• Cachaça San Valle - Topo - Nilton Baresi
terça-feira - 29/03/2011 - 15:02h

Um sonho possível de polícia e o retorno do “Papafigo”


Em tempos de violência urbana acentuada, em todo o país, o comum é termos debates emocionais sobrepondo-se à discussão científica. Daí o surgimento de propostas até extremistas, como a pena de morte.

Entretanto é fundamental que percebamos a necessidade de ações encadeadas, para se combater o mal em sua raiz. Reduzir a maioridade penal, aumentar penas de reclusão, adotar o homicídio oficial de Estado (pena de morte) etc. são ideias pontuais.  Pipocam por espasmos, a cada crime que provoca comoção popular.

O Brasil possui uma das maiores populações carcerárias do mundo, mas ao mesmo tempo os mandados de prisão – que não são cumpridos – surgem em quantidade superlativa. Faltam presídios, não existe condição mínima de ressocialização de apenados, a polícia é desaparelhada e sobrecarregada para levantar provas e prender culpados.

É sempre mais simplista culpar a polícia por tudo ou atribuir ao governador de plantão a responsabilidade pela escalada da violência. Nos dois casos, a sociedade funciona como uma manada: pega uma direção e vai.

Vai porque a maioria vai e não porque cada um parou para pensar antes de ir. Toma-se um rumo do pensamento coletivo e pronto.

Claro que não temos uma política de segurança pública eficaz. Lógico que nossa polícia está longe da eficiência cobrada pelas ruas. A legislação não é um primor.

Como sociedade, contudo, continuamos apenas transferindo responsabilidades ou apontando culpados com base em nossos próprios preconceitos, passionalidade, desconhecimento de causa e apegados a lugares-comuns. Tem sido assim.

Veja o exemplo recente do episódio de um policial militar de Manaus-AM, que atirou num menor de idade indefeso, além de inocente, só por sadismo. Abjeto, aterrorizante, sem dúvidas. Mas fazermos uma leitura do papel da polícia por esse fato é errarmos feio, pela generalização.

Nos últimos anos, a polícia tem passado por uma considerável melhoria em seus quadros. Deixou de ser a última atividade laboral do homem e arrimo de negros, analfabetos e brucutus. Temos uma elite por lá, sim.

Surge uma geração movida por ideais. Temos os bons, pessoal com vocação, espírito público, que quer vestir a farda e ser reconhecida pelo destemor, sacrifício pessoal e honradez.

Numa instituição de ensino superior de Mossoró, em determinada sala com cerca de 40 estudantes de Direito, pelo menos 15 são dos quadros da Polícia Militar. Fantástico!

"Sentar praça", como se dizia no passado, não é mais o fim da linha ou a solução para quem não serve para nada. Vestir a farda mais do que centenária, da PM, pode e deve ser, sim, motivo de orgulho.

O rigor hierárquico atrasado, a deficiência em treinamento e a ausência de melhor acompanhamento dos efeitos psicossociais dessa atividade, estressante, precisam ser revistos. O regime disciplinar interno deve ser mais aberto à sociedade.

Policial não é pior nem melhor do que jornalista, juiz de direito, promotor público, comerciante, advogado, político, engenheiro… Todos estamos aprendendo a conviver naquilo que chamo ainda de "simulacro" de democracia.

É um exercício diário de tolerância, de humildade e de conhecimento quanto a direitos e deveres. Nesse turbilhão surgem excessos, ameaças a direitos  e garantias fundamentais, porém é possível localizarmos avanços.

Sonho com o dia em que o policial vai retornar à calçada de nossas casas, acolhido com generosidade e gratidão, por ser nosso escudo humano. Por ser "do bem".

Sonho com o dia em que nosso medo será apenas do bandido.

Sonho com o dia em que não nos perturbaremos, sem nada a dever, com a presença da "rádio-patrulha".

Sonho com o dia em que o "Papafigo" será novamente a alegoria usada para intimidarmos o filho levado, como no passado remoto, em vez da polícia e suas armas ameaçadoras.

É o que sonho. Um sonho possível.

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Categoria(s): Segurança Pública/Polícia

Comentários

  1. Benedito Gouveia - Cafeteria Gouveia diz:

    Parabens pelo feliz comentário, que esta em sintonia com a sociedade.

  2. Edmiro diz:

    Excelente reflexão, amparada em belo texto. Parabéns.

  3. ze Paula diz:

    Que tal,”chamar o ladrão”, o ” Farinha com Sal”,um bom ladrão,ladrão nato,quando não tinha o que roubar,botava a sua camisa numa cerca e saía “escondidinho” e roubava-a;”ACORDA AMOR/EU TIVE UM PESADELO AGORA…CHAME O LADRÃO,CHAME O LADRÃO…”

  4. MARCOS PINTO - Da AAPOL, ICOP, IHGRN e do IANTT. diz:

    Concordo quanto à redução da maioridade penal para 16 anos. Discordo (Que é o mesmo “disconcordo” do Zé Mendes) Quanto à adoção da pena de morte, posto que quando esta era aplicada durante o Brasil monárquico, prevalecia a máxima que o grande Jurista RUI BARBOSA cunhou-a, em 1922: “Código Civil para os ricos – Código Penal para os pobres”. Quanto à atuação da polícia militar, sugiro que a mesma adote a antiga tática da abordagem ostensiva sobre indivíduos que apresentem compostura suspeita, em blitzs instantâneas em ruas monitoradas como palco de assaltos e outras modalidades de violência.

  5. Francisco Edvan de Queiroz diz:

    Um sonho sonhado sozinho é utopia um sonho sonhado coletivo é realidade, palavras que li não recordo aonde. Haverá o tempo em que poderemos confiar serenamente em nossos policiais e em sua postura funcional, onde o caráter e integridade da maioria, será refletida em suas ações e os diferenciará da minoria indigna da atividade. Tenho dito educação e inteligência são as melhores armas do homem. Austeridade e respeito não estão dissociados de posturas educadas e corretas. Quando não se pode mais recuperar os perdidos, precisamos repensar a efetividade da cidadania, no processo de formação de nossas crianças e jovens, no sentido de permitir aos mesmos, condições e oportunidades reais. É um sonho.

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