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domingo - 04/07/2010 - 11:51h

O delta de Nilo

"Seu" Luiz Maria Alves foi o todo-poderoso diretor-geral do "Diário de Natal", em sua fase áurea, dos anos 70 ao final da década 80. Em Mossoró, o jovem areia-branquense Nilo Santos fazia parte dessa saga, como um emergente repórter.

Vivíamos o tempo do radicalismo, numa Mossoró dividida entre "aluizistas" e "rosadistas". Sem meios-termos. O indivíduo era "verde"  ou "encarnado".

Nilo compôs equipe do Diário de Natal de agosto de 1974 a março de 1982. Como não poderia deixar de ser, vez por outra era molestado pela politicalha.

Delegações de aluizistas e rosadistas tinham se queixado quanto à atuação de Nilo na cobertura política de Mossoró. Insinuavam que seria recomendável o seu expurgo. Informado sobre as queixas, Luiz Maria Alves transpirou: 

– Isso é muito bom! Prova que ele está trabalhando corretamente.

Meu amigo Nilo, que morreu no último dia 23 de junho, de infarto, aos 58 anos, não sabia desse episódio até final de 2007. À ocasião, nós nos despedíamos de um programa na FM 95, de existência rápida e densa, sabendo que "as férias" anunciadas para nós significariam um bota-fora.

A linha política seria mudada, por vontade e força financeira da Prefeitura de Mossoró. 

Pedi a palavra no ar e relatei essa história. Sublinhei, que era uma forma de homenageá-lo e agradecê-lo pela convivência sempre decente, leal, profícua e bem-humorada. Vi-o baixar a cabeça. Ficou em silêncio.

Seus olhos úmidos e lábios que se comprimiam, também me fizeram chorar.

O texto enxuto, o jeito despojado e alheio ao "ter", a fina ironia, a falta de pressa, o humor quase perene e a memória prodigiosa são as imagens que conservo do meu editor no final dos anos 80 (na Gazeta do Oeste). Uma amizade esculpida em em mais de 20 anos.

Sobre memória, a propósito, quem teria uma melhor? Frases, diálogos, datas etc. pareciam saídas de um banco de dados. Reconstituia tudo com detalhes, em filigranas. 

Entrava em erupção, se mexessem em seus "calos". Ao despejar suas lavas, a língua de fogo não poupava a ninguém. Bom sair de perto.  Que o diga Aluízio Alves (já falecido).

Certa vez, Aluízio amuou-se porque Nilo, chefe da Sucursal da TV Cabugi/Tribuna do Norte, fizera cobertura política de algo que ele não gostara. A voz rouca do ex-governador, ao telefone, encontrou áudio estridente do jornalista que não sabia enxergar só um lado da notícia.

Depois de sentir abrupto corte na ligação, Aluízio tentou falar outra vez com Nilo, mas sem sucesso. Quando finalmente sua ligação foi atendida, o fotógrafo Claudino Nunes é quem recebeu o recado:

– Diga a Nilo que deixe de ser "bruto".

Mesmo assim, nunca mais interveio no trabalho do subordinado.   

Desse tempo vivido, bem vivido, ainda fica gravada sua forma de tratamento a todos nós. A mim, à autoridade constituída, à pessoa simples que nos servia café, não importa. Para ele, todos eram o "Mestre".

A reverência nos nivelava e mesmo assim não nos fazia iguais ou superiores. "Nilão", como o víamos, era bem maior. De margem a margem, até desaguar em cada um de nós, como rio benfazejo.

É meu testemunho.

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Categoria(s): Nair Mesquita

Comentários

  1. David de Medeiros Leite diz:

    Carlos, ótimo testemunho, diga-se de passagem!
    Nos últimos meses, em nossos encontros, eu sempre fazia uma cobrança: “Nilo, começou o livro?” A pergunta era feita por conta de uma promessa que ele, Nilo, tinha feito de escrever um livro sobre a história recente da politica mossoroense…Assunto que ele dominava muio bem. Como resposta, ele sempre ria e dizia, algo mais ou menos assim: “Tenha calma que sairá…”.
    Mas, se de tudo fica um pouco, como diria o poeta, mesmo sem ter deixado o prometido livro, vez por outra, Nilo contava boas historias dos bastidores…
    Abraços
    David Leite

  2. Lucílio Filho diz:

    Carlos, o seu depoimento sobre o Mestre Nilo Santos é a prova que nós formadores de opinião temos vários bons exemplos a seguir. Tive a alegria de compartilhar da inteligência do Mestre, quando ele foi correspondente da Rádio Princesa em Mossoró, e depois nos encontramos na TCM em 2004; Em cada conversa que eu tinha com o Mestre Nilo estava sempre aprendendo algo novo. MESTRE NILO SANTOS, O meu muito obrigado pelas lições.

  3. Ivana diz:

    Bom dia Carlos!! Parabéns pelo testemunho. Nilo era um dos melhores amigos do meu pai, praticamente todos os dias se falavam por telefone. Lá em casa, todos aprendemos a admirá-lo. Era um homem simples, de uma inteligência sagaz. Pensava rápido e tinha uma memporia prodigiosa. Era prazeroso vê-lo fazendo entrevistas na TCM. Cumpriu muito bem de grande jornalista.

  4. MARCOS PINTO - Do IHGRN e do ICOP. diz:

    Amigo DAVID LEITE:Seria de bom alvitre que vc trouxesse à baila estes assuntos de bastidores que, com certeza o grande MESTRE NILO SANTOS traria. Ou Vc vai ser mais um a deixar assuntos entregues à faixa silente do esquecimento, à serviço das famosas FORÇAS OCULTAS? (Leia-se Rosados)?

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