro Filho mudou-se para Fortaleza onde dedicou-se ao exercício da advocacia. Emery continuou a trajetória na radiofonia, ampliando, nos anos seguintes, sua atuação em jornal e televisão, conquistando respeito e admiração por tão fecunda carreira profissional.

Com o passar do tempo, o próprio Emery, em seus escritos ou conversas informais, comentava que aquela participação partidária foi algo episódico e, rindo, se perguntava: “Como danado fui me meter numa campanha política?”.

Dúvidas que nem ele, Emery, nem nós, reles mortais, deciframos; são os enigmáticos desígnios em nossa existência.

Salve Emery!

David de Medeiros Leite é professor da Universidade do Estado do RN (UERN) e Doutor pela Universidade de Salamanca – Espanha

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Categoria(s): Artigo / Política

Comentários

  1. Honório de Medeiros diz:
  2. Rocha Neto diz:

    “Como danado fui me meter numa campanha política “, está frase caro David, Emery me falou por diversas vezes na redação da Emissora de Educação Rural de Mossoró, quando lá estreei como redator e locutor, uma das vezes Emery me falou, Rocha Neto, nunca se envolva com estas cambadas de políticos, você só vai arranjar confusão… Emery falou a verdade, me alertou e eu mesmo assim me meti na cambada, não como candidato, mas como elemento de bastidores, a pior parte pois é acontece o inimaginável da da engrenagem… ali participei de muitas decisões, tive que assumir chefia de gabinete parlamentar de 3 deputados, e claro que aquilo que Emery havia me alertado aconteceu, arranjei muita confusão também. Emery tinha razão.

  3. Fernando da Escossia diz:

    Foi uma campanha linda onde o povo de Mossoró foi as ruas em virgilia de três dias e três noites, eu era criança, porém, nunca me esqueci do que presenciei. Parabéns ao meu pai Lauro Filho hoje fazendo 91 anos e a Emery in memoriam.

    Fernando da Escossia Advogados minimalista e eleitoralista com 33 anos de experiência tendo começado meu curso em Mossoró

  4. Fernando da Escossia diz:

    Correção Advogado municipalista e eleitoralista

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