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domingo - 02/09/2018 - 05:24h

Recessão democrática

Por Odemirton Filho

Desde o tempo de Atenas, na Grécia antiga, que se busca a democracia como uma forma de participação popular.

Apesar de sua seletividade, pois nem todos os habitantes eram considerados cidadãos, a democracia ateniense foi o início do regime de governo que hoje se adota em vários países.

A democracia é uma forma de participação de todos, sejam homens, mulheres, ricos ou pobres na construção de um Estado.

Há, basicamente, três espécies de democracia: a direta, a indireta e a semidireta.

A democracia direta é aquela na qual os cidadãos, sem intermédio de representantes, discutem e aprovam as leis e encaminham resoluções em favor de toda a coletividade.

Por outro lado, a democracia indireta é aquela que a sociedade delega aos seus representantes a aprovação de leis ou resolução de seus problemas.

Diz-se democracia semidireta aquela na qual os cidadãos têm seus representantes eleitos, mas em algumas questões relevantes decidem diretamente, como no caso de plebiscito, referendo e iniciativa popular.

O art. 1º, parágrafo único, da Constituição Federal brasileira adota a democracia semidireta:  “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.

Destaque-se que, atualmente, a democracia deliberativa tem sido abraçada por alguns doutrinadores, sendo que, nessa espécie, a sociedade participa de forma mais ativa na tomada de decisões, dentro de determinada esfera pública.

Para se chegar ao que conhecemos foi longo e doloroso o caminho de algumas sociedades hoje democráticas.

O poder, concentrado nas mãos de poucos, era um entrave à participação popular.

Sabe-se que é preciso um limite ao poder e a participação da coletividade é de vital importância para o amadurecimento das instituições e do próprio Estado.

No Brasil, como sabemos, a experiência ditatorial nos despiu de todo e qualquer direito fundamental. Os atos ditatoriais, plasmados em Atos Institucionais, foram amplamente utilizados em desfavor da sociedade.

Não somente no país, mas em boa parte do mundo e, sobretudo, na América Latina, o poder foi centralizado em um grupo que tolhia o livre viver das pessoas.

Após muita luta e sofrimento para restabelecer o direito de manifestação e, principalmente, o direito ao voto, foi conquistado o regime democrático, tendo como sustentáculo uma Constituição.

Agora, em uma guinada, esses valores estão sob ameaça.

Em razão disso, o termo recessão democrática, criado pelo cientista político Larry Diamond, é uma forma de alertar os cidadãos que suas democracias estão a fenecer.

Aquilo que parecia consolidado poderá começar a ruir se a sociedade não entender que a democracia tem que ser constantemente defendida contra qualquer ataque que venha a minar suas bases.

O poder talvez não seja mais assaltado por meio de um golpe de Estado. Há em andamento várias formas de se tomar o poder, usando a própria democracia para surrupiar os valores mais caros à sociedade.

Segundo analistas, o desmonte de direitos sociais, ideias retrógradas, ataques a grupos minoritários, intolerância, incitação à violência, enfraquecimento de sindicatos e de movimentos populares, entre outras atitudes, denotam que a sociedade precisa ficar alerta.

Não se nega que a democracia tem os seus defeitos.

A corrupção, apurada pela operação Lava – Jato, mostrou ao país uma cadeia de mal feitos que incomodam o cidadão de bem e o faz ficar descrente nas Instituições democraticamente constituídas.

Os serviços sociais básicos estão à deriva e o cidadão ver a montanha de impostos que paga ser desviada para fins obscuros.

A retomada do crescimento econômico, como fundamental para fazer a roda da economia girar, parece que ainda irá demanda um bom tempo, pois a expectativa do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) está aquém do esperado.

Com isso, estamos com mais de treze milhões de pessoas sem emprego e outra parcela expressiva sobrevivendo de atividades informais.

Vivemos, é certo, uma recessão econômico-social. Não se vislumbra no horizonte mudanças significativas.

Todavia, a recessão democrática de direitos e valores que conquistamos ao longo do tempo parece evidente.

Nas palavras de Daniel Sarmento e Madeira Pontes: “a eleição de um presidente com ideias e projetos radicalmente contrários à democracia traduz perigo muito maior para a sobrevivência da empreitada democrática do que a mera aceitação da presença de um partido autoritário na cena política”.

Assim, não podemos coadunar com qualquer espécie de conduta que queira desestabilizar à democracia e suprimir direitos fundamentais.

É através dela, democracia, e de nossas Instituições, que devemos buscar a solução para o caos que estamos vivendo. Não podemos transigir os nossos direitos, eles são irrenunciáveis e inegociáveis.

Teremos, novamente, a singular oportunidade de escolher os nossos representantes para o Executivo e para o Legislativo. Vejamos os candidatos que defendam à democracia e que não tenham a mácula da corrupção.

É imprescindível que os candidatos abandonem a retórica e a demagogia de sempre e apresentem, de forma concreta, propostas para a educação, saúde e segurança, os principais problemas nacionais.

E que apontem, com clareza, de onde virão os recursos para se promover os investimentos que essas áreas exigem.

É certo que reformas precisam ser feitas, todavia é preciso saber equacionar o problema a fim de não penalizar, ainda mais, a sociedade brasileira e, principalmente, que se preserve o Estado Democrático de Direito.

Odemirton Filho é professor e oficial de Justiça

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Categoria(s): Artigo

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