• Cachaça San Valle - Topo - Nilton Baresi
domingo - 20/01/2019 - 09:18h

O meu lado de ver e sentir

Por François Silvestre

Fui carola do catolicismo na infância. De rezar, confessar, comungar. Mãe Guilé foi minha primeira influência, no afago do seu jardim florido e no afeto que guarda minhas melhores lembranças da infância. Nunca mais eu tive nada parecido com a casa da minha avó. Seu jardim de jasmins e resedás.

Por essa dívida eu ainda concordo com Mãe Guilé? Não. A ela devo gratidão, mas abomino tudo que ela tentou impor-me de crenças e opiniões. Guardo seu colo, reverencio seu coração, mas dispenso seu pensamento. 

Depois, o Diocesano de Caicó. A primeira janela para o mundo. No trem sem linha, cujos catabis, nas estradas, de um velho caminhão de mangai eu ingressei na primeira e única universidade da minha iniciação.

Foi lá, nesse Colégio de padres, por quem guardo admiração reverencial, que comecei a duvidar dos deuses de Mãe Guilé. Monoteísmo de três deuses. Nada contra.

São os mitos mais fantásticos da criação humana. E o homem na ânsia de explicar-se criatura acaba criando os deuses que explicam sua existência. Criador criatura dos seus criadores.

Aí vem o fim da adolescência, o contato com teses revolucionárias, a constatação das injustiças sociais, o apelo à luta dosada de romantismo e esperança. Valia tudo pelo sacrifício pessoal. A negação do indivíduo, sacrificado pelo bem coletivo.

No que resultou? Na criação de mais um mito. Os deuses negados foram substituídos por novas divindades. Tudo mantido e alimentado no campo fértil do fanatismo.

Até que a ficha despenca. Ou despenha, igual a bananas maduras no cacho esquecido da bananeira.

A constatação histórica da falência dessa crença não me levou ao conluio com a crença antagônica. A esquerda foi a negação da minha esperança. A direita é a confirmação de que eu estava certo, mesmo errando.

Aqui eu mando um recado aos fanáticos. Tenho pena de vocês. Bocós. Vocês são manipulados e manipuláveis nesse embate de espertos aproveitadores da sua ignorância.

Rebanho. Cada lado cego da safadeza dos seus. E ávidos cobradores da sacanagem dos não seus. Mas todos são seus. Todos. E todos sobrevivem nessa patifaria porque contam, cada lado, com a burrice dos seus seguidores. De um lado e do outro.

A esquerda, que trocou o sonho pelo populismo esmoler; E a direita cujo sonho continua sendo a ganância.

Ambas irmãs, diferentes apenas na forma. O conteúdo é o poder, pra cujo alcance não há escrúpulo.

Não existe combatente mais fácil do que o estúpido. E o fanatismo é o estuário confortável da estupidez. Té mais.

François Silvestre é escritor

Compartilhe:
Categoria(s): Artigo

Comentários

  1. Paula Valéria diz:

    Fantástico!

  2. Roberto Mitre diz:

    François, gosto de ler seus artigos, pela sua franqueza de expor, seus erros e acertos, mas, sempre dando um não ao fanatismo. Parabéns.

  3. Rocha neto diz:

    Grato pela aula de hoje. Mais uma vez a palavra SUPERAÇÃO em destaque. Parabéns!!

  4. Amorim diz:

    Tenho a ousadia de cobra-lo a tornar vossos artigos em livro.
    Simples; nós te-lo com livro de cabeceira e às futuras gerações conhecer o homem que “brinca” com as palvras.
    Ass: Desconhecido Ignorante.
    Lembraças à família

  5. Marcos Pinto. diz:

    Contextualizo-me literalmente com todo esse seu desiderato existencial. Ainda sinto “nas minhas ventas” o cheiro forte do incenso queimando no Turíbulo soltando “polmos de fumaça também nas ventas da massa rude e ignara dos tempos d’antanho. Esse ritual é mais utilizado durante as liturgias celebradas durante a semana dita Santa. Em minha modesta concepção de desconfiado aruá de pé-de-serra, todas as semanas e dias são santos, e de acordo com nossos atos de fé e de caridade são santificados. (Lá vem o meu beatismo!). Confesso que aquele ritual exalava e imprimia em minha alma um certo odor de santidade, enclausurada naquelas veneradas e grossas paredes da Igreja-Matriz da minha amada Apodi. Causava-me profunda impressão na alma. Percorri essas mesmas veredas de sonhos e de ilusões rubricadas com DNA eclesial. Ainda ouço o ranger do carro de boi, desfiando e desafiando o tempo no entoar de merencória e magistral melodia de eternidade, espraiada nas esquinas da vida. Quando conversar com o seu inoxidável mano Silvestre, fale para o mesmo que envio forte abraço, extensivo à vosmincê Caçuá velho .

  6. Naide Maria Rosado de Souza diz:

    Sim, é fácil combater o estúpido. Aqui, não o estúpido no sentido da grosseria, mas no da ignorância, desinformação, despreparo.
    Conjecturo sobre a proveniência da estupidez, a segunda. Não seria provocada pela ganância do sabido, do esperto ? Não seria o esperto quem conduziria o estúpido, o segundo, ao fanatismo ? Não seria o fanatismo a ausência de tudo, o grito do desespero do nada?

  7. Alcindo Junior diz:

    Em síntese:

    Os FANÁTICOS são manipulados e manipuláveis por espertos aproveitadores da sua ignorância. O fanatismo é o estuário confortável da estupidez.

    Portanto, o fanático é um estúpido e ignorante…

    LACROU.

  8. mano targino diz:

    Meu Poeta Silvestre
    Quanto tempo. Antes que nossos dias findem, precisamos nos ver. A tantas lembranças juntas de Jr. Targino que devemos relembrar. Meu contato 84 98839 3575

Faça um Comentário

*


Current day month ye@r *

Home | Quem Somos | Regras | Opinião | Especial | Favoritos | Histórico | Fale Conosco
© Copyright 2011 - 2024. Todos os Direitos Reservados.